Sai Red Bull, entra McLaren

quarta-feira, 21 de março de 2012 às 15:32

Button e Hamilton - pódio Melbourne 2012

Para parar o McLaren de Button, só o McLaren de Hamilton

Conteúdo patrocinado por: selopatrocinio

O Grande Prêmio da Austrália foi uma exibição de gala de Jenson Button. Uma vitória em que ele exibiu velocidade, estratégia, sangue frio e maturidade. E que deixa como saldo bem mais que os 25 pontos do primeiro colocado – enfatiza também que, enfim, os temíveis, até então imbatíveis Red Bull já têm adversário à altura. Ou mais do que isso. Pelo que se viu no circuito de Albert Park, não tem pra ninguém. Só tem Jenson Button para Lewis Hamilton e Lewis Hamilton para Jenson Button.

Os Red Bull? Aqueles que dominaram 2010 e 2011? Que eram tidos e havidos como os melhores  desde a pré-temporada? Dessa vez os carros desenhados pelo gênio Adrian Newey não parecem estar à altura das expectativas. Largaram em posições decepcionantes, não acompanharam o ritmo de Button e só puseram um carro no pódio porque existe uma certa Lei de Murphy – somada, é claro, à habilidade com que Sebastian Vettel aproveitou a sorte para chegar em segundo e ao azar com que relegou Hamilton a terceiro.

Já desde os treinos ficou claro que, sem o precioso auxílio dos gases de descarga soprados a 400 quilômetros por hora para dentro dos difusores, os Red Bull, irreconhecíveis, já não são o que eram. Tudo que conseguiram na sexta e no sábado foram a quinta e a sexta colocações. Pior: o mais rápido era o Red Bull errado, o de Mark Webber, que mesmo perdendo o KERS no qualify, superou seu companheiro bicampeão, que cometeu erros indignos de seu currículo na sexta-feira e no sábado. Foram apenas 0s017 entre os dois, mas isso sem os 80 cavalos extras do KERS mostra que, naquele qualify, o australiano viveu seu dia de Vettel.

Mesmo assim foi tão apagado o qualify dos Red Bull que, quando terminou, eles mal eram citados: o único assunto era a tranqüilidade com que Button tinha cumprido sua tarefa. Mesmo sabendo que a pole position se tornara quando Hamilton marcou 1min24s992 já na primeira tentativa, Button entrou na pista e marcou 1min25s074. Ao garantir o segundo lugar, fez da primeira fila do grid uma exclusividade da McLaren, orgulho que a equipe inglesa não sentia desde o GP da Europa de 2009.

Melhor ainda do que no sábado, Button superou todas as dificuldades do domingo. Superou Hamilton nos primeiros metros, comandou a corrida com maestria, mostrou inteligência quando necessário, foi rápido quando era preciso. E ainda permitiu à McLaren comemorar, pela 50ª vez em sua história, o domínio total de uma corrida: pole position, vitória de ponta a ponta (descontadas as paradas para troca de pneus) e volta mais rápida.

Mas tudo poderia ter sido bem diferente se não fosse pela tática com que ele e seu engenheiro Tom Stallard neutralizaram a única ameaça séria: Lewis Hamilton. Batido na largada, ele se manteve a distância segura para não estragar seus pneus, destino inevitável para quem segue de perto um outro carro e deixa de receber todo o ar que precisa para manter a pressão aerodinâmica na intensidade necessária. Foi então que Jenson e Stallard decidiram adiar a troca de pneus até não mais poder. Por estar em segundo, Lewis tinha de esperar a troca do líder – só então poderia tentar fazer uma volta kamikaze para abrir uma vantagem que lhe permitisse retornar à pista à frente de Button.

Não foi isso que aconteceu. Como Button ficou na pista até a 16ª volta, quando se viu livre Hamilton não tinha mais aderência para voar. Fez uma volta em tempo abaixo do normal e perdeu segundos valiosos até chegar aos boxes, na volta seguinte. Para piorar, ainda teve a má sorte de voltar à corrida atrás de Sérgio Perez. A estratégia do mexicano, que largara em último no grid, era fazer apenas uma troca – como ainda estava com o primeiro jogo, Perez se arrastava na pista. Além do acerto da estratégia, Button se valia também da ajuda da sorte.

Seu desafio seguinte foi manter os pneus aquecidos na saída do Safety Car, com o Red Bull de Sebastian Vettel em seus calcanhares. Até ali, o jovem alemão não dera nenhum sinal de ser capaz de ameaçar o líder, mas de repente ele estava colado na traseira do McLaren número 3. Como a corrida havia se iniciado às 17 horas, e já passava das 18, era grande a chance de queda da temperatura dos pneus e freios. Mais uma vez, o inglês manteve tudo sob controle. Para enfatizar seu domínio, ainda se deu ao luxo de fazer a melhor volta da prova na 56ª das 58 voltas que compuseram o GP da Austrália.

