Veja como os carros de F1 enfrentam os problemas com o calor

quinta-feira, 18 de novembro de 2010 às 13:24
Carro da Renault

Um motor de Fórmula 1 produz cerca de 850 cv. Se toda a energia dissipada por seus diversos componentes fosse convertida em potência, este mesmo motor poderia gerar 2.000 cv adicionais.

Apenas esta estatística espantosa já justifica os esforços que os engenheiros da mais avançada categoria do mundo dispensam à compreensão da dinâmica das altas temperaturas que atuam nos seus carros. Neste artigo assinado pelo diretor-executivo de engenharia da equipe Renault F1, Pat Symonds, o técnico dá outros exemplos surpreendentes da tecnologia que é ainda mais importante em pistas de regiões quentes como a do Bahrein, no Oriente Médio.

Assim como a etapa da Malásia, o GP do Bahrein possui a característica de ser disputado sob um intenso calor. Para se ter uma idéia, há uma diferença média já constatada de 10ºC entre a prova da Malásia e a da Austrália – algo que muda completamente o comportamento dos carros. A partir de quatro de abril, data da estréia do GP de Bahrein, saberemos também como isso afetará o desempenho dos bólidos naquele país de regiões desérticas. As principais influências do calor se dão na resistência do equipamento e na performance aerodinâmica.

De fato, a necessidade de refrigeração é inerente à conhecida ineficiência dos motores a combustão interna. Mesmo um propulsor de Fórmula 1 é muito ineficaz na conversão da potência pela queima da mistura ar/combustível em força de propulsão para as rodas traseiras.

Chamada cientificamente de “eficiência térmica”, esta relação é estabelecida geralmente ao redor de 30% – ou seja, se um motor de F1 produz aproximadamente 850 cv (650 KW) no banco de provas, ele perde simultaneamente cerca de 2.000 cv (1.500 KW)!

Onde toda essa energia se dispersa? Eis um dado curioso: uma pequena parte dela transforma-se no barulho característico dos carros de F1. Mas a maior porção de energia desperdiçada é dissipada de diferentes maneiras sob a forma de calor. Por exemplo, o óleo dissipa perto de 120 KW (160 cv) e o circuito de água, 160 KW (215 cv). Na caixa de câmbio a perda atinge 15 KW (20 cv), com mais 3 KW (7 cv) desperdiçados pelo sistema hidráulico daquele dispositivo. Os escapamentos eliminam 34% da potência restante na forma de calor, enquanto 15% da energia disponível é perdida na forma de combustível não queimado.

Esta dispersão de energia complica consideravelmente o controle de temperatura. Caso as trocas térmicas de um carro em movimento sejam extremamente eficazes, sua capacidade de refrigerar o motor depende do fluxo maciço de ar que trafega por sua superfície (por dentro e por fora, ou seja, o volume de ar que atravessa os radiadores). O objetivo é fazer com que o fluxo seja o mais rápido possível dentro das entradas de ar. Porém, a velocidade do ar que nestes dutos é de apenas 10% a 15% daquela atingida pelo veículo. Mesmo que o carro chegue a 300 km/h, o ar não ultrapassará de 30 km/h a 35 km/h.

Assim mesmo, as temperaturas dos circuitos de óleo e água variam em função de diferentes critérios. A temperatura da água oscila de acordo com a energia, ou pressão, aplicada em seu circuito (calculada em bar), enquanto que no caso do óleo esta variação depende da potência e da velocidade média do motor em relação ao percurso percorrido.

Renault R24

O controle da refrigeração não é uma tarefa fácil. Porém, é um parâmetro importante pois também condiciona a eficiência aerodinâmica. Assim, a tarefa dos engenheiros é encontrar o melhor equilíbrio entre a refrigeração ideal e o desempenho do monoposto. Mas há um problema: quanto mais ar é enviado para os radiadores, pior é a eficiência aerodinâmica. Este prejuízo pode chegar a 5%, algo que pode ser traduzido em uma perda de 0,4 segundo por volta – ou muitas posições no grid!

A qualidade do fluxo de ar depende das diferentes configurações dos radiadores. O Renault R24 possui 13 configurações distintas para adaptar-se às várias condições de pista encontradas durante a temporada. Para cada circuito, esta escolha leva em conta a temperatura ambiente, as particularidades do traçado (por exemplo, o tempo que o motor funciona em regime máximo) e as temperaturas de funcionamento do propulsor.

Normalmente, a temperatura do óleo supera 100°C enquanto que a da água, na qual adota-se uma pressão de 3,75 bar a fim de manter os limites térmicos de funcionamento do motor, pode atingir até 120°C. Eis uma comparação que explica bem a importância deste detalhe: o aumento de 5°C da temperatura da água corresponde à perda de 1 cv.

Na Fórmula 1 moderna, a aerodinâmica é algo vital. Por isso, para melhorá-la todas as equipes dedicam recursos e tempo de trabalho no túnel de vento (um equipamento caríssimo) à refrigeração, que é uma das maneiras de melhorar o fluxo de ar que atua no carro. Uma estatística ilustra perfeitamente esta situação e mostra o ritmo que as pesquisas têm progredido: atualmente, para uma queda de 10°C na temperatura do carro, a redução de eficiência aerodinâmica é 80% inferior àquela que os engenheiros considerariam aceitável há apenas quatro anos.

Vale a pena lembrar que …

 Um dia de muito sol faz parte dos ingredientes para se assistir a um GP de Fórmula 1, mas os pilotos e engenheiros preferem jornadas mais amenas. Para os engenheiros, o principal problema consiste em limitar a temperatura do óleo do motor e da caixa de câmbio. Quanto aos pilotos, eles podem perder mais de um litro de água durante a corrida.

 O motor de um carro de F1 trabalha a uma temperatura muito mais elevada que a de um carro comum. O óleo atinge 100 °C, a água chega a 120°C !

 Enquanto os monopostos estão no grid, ventiladores carregados com gelo seco enviam ar frio para os radiadores…

 34 % do calor gerado por um motor é dissipado pelos tubos do escapamento, que podem atingir 800°C.

Legendas da Foto 1

*Caixa roxa: Os freios atingem temperaturas próximas dos 1.000°C e eles contam com o fluxo de ar para refrigerá-los.

Caixa preta: Os radiadores são os salvadores da pátria: sob pressão, a água da refrigeração é mantida a uma temperatura superior a 100ºC.

Caixa vinho: A refrigeração do carro é uma ciência a parte. O projeto da carroceria do modelo Renault R24 permite evacuar o ar quente de acordo com 13 diferentes configurações.

Caixa azul: O ar quente é evacuado pelas saídas “guelra de tubarão” localizadas sobre as caixa laterais, onde estão localizados os radiadores.

(30/03/2004)

www.autoracing.com.br

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