O motor que reescreveu a história da F1

segunda-feira, 5 de junho de 2017 às 1:26
Jim Clark - Lotus 49 - Holanda 1967

Jim Clark – Lotus 49 – Holanda 1967

Há cinquenta anos, no domingo, o Lotus 49 apareceu em público pela primeira vez. Se você estivesse presente no GP da Holanda naquele fim de semana, não teria acreditado que aquela era a estréia de um carro, e particularmente um motor, capaz de reescrever a história da F1. Não havia o estardalhaço de hoje em dia.

Quando a Mercedes e a Ferrari chegaram à Espanha para começar a temporada européia da atual temporada, todas as nuances aerodinâmicas adicionais, independentemente de quão minúsculas, foram registradas, examinadas e discutidas em detalhes. E isso não foi uma surpresa, provavelmente porque essas duas equipes são as protagonistas deste campeonato.

Em 1967 a Lotus não era desconhecida, afinal já tinha vencido 25 GPs e dois campeonatos mundiais. Você pensaria, com a introdução de um carro totalmente novo a partir da caneta do genial Colin Chapman, além de um novo motor, sua chegada a Zandvoort pode ter causado um tumulto. De acordo com os padrões de hoje, seria o equivalente a Red Bull aparecendo em Baku com um motor Mercedes na parte traseira de um revolucionário chassi de Newey.

Em 1967, o ritmo da vida na F1 era, digamos, mais relaxado. Não havia fanfarra; Nem um único comunicado de imprensa. Tendo apoiado a Cosworth com £ 100,000 (que não era uma soma muito grande, mesmo naquela época) para projetar e construir o DFV, a Ford não queria publicidade negativa, receosa que o motor com seu nome pudesse falhar em sua primeira tentativa.

Esta era uma viagem ao desconhecido em todos os sentidos. O carro, nas mãos de Graham Hill, completou algumas voltas na na pista de teste da Lotus em Norfolk. Então, foi carregado, junto com outro novo chassi que nunca tinha andado e levado para a Holanda, pronto para Hill e Jim Clark competirem na terceira corrida do campeonato de 1967.

Ainda mais absurdo, a primeira vez que Clark viu o carro foi quando ele chegou a Zandvoort, já que seu exílio fiscal auto-imposto, o mantinha longe da fábrica. Moldagem do assento? Não seja bobo. Tendo estado com a equipe por sete temporadas, a Lotus estava familiarizada com uma estatura delgada que, de qualquer maneira, era menor do que Hill. Graham estava confortável no carro. Então, com alguns ajustes nos pedais e a adição de um pouco de espuma aqui e ali no cockpit, o assento cairia como uma luva para Jimmy.

No cenário imaginário acima mencionado de um Red Bull totalmente novo, Daniel Ricciardo e Max Verstappen dificilmente poderiam sair da garagem, graças a uma parede de cinegrafistas e fotógrafos tropeçando em desespero para obter a primeira imagem.

Em 1967 – e isso necessita de um pouco de fé – o carro de Clark foi tirado de baixo do toldo ao lado do transportador da Lotus e empurrado para a parte de trás do paddock. Lá, Clark subiu a bordo e começou a ajustar seus espelhos. Havia dois mecânicos da Lotus, um técnico da Firestone e uma bateria escrava para ligar o carro. Nada mais.

Um estudante e quatro idiotas olhavam do outro lado de uma barreira logo atrás da Lotus. Um deles tinha uma câmera ao redor de seu pescoço. Mas ele não estava usando-a. O bicampeão do mundo puxou sua máscara facial, baixou as óculos e entrou a pista. Começou assim, quase despercebida, uma das maiores combinações de homens e máquinas da F1.

Lembre-se, Clark não se sentiu assim naquela hora. Sua impressão inicial era que havia dois motores na parte de trás do carro verde com uma listra amarela. Havia muito pouca potência abaixo de 6.500 rpm, momento em que ele chegava tão bruscamente que a traseira ‘soltava’ e as rodas giravam em falso. E a preferência de Clark era por uma resposta uniforme ao longo da faixa de rotações. “Quando a potência entra a 6.500 rpm, a explosão é tamanha que o carro fica quase incontrolável”, disse Clark. “Você tem potência ou não tem”.

Clark estava realmente preocupado com algo que “não parece certo” com a estabilidade. Uma checagem dos mecânicos não encontrou nada de errado. Quando Clark experimentou o mesmo sentimento no segundo dia de treinos, ele se recusou a continuar.

Dado que o escocês de modos suaves não era nem um pouco turrão, isso dizia muito sobre sua preocupação tácita sobre a fragilidade ocasional dos projetos de Chapman. Desmontando o carro, os mecânicos descobriram que a sensibilidade de Clark tinha sido aguda o suficiente para sentir o efeito de um rolamento começando a quebrar no interior do cubo traseiro direito.

Hill, entretanto, não teve problemas para colocar o Lotus 49 na pole. O fato de ele ter sido 6,2 segundos mais rápido que o recorde de volta foi um sinal do que estava por vir.

No final da primeira volta, Hill liderava com grande folga. Clark, tendo largado na terceira fila, pulou para o segundo lugar quando o carro de Hill parou com uma engrenagem do câmbio quebrada. Sentindo-se mais confortável a cada volta, Clark assumiu a liderança pouco depois e ganhou com 27 segundos de vantagem sobre o segundo colocado.

Seria a primeira das 176 vitórias na F1 para o Ford-Cosworth V8 nas suas várias formas durante as próximas 18 temporadas. Clark estava destinado a estar por apenas mais nove meses. Se esse gênio silencioso tivesse sobrevivido ao terrível acidente de F2 em Hockenheim, a história que começou tão discretamente em 4 de junho de 1967 poderia ter sido ainda maior.

Autor: Maurice Hamilton para a ESPN
Tradução: Adauto Silva

AS - www.autoracing.com.br

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