MotoGP – Motegi 2019 – Catch us if you can

segunda-feira, 21 de outubro de 2019 às 15:18

Marc Marquez – Motegi 2019

Colaboração: Carlos Alberto Goldani

Mesmo com o mundial já decidido, o público japonês lotou as dependências do autódromo da Honda em Motegi para o GP do Japão de 2019. O show das Yamaha nos testes livres que antecedem a prova já não impressiona, todos sabem que a única preocupação de Marc Márquez é obter um tempo suficiente para não participar do Q1. Enquanto outros pilotos utilizam pneus novos e pouco combustível nas últimas voltas de um treino para marcar tempos extraordinários e figurar nas manchetes, Márquez prossegue na sua rotina de melhorar a adequação do equipamento para a prova.

Alguns fatores extra pista acrescentaram atrativos para a legião de espectadores que afluíram ao circuito, durante a vistoria prévia da pista antes das provas, uma coreografia executada pelos auxiliares (voluntários) foi inusitada e criativa. Causou algum espanto quando no alinhamento das motos para a largada, ao contrário de todos os pilotos que equiparam seus protótipos com pneus para pista seca, a moto #93 se apresentou com compostos para a pista molhada. Óbvio que era uma manobra diversionista, ninguém entendeu a razão e os pneus foram trocados antes da largada.

Os presidentes das 3 fábricas nipônicas que participam da MotoGP, Honda, Yamaha e Suzuki, estiveram presentes visitando os boxes das equipes. . A TV oficial mostrou uma visita do presidente da Yamaha aos boxes da satélite Petronas para trocar umas poucas palavras com Franco Morbidelli Talvez por acaso ou para passar uma mensagem subliminar, a imagem seguinte foi do box de Valentino Rossi, só com o piloto e mecânicos. A TV também flagrou o presidente da Suzuki acompanhando com atenção a luta de Alex Rins na tentativa de ganhar a posição de Cal Crutchlow nas últimas voltas (não conseguiu).

Não existe nenhuma lógica na discussão sobre quem é historicamente o melhor ou o mais importante piloto de todos os tempos. Não tem como comparar carreiras distintas desenvolvidas em tempos e ambientes fundamentalmente diferentes. A avaliação numérica não faz sentido, por exemplo, o formato atual de qualificação para a pole só foi criado em 1974, portanto utilizar o argumento que Marc Márquez detém o recorde de 90 poles na MotoGP implica em ignorar 25 anos de história. Muitos dos resultados de Giacomo Agostini nas pistas foram obtidos em uma época onde a vantagem dos equipamentos que ele utilizava era abissal, houve provas onde ele colocou uma volta inteira sobre o segundo colocado, algo impensável nas condições atuais. Em uma entrevista recente Andrea Dovizioso declarou que o talento de Valentino Rossi era superior ao de Marc Márquez, infelizmente não especificou qual o “talentômetro” que utilizou como métrica para sustentar esta afirmação.

A lógica indica que o grid da MotoGP contempla os melhores pilotos em duas rodas do planeta e, portanto, é natural que quem conseguiu os melhores resultados nas últimas temporadas seja o mais comentado, entretanto em qualquer hipótese o título de “Melhor de todos os tempos” é inadequado. Outro exemplo, em um programa de TV na última semana um jornalista esportivo afirmou com convicção que o Brasil nunca produziu um atleta mais importante que Neymar Jr. Este cidadão provavelmente não acompanhou a carreira de Ayrton Senna e nunca ouviu falar que a mais de 30 anos Pelé foi eleito o Atleta do Século, em uma eleição em que participaram jornalistas das 20 mais importantes publicações de esportes (não só de futebol) do mundo.

Se declarar que Valentino Rossi é o melhor piloto da MotoGP que já existiu é controverso, porém não há como negar que o italiano tem amplo domínio dos meios de comunicações. Como nas últimas provas a moto que Rossi comanda é a pior Yamaha classificada, no Japão ele confidenciou que está negociando uma troca de experiências (swap) com Lewis Hamilton. O líder do Mundial de F1 cederia a sua Mercedes para um teste e, em contrapartida, italiano disponibilizaria para o britânico a sua M1. Rossi é ídolo em seu país, já testou uma Ferrari, o fato de mencionar um monoposto de um concorrente já foi suficiente para desviar o foco de atenções de seus resultados.

