MotoGP – Hábito estranho

terça-feira, 24 de abril de 2018 às 16:37

Marc Marquez – Austin 2018

Colaboração: Carlos Alberto Goldani

A MotoGP tem um costume bizarro. Sempre que visita um circuito na América do Norte, 23 dos melhores pilotos do mundo cumprem o ritual estranho de disputar quem vai compartilhar o pódio com Marc Márquez. Tem sido assim desde 2011, a primeira corrida do atual campeão do mundo nas terras do Tio Sam disputando a Moto2. Desde então o espanhol venceu todas as doze provas que disputou nos EUA, duas vezes na Moto2 (Indianapolis) e dez na MotoGP (uma em Laguna Seca, três em Indianapolis e seis em Austin).

O Circuito das América em Austin é esplêndido, o layout é altamente técnico e tem um pouco de tudo, exige muito dos freios, recompensa máquinas com boa aceleração, tem curvas lentas e rápidas criando combinações que recompensam os mais talentosos.

A maioria dos pilotos adora correr no GP dos Estados Unidos. Valentino Rossi resume dizendo que é desafiador pilotar com diversas curvas “emocionantes”. Entretanto, embora o charme da pista, o efeito Márquez produz corridas sem brilho. A margem média que separa o vencedor de seu mais próximo competidor em todos os GPs disputados no circuito é acima dos três segundos, uma eternidade na MotoGP, descontado ainda o fato do campeão do mundo reduzir muito a velocidade na volta final porque a vitória está garantida. No GP deste ano o piloto manteve em toda a prova uma média de 2,06 baixo e na última volta fez 2,09 alto, mais de 3 segundos mais lento. Nunca houve uma disputa até a bandeirada final, a menor diferença entre os dois primeiros foi de 1,5 segundos para Dani Pedrosa em 2013, a maior 6,7 segundos sobre Jorge Lorenzo em 2016. De um modo