Encerrada a prova, ficou no ar a desconfiança de que, de todas as mudanças preconizadas após a pré-temporada, a principal foi a troca da guarda: sai Red Bull e entra McLaren no papel de dominadora. Ora, não nos precipitemos, argumentavam os mais experientes. Mas a sábia ponderação só durou até ser divulgado que, por erro de cálculo, tanto Hamilton quanto Button haviam largado com menos gasolina do que deviam e passaram a um ritmo moderado desde a oitava das 58 voltas. Ou isso ou não chegariam à bandeirada final.

Olhando-se apenas o resultado, o segundo lugar de Vettel, à frente de Hamilton, ainda dá margem a esperanças. Mas foi a sorte, e não a velocidade, que permitiu à Red Bull ter um de seus carros no pódio. Vettel era terceiro quando o Safety Car entrou na pista exatamente quando Button e Hamilton saíam de sua segunda troca de pneus. Mergulhando nos boxes imediatamente, o alemão ganhou cerca de 10 segundos e se postou à frente do segundo McLaren. Em uma pista que não favorece ultrapassagens, onde as duas principais retas não são longas o suficiente para que a asa móvel e o KERS se façam valer, nada havia a ser feito.

Sim, é grande o risco de que, já neste fim de semana, a McLaren volte a fazer barba, cabelo e bigode. A esperança é que, por não ter curvas de alta velocidade que ressaltem as qualidades aerodinâmicas, por ser recheado de curvas de média e baixa que priorizam o equilíbrio nas freadas e a capacidade de tração, Albert Park tenha induzido essa alarmante demonstração de superioridade. Difícil de acreditar.

É claro que foi um fim de semana com resultados abaixo do normal para a Red Bull e que seus carros devem apresentar evolução em Sepang, onde as curvas são de alta, média e baixa e, portanto, a boa aerodinâmica que caracteriza os carros saídos da pena de Adrian Newey. Mas no ano passado, nesta mesma pista, Vettel largou na pole e venceu a corrida. É querer se enganar pensar que os McLaren são deficientes no quesito aerodinâmica. Prova de sua eficiência foi dada em Barcelona, onde Button e Lewis raras vezes usaram os pneus macios ou supermacios e nem por isso deixaram de figurar entre os mais rápidos.

Este próximo será, sem dúvida, um Grande Prêmio da maior importância. Como serão os da China e do Bahrein (se este último realmente vier a acontecer), que se seguirão. Até lá, serão pequenas, mínimas as chances de inovações significativas nos carros. Uma coisinha aqui, outra ali, e olhe lá. Distante da Europa, com pouco tempo disponível, não há como se esperar melhoras significativas em Sepang. Nem mesmo da Ferrari, que teve parte de seu staff chamado de volta à Itália para as devidas e embaraçosas explicações a um Luca di Montezemolo sedento de vitórias – ou de sangue.

De pouco adianta citar o quinto lugar de Fernando Alonso ao fim da corrida. Todos sabem que o resultado se deveu ao piloto, não ao carro. E olha que ele foi ajudado pelas quebras de Michael Schumacher e Romain Grosjean e pela enésima corrida medíocre, mixuruca, apagada de Nico Rosberg. Oitavo seria seu resultado natural – sua Ferrari perde enormes nove quilômetros de velocidade final para a McLaren de Hamilton, o mais veloz, que passou na speed trap, a 123 metros antes da curva Um, a 313,8 km/hora; Alonso, a 304, foi o 14º. O mais embaraçoso é que o segundo e o terceiro foram os Sauber, que usam os mesmíssimos motores Ferrari: Kobayashi a 313,6 e Perez a 311,9.

O argumento de que a Ferrari inclinaria mais seus aerofólios para ganhar velocidade nas curvas já não se aplica. Nestes tempos de asas móveis e KERS, todos carregam ao máximo, ou quase, seus aerofólios. Os problemas parecem ir bem além. Um deles é, sem dúvida, o apetite com que mastiga os pneus. Felipe Massa foi o primeiro a trocá-los – à exceção de Bruno Senna e Daniel Ricciardo, envolvidos na lambança da primeira curva. Quando Massa parou, na 12ª volta, seus tempos já haviam caído cerca de um segundo, mesmo com o carro mais leve. Alonso parou na 14ª, acusando queda de meio segundo em seus tempos. Entre eles, o Mercedes de Nico Rosberg, que já perdia 1s3 quando parou na 13ª volta.

De onde viria a enorme deficiência da Ferrari? Esta é a pergunta de um milhão de dólares. A Mercedes, pelo menos, diz saber o que fazer para reduzir o gasto dos pneus – o que, aliás, parece ser seu único problema. No que se refere à velocidade, absoluta tranquilidade: Rosberg foi o quarto melhor, com 311,8 km/hora. Pode não ser suficiente para ameaçar os McLaren, mas as longas retas de Sepang  têm tudo para colocar tanto Michael Schumacher quanto Rosberg de novo à frente das Ferrari. O que não vai contribuir em nada para o bom ambiente de Maranello. Afinal, dois dos quatro pilares do Departamento Técnico da equipe alemã têm longa história na Ferrari: Ross Brawn e Aldo Costa, este aliás demitido no meio do ano passado porque o carro de 2011 não correspondeu à tradição da Ferrari…

A isso se soma também a presença da Lotus do novato Romain Grosjean à frente dos carros vermelhos – bem à frente, é bom dizer. Ora, um carro que se chama Lotus mas nada tem a ver com os verdadeiros Lotus, que se chamava Renault sem ser Renault, faz o terceiro melhor tempo e Alonso e Massa nem chegam aos 10 primeiros. Foi a primeira vez em 22 corridas que Felipe não chegou ao Q3; para Alonso, foi a primeira desde o GP da Turquia de 2010, quando ironicamente ele alinhou no mesmíssimo 12º lugar que ocupou no domingo.

Mas se Alonso conseguiu amenizar as dores de Maranello com uma atuação próxima da perfeição, Massa só as agravou – mas agora surge a tal da luz no fim do túnel. A Ferrari comunicou sua decisão de substituir o chassi que Massa usou na Austrália. Só pode ser isso. Pior do que nunca, o carro não parava no chão, destruía os pneus com voracidade e não apresentava nada que se pudesse elogiar. Na classificação, tomou 0s945 do espanhol, mesmo usando um jogo de pneus a mais. Na corrida, sua volta mais rápida foi a 15ª, com 1min31s940, enquanto a de Alonso foi a sétima, 1min30s277 (a de Button foi 1min29s187). Tinha de ter algo errado. Massa não é isso, nunca foi e nunca será. Pode não ser um Alonso, mas também não é esse desastre. Se não for culpa do chassi, então a luz no túnel é o trem chegando e não há mais salvação.

Para completar, a batida com Bruno Senna quando os dois disputavam a 13ª posição com Ricciardo deu o toque final e melancólico. Coisa de corrida, sim, sem dúvida. Coisa de corrida medíocre, acrescente-se. Um fim de semana para eles, e para todos que por eles torcemos, esquecermos o mais rápido possível. Bruno largou em 14º e vinha por ali quando bateu com Massa. Mesmo tendo em mãos um carro semelhante ao que Pastor Maldonado colocou no oitavo lugar do grid e ameaçou o quinto lugar de Alonso até a penúltima volta.

Pelo que se viu, vai ser dura a vida do jovem brasileiro neste ano. O carro da Williams parece ser bem melhor do que mostrou a pré-temporada, mas exige empenho. Depois de uma classificação caracterizada pela prudência excessiva, Bruno tomou seis décimos de segundo do venezuelano no que se refere à melhor volta de cada um: a dele foi 1min30s855, a de Maldonado, 1min30s254.

Sim, é de se esperar que a Ferrari melhore seu acerto em Sepang, que Bruno e Massa, mais adaptados a seus carros, se mostrem mais competitivos. Mas isso se espera também de todas outras equipes, de todos outros pilotos. Porque, pelo que se viu na Austrália, as disputas serão bem mais próximas, bem mais intensas para todos, menos a McLaren, que deve se manter tranquilamente à frente da Red Bull, da Mercedes e da surpreendente Lotus – que tem em Kimi Raikkonen e Grosjean uma dupla capaz de incendiar o Mundial.

A evolução da Lotus, da Sauber, da Toro Rosso farão do segundo pelotão um campo de batalhas encarniçadas, onde cada metro de pista será disputado como se valesse a vitória. A Williams, surpreendentemente, parece reunir condições de enfrentar esse pelotão de igual para igual. Resta a Bruno Senna cumprir a expectativa que algumas de suas boas atuações em 2011 deixaram. A competitividade que este 2012 esboça não permite menos.

A Ferrari pode até ser mais rápida, como mostrou enquanto ainda tinha pneus em condições, mas precisa com urgência encontrar um acerto digno do nome, que lhe dê velocidade nas retas e poupe os pneus. Mas isso de nada vai adiantar para Felipe Massa se ele e seu engenheiro não encontrarem uma solução que lhe permita pelo menos se manter à altura da tradição de Maranello. O clima não podia ser mais tenso. Toda a Itália já clama por sua substituição e sugere até um nome para substituí-lo Jarno Trulli. Sim, ele mesmo. Aquele que tanto reclamou da direção do seu carro que nem seu protetor Mike Gascoyne aguentou. Se bem que seu substituto, o russo Vitaly Petrov, abandonou a corrida da Austrália com problemas na…direção.

Mas uma coisa de bom esse GP inaugural deixou claro: esse campeonato vai pegar fogo. Nem que seja atrás da McLaren…

Lito Cavalcanti

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