Se considerar a prova de Motegi como um espetáculo, o máximo que se pode comentar sobre o roteirista é que a criatividade não é o seu forte. A prova não contemplou fortes emoções. Marc Márquez (Honda) decidiu impor seu ritmo desde o início, saiu na frente, abriu vantagem e permaneceu na liderança durante toda a prova, exceto em um pequeno trecho da pista na primeira volta, quando foi ultrapassado por Fábio Quartararo (Yamaha), posição que recuperou em seguida. Quartararo procurou acompanhar o líder e, como não obteve sucesso, acomodou-se na 2ª posição sem ser incomodado. Atrás dele houve alguma disputa entre Dovizioso (Ducati), Vinales (Yamaha) e Morbidelli Yamaha). O italiano conseguiu a 3ª colocação, Vinales ficou em 4º e Morbidelli perdeu o fôlego no final e entregou a 5ª posição para Cal Crutchlow (Honda) nos últimos metros da prova. As duas Suzuki chegaram em 7º (Rins) e 8º (Mir), seguidos pelas Ducati de Petrucci (9º) e Miller (10º). Resumo da ópera: 3 Ducati, 3 Yamaha, 2 Honda e 2 Suzuki no top ten. No GP do Japão houve apenas 2 desistências por quedas, Iannone faltando 16 voltas e Rossi faltando 6. Fato incomum foi a 2ª pane seca do vencedor durante a volta de comemoração nesta temporada, Márquez foi rebocado em seu percurso para o parque fechado pela KTM de Hafizh Syahrin.

Para os anais da história, o GP do Japão vai ficar registrado como a vitória nº 54 de Marc Márquez na classe principal, o 100º pódio de Andrea Dovizioso e o GP nº 200 de Jorge Lorenzo. A Honda conseguiu em seu próprio circuito alcançar o 25º mundial de construtores. Os 350 pontos de Márquez até agora igualam ao número dos obtidos por Jorge Lorenzo na sua temporada dos sonhos em 2012, ano que venceu o mundial com uma Yamaha. Em relação ao piloto espanhol, que apresenta muita dificuldade em controlar a RC213V, o próprio presidente da Honda declarou em Motegi que Lorenzo continua na equipe em 2020.

Algumas decisões de equipes na MotoGP são difíceis de entender, Johann Zarco teve temporadas brilhantes em 2017/2018 com uma Yamaha da Tech3. Depois de uma passagem melancólica pela KTM, Zarco estava acertado para ser piloto de testes da equipe oficial da Yamaha na próxima temporada. A correção de um problema no ombro de Takaaki Nakagami o afastou das 3 últimas provas nesta temporada, a sua equipe (LCR) contratou o francês para suprir a sua ausência. Por ter aceitado pilotar uma Honda em 3 provas, Zarco foi comunicado do rompimento do acordo com a Yamaha para 2020.

A MotoGP está enfrentando nas últimas temporadas um problema que já atingiu outros esportes, sempre com resultados nefastos: previsibilidade. Quando o vencedor é previamente conhecido o espetáculo perde o interesse. Ainda estamos longe de um ponto de saturação e a mídia se esforça para criar novos desafiantes para Marc Márquez. Andrea Dovizioso, que por 3 anos pilotou o melhor equipamento do grid, mostrou fôlego insuficiente. Já houve quem apostasse em Maverick Vinales e Alex Rins, sem resultados práticos. A bola da vez é o francês Fábio Quartararo, que em toda a sua carreira venceu um único GP. Seu desempenho é promissor, especialistas que cobrem o campeonato preferem aguardar a evolução e reavaliar quando a sua equipe estiver disputando em pé de igualdade com as outras, sem as vantagens permitidas pelas concessões do regulamento.

Por enquanto Marc Márquez e sua Repsol-Honda estão representando o papel da banda Dave Clark Five em um filme lançado em 1965: “Catch us if you can”.

Carlos Alberto Goldani
Porto Alegre – RS

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