Reminiscências

terça-feira, 17 de agosto de 2021 às 13:18

Fereno Szisz

Colaboração: Antonio Carlos Mello Cesar

Carro monolugar com rodas aparente possui origem nos primórdios do século XX, projetados para eliminar toda e qualquer sobrecarga, quanto menor o peso maior a velocidade. O primeiro Grand-Prix em circuito fechado, modelo de prova até hoje adotado pela F1, aconteceu na França às margens do rio Sarthe, vale do Loire no ano de 1906, vencido por um Renault nas mãos do húngaro Fereno Szisz. Anteriormente corridas eram realizadas entre regiões através de estradas.

Alguns autódromos tradicionais têm na ancestralidade a mítica dos seus eventos, construídos há quase 100 anos continuam recebendo relevantes categorias do esporte a motor: Monza (1922), Spa-Francorchamps (1921), Le Mans (1923), Mônaco (1929), Nurburgring (1927), Brands Hatch (1928), Indianápolis, destes, o mais antigo (1909) e o caçulo Interlagos (1940).

Reconhecido junto a Association Internationale des Automobile Club Reconnus o GP Cidade do Rio de Janeiro (1933 a 1954) atraia pilotos europeus, argentinos, uruguaios, protagonistas de bons duelos com os brasileiros Chico Landi, Manuel de Teffé, Nascimento Junior, Irineu Correa morto na terceira edição da prova, após chocar-se contra uma árvore e cair no canal.

Traçado de rua belíssimo 11 km emoldurado com praias e mata Atlântica, na época, capaz de fazer inveja ao GP de Mônaco, porém carregava um cognome aterrador: Trampolim do Diabo. Largada Av. Marquês de São Vicente, depois Bartolomeu Mitre, Visconde de Albuquerque, Av. Niemayer vagueando sobre o mar rente à costa rochosa e por fim subida do morro da Gávea, hoje ocupado pela favela da Rocinha. 20 voltas, 223 km.

Vencedor da corrida inaugural Manuel de Teffé foi carregado no ombro dos torcedores, além de receber um telegrama de Benito Mussolini, chefe do Partido Nacional Fascista Italiano, congratulando o triunfo e para mais agradecer por usar uma máquina italiana. Teffé era membro do AIB (Ação Integralista Brasileira) movimento político ultranacionalista, conservador, corporativista, católico de extrema direita, inspirado no fascismo itálico e o bordão: Deus, Pátria, Família.

Com a expansão da indústria veicular competições automobilísticas ganharam enorme popularidade. Adolf Hitler imbuído de provar a supremacia ariana, o brilhantismo dos engenheiros alemães, financiou projeto envolvendo quatro empresas, Horch, Venderer, Audi e DKW, cujo objetivo intencionava produzir um carro imbatível nas provas de Grand-Prix. Encarregado da concepção e desenho Ferdinand Porsche entregou aquilo que foi, talvez, o primeiro monolugar com motor traseiro e 500 cavalos. Batizado Auto Union.

Dirigido por Von Stuck, um nobre germânico, este carro após intenso duelo com a Alfa Romeo do italiano Carlo Pintacuda, acabou em segundo lugar no GP Cidade do Rio de Janeiro 1937. Pintacuda, além de vencer, ganhou uma machinha de carnaval composta por Armando Cavalcanti e Klécius Caldas: ”Sou mole pra falar, mas um Pintacuda pra beijar”.

Caso eu afirmasse que Chico Landi não foi o vanguardista representante brasiliano no velho mundo, apesar de claros registros atestando sua presença no GP de Bari, Itália, 1947. Maior espanto causaria minha recusa em aceitar Lewis Hamilton como primeiro negro na F1 ao creditar tal posto a Benedicto Lopes (c antes do t) brasileiro raiz, descendente afro, nascido na cidade de Campinas, interior de São Paulo.

Dito como todos o conheciam, origem modesta, empreendedor, chegou a possuir duas oficinas mecânicas bastante conceituadas no Rio de Janeiro. Época onde somente a elite endinheirada desfilava seus automóveis.

Apaixonado por carros e motores iniciou suas aventuras no automobilismo em 1934, venceu na estrada de Petrópolis, no circuito do Maracanã, Chapadão, Quinta da Boa Vista e varias participações no relevante GP do Rio. Numa delas, embaixo de chuva, atropelou um sujeito que fugia da polícia, outra vez, há duas voltas do fim, quando liderava foi obrigado a desistir depois de choque com retardatário.

No ano de 1937, convidado pelo Automóvel Clube Português, rumou para Europa, contrato de três corridas, duas em Portugal e uma na Itália, pilotando um Alfa Romeo. Retornou ao Brasil carregando três troféus, segundo lugar no Estoril, terceiro em Vila Real, novamente segundo no circuito de Pescara. Impressionante!

Automobilismo pretérito não era algo amador, romântico, como cronistas fazem crer, grandes marcas envolvidas, Bugatti, Maserati, Auto Union (Audi), Mercedes, Fiat, Alfa. Perigoso sim, por vezes mortal, talhado para homens corajosos, mas nunca voltado aos diletantes e inábeis. Injusto modo pelo qual a memória histórica deserdou registro de vitórias, recordes, daqueles personagens antecedentes aos anos cinquenta.

Antonio Carlos Mello Cesar
São Paulo – SP

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