GP da India: Uma pista ótima, uma corrida nem tanto

quarta-feira, 2 de novembro de 2011 às 14:44

Largada do GP da India em 2011

O público acorreu em peso, o clima estava perfeito. Só faltou a qualidade do espetáculo
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O circuito da Índia é, inegavelmente, sensacional. Retas longas, curvas rápidas e nem tanto, aclives e declives, mudanças de direção delicadas nos esses de alta velocidade, largura incomparável. Que bela pista. E, no entanto, que corridinha chata foi esse GP. Como se pode ter uma prova tão pouco atraente em uma pista de tanta qualidade? Tenho um palpite, não sei se certo ou errado, mas que parece fazer sentido: a poeira e a falta de emborrachamento típicas dos asfaltos novos reduziu a enorme largura do asfalto a uma trilha estreita, fora da qual não havia salvação.

As tão apregoados batalhas por posições, com tomadas e retomadas de posições em X na saída das curvas largas, nunca se materializaram. Lá na frente, pouquíssimo movimento, só a escalada de Button de quarto para segundo na volta inicial – até a ultrapassagem de Alonso sobre Webber foi no velho estilo, durante a troca de pneus. Exatamente porque fora da trajetória a poeira condenava quem sujava seus pneus a uma drástica perda de aderência por duas ou três curvas, no mínimo. Isso explica o baixíssimo número total de ultrapassagens: apenas 22. E algumas delas porque Petrov, Perez e di Resta pararam logo nas voltas inicias para se livrarem dos pneus duros e na volta encontraram pela frente os Hispania, os Virgin, os Lotus e os Williams.
 
Confesso que, por um breve momento, fiquei em dúvida se devia ou não colocar a Williams junto com as equipes nanicas. Definitivamente, a Williams não é uma equipe nanica – mas está perigosamente perto delas quando o assunto é seu desempenho . Talvez dure pouco esse período de pesadelos para uma equipe tão orgulhosa de seu passado – e que certamente se envergonha de seu presente. É preciso virar rapidamente essa página de sua história. Para isso, contará em 2012 com um novo staff técnico liderado pelo indiscutivelmente competente engenheiro Mike Coughlan, em cujo currículo figuram os projetos de alguns McLaren recentes – e também a espionagem junto à Ferrari procedida em conjunto com o amigo e comparsa Nigel Stepney.

Vem também um novo e bom motor Renault. São boas as indicações de que as coisas por lá vão melhorar. E é exatamente por acreditar nisso que me entristeceu a informação que foi dada por um jornalista inglês, um dos editores de Fórmula 1 da Autosport (revista da qual sou correspondente há algumas décadas). Após a corrida, conversávamos sobre a recuperação de Robert Kubica. Daí, a dança das cadeiras, que deve ser iniciada logo que haja uma certeza sobre o retorno ou não do polonês. No meio do papo, ele me disse que considera Barrichello definitivamente fora da Fórmula 1 em 2012. Não pensem que ele também não se sente pesaroso por isso; nos meios profissionais, Rubinho é visto e tratado com imenso respeito. Como, aliás, ele merece após uma carreira que esse mesmo amigo definiu como gloriosa.

Nada confirmado, diga-se, resta uma esperança, mas é tênue. Segundo vozes do paddock, há um acordo verbal, segundo outras, já passou disso, o contrato foi assinado e tem todos os nomes e números preenchidos. O fato é que, de uma forma ou de outra, Kimi Raikkonen é quase uma certeza na equipe. Só não o é totalmente mesmo porque para tanto Frank Williams depende do fechamento de um contrato vultoso com uma empresa de investimentos do Catar. Pelo que se sabe, sir Frank está em Doha e só planeja sair de lá quando tiver o contrato assegurado – por outro lado, comenta-se que ele não vem fazendo muito progresso.

Mesmo que o patrocínio não se materialize e Raikkonen nunca ingresse na equipe, a permanência de Barrichello na Williams é pouco provável. Uma legião de novos pilotos, todos com patrocínios maiores ou menores, logo vem à baila quando se fala no assunto. E ainda tem Adrian Sutil, que aos poucos vem colocando sob dúvida o acerto de sua tão propalada substituição por Nico Hulkenberg mas que está mais fora do que dentro da escuderia indiana. Fraca ou não, uma equipe com um carro disponível sempre atrai pilotos que compensam com verba as razões pelas quais não são cogitados pelas equipes mais fortes.

Até hoje, a Williams sempre pagou para ter Barrichello. Mas o que antes era motivo de orgulho, hoje é um atrapalhador. E aos poucos surgem os sinais de que até ele mesmo, o próprio Barrichello, vê o fim se aproximando. A sua fisionomia parece um pouco entristecida; ele já até admitiu procurar patrocínio para a equipe, o que antes lhe parecia inimaginável.

Restam chances em outras equipes? Temo que não. Rubinho afirmou, há coisa de um mês ou dois, que vinha conversando com outras casas. Uma delas, confirmou-se, era a Renault, onde sua experiência poderia amenizar a ausência de Kubica. E, de fato, são bem poucas as chances do polonês voltar no ano que vem – mas, mesmo assim, o nome de Barrichello não parece mais figurar na lista de Eric Bouiller agora que se sabe que a recuperação de Kubica tem esbarrado no progresso lento dos nervos da mão direita.

Victor Guerin, o brasileiro que correu (e venceu) na F3 italiana neste ano, faz preparação física e mental na mesma clínica em que Kubica faz sua fisioterapia, a Fórmula Medicine. Ele não acredita que a musculatura do polonês se recupere a tempo. Lembrando que, antes do início da fase de fisioterapia, o prazo de recuperação total previsto pelos médicos era de um ano.

Em conversa off the record, o francês Bouiller admite que em 2012 seu time é Petrov e mais um. Petrov porque além de estar andando de forma bem decente e trazer patrocínio, é importante para a Fórmula 1, que correrá na Rússia de 2014 a, pelo menos, 2020. Sem Kubica, o outro carro ficará com Bruno Senna ou Romain Grosjean, que vai participar da primeira sessão de treinos livres em Abu Dhabi e no Brasil.

Das outras equipes, falou-se na Force India e na Toro Rosso. A mim, parece impossível. Na Force India já há três pilotos: o escocês Paul di Resta, que vem mostrando enorme potencial nesse seu primeiro ano como piloto titular; o alemão Adrian Sutil, que já está em seu quinto ano na F1 e neste ano foi o piloto que somou mais pontos para a equipe; e o também alemão Nico Hulkenberg, que se tornou candidato a super star ao colocar um carro da Williams na pole position do GP do Brasil em 2010, sua primeira temporada na categoria máxima.

Na Toro Rosso, só correm os jovens pilotos do programa da Red Bull, papel exercido com sucesso pelo atual bicampeão Sebastian Vettel em 2008. Ela é também mais uma escuderia com maior número de candidatos do que de carros. Além de Sebastien Buemi e Jaime Alguersuari, os titulares que colocaram a equipe em igualdade com a Sauber no Campeonato Mundial de Construtores, onde já começa a ameaçar o sexto lugar atualmente em poder da Force India.

Uma pena que seja assim, ambas seriam ótimas opções para Barrichello. Além dos bons motores Mercedes, a Force India tem um contrato de assessoria junto à McLaren que lhe provê de know how a engenheiros e pessoal administrativo. A Toro Rosso, que conta com motores Ferrari, amealhou dois patrocinadores fortes neste ano e se tornou a equipe que mais evoluiu na segunda metade do campeonato. Sua maior qualidade parece ser seu diretor técnico, o experientíssimo Giorgio Ascanelli, que foi engenheiro de estrelas como Ayrton Senna e Nelson Piquet e trabalhou na Ferrari, na McLaren e na Benetton. Mas esta opção também parece não existir. O que torna mais amargo ver Barrichello penar com o carro/carroça da Williams nesta que pode vir a ser sua última temporada na F1.

Em um artigo publicado nesta semana, o site Autosport.com listou os que considera os 10 melhores pilotos brasileiros na F1. Rubinho foi considerado o quarto melhor, atrás de, pela ordem, Ayrton Senna, Emerson Fittipaldi e Nelson Piquet e à frente de Massa, José Carlos Pace, Roberto Moreno, Maurício Gugelmin, Nelsinho Piquet e Antônio Pizzonia. Uma prova de que, apesar dos péssimos resultados de 2011, seu prestígio continua inabalado.

Já de Felipe Massa não dá para dizer o mesmo. A escaramuça do GP da Índia com Lewis Hamilton foi a sexta entre eles, o que está gerando para ambos os dois uma imagem pouco elogiosa. Não vou discutir aqui quem estava certo e quem estava errado, se bem que, na transmissão da corrida pelo SporTv, apontei Massa como culpado imediatamente. Hoje já não tenho tanta certeza.

Ele, Massa, argumenta com acerto que Hamilton esteve a seu lado quando eles estavam na reta. Para isso, teria usado o eficiente KERS da McLaren. Mas na hora da freada, Hamilton já tinha ficado um pouco para trás, Felipe freou mais tarde e fechou a porta. Como o inglês não conseguiu frear suficientemente, bateu com sua a roda dianteira direita na traseira esquerda da Ferrari.

Revi a cena em câmara lenta mais de três vezes, e foi exatamente isso que vi. Não digo que Felipe não tenha sido culpado, mas acho que não foi o único culpado. O que torna excessiva, até injusta, a punição a ele imposta. Johnny Herbert, o ex-piloto que assessorou os comissários esportivos nesta corrida, alegou que a punição foi porque Felipe poderia ter evitado o acidente – uma alegação que também se aplica a Hamilton, que tentou uma ultrapassagem pelo menos pouco provável. Tanto que a primeira reação de Martin Brundle e David Coulthard, ambos ex-pilotos e comentaristas da TV inglesa BBC, foi de que a culpa coubera ao inglês – se bem que, posteriormente, reviram suas posições. A meu ver, devia ter sido considerado incidente de corrida.

O fato é que as coisas entre os dois já foram bem além das ultrapassagens. Felipe, de fato, não poderia dar espaço a Hamilton; se o fizesse, o inglês perderia definitivamente o respeito por ele. Corridas são assim. Se um piloto se deixa superar sem chegar ao limite da resistência, logo deixa de ser considerado merecedor de respeito nestas situações. Ao vê-lo à frente, o raciocínio dos adversários é do tipo “vou lá e passo”. Bem, Hamilton agora tem certeza de que não é bem assim. Por isso Felipe está absolutamente certo ao fechar a porta no nariz dele.

Era para ter sido um fim de semana melhor. A nova asa dianteira da Ferrari, aquela mesma inspirada na da Red Bull, se mostrou extremamente eficiente. E permitiu ao brasileiro fechar a sexta-feira como o piloto mais rápido do dia. No sábado, a coisa começou a virar, mas ainda se mantinha em sexto, seu lugar natural na hierarquia atual da F1. Nas provas de classificação, porém, veio a quebra da suspensão dianteira direita após uma batida na extensão da zebra – coisa que vários outros pilotos com vários outros carros também fizeram sem sofrerem a mesma consequência. Já era o final do Q3, quando os pilotos saem com pneus novos para a última tentativa de melhorar os tempos.

Não deu, Felipe ficou em sexto. Pior, a seu lado alinhava exatamente Hamilton, que havia feito o segundo tempo e perdera três posições por não ter diminuído o ritmo no setor em que havia duas bandeiras amarelas agitadas. Essa situação exige que os pilotos diminuam a velocidade, e tanto Hamilton quanto o mexicano Sérgio Perez não só mantiveram o pé no fundo como até abriram a asa móvel. À noite, um repórter encontrou o brasileiro e lhe perguntou se ele já havia se tocado de que Hamilton alinharia a seu lado. “Já, vai ser uma daquelas corridas…”, foi a resposta.

Antes da largada, Hamilton passou o braço por cima dos ombros de Felipe e lhe desejou uma boa corrida. Não conseguiu convencer. Vai ser preciso bem mais do que isso para que o relacionamento deles volte à normalidade. Principalmente porque, na pista, as disputas dos dois já foram muito além do que se pode esperar. Poderia, de fato, ter sido uma corrida boazinha para Massa. Seu lugar seria, provavelmente, mais uma vez o sexto. Somaria mais oito pontos e superaria a barreira dos 100. Nada feito. Além da batida com Hamilton e o drive through punitivo ainda teve uma suspensão dianteira quebrada nas mesmíssimas condições da do sábado. A única diferença é que dessa vez foi a esquerda.

Quem também saiu desse GP com um gosto amargo foi Bruno Senna. A Renault adotou estratégias diferentes para seus dois carros, e coube a Bruno a errada. Petrov, punido com a perda de cinco posições no grid pelo acidente que causou ao bater aloucadamente em Schumacher no GP da Coréia, largou em 16º com os pneus duros, que viria a trocar pelos macios já na terceira volta; Bruno largou em 14º com pneus macios e, mesmo perdendo o KERS logo no começo, se manteve em nono até três voltas do fim, quando teve de parar para colocar os duros, caindo para 12º.

Com a valiosa ajuda da potência extra do KERS, provavelmente teria mantido o nono lugar. Mas não deixou de ser uma boa corrida, algo de que Bruno está precisando muito nessa hora em que as equipes começam a tomar decisões em relação a 2012. Mesmo que Kubica não volte neste próximo ano, existe intensa pressão francesa para que Grosjean tenha um carro para correr. E se for ele o escolhido, Bruno estará no mercado, exatamente como diversos outros pilotos. A grande maioria sem nem mesmo a pouca experiência do brasileiro, mas na hora da verdade o tamanho do cheque que vem junto tem muito mais peso nas decisões.

Lito Cavalcanti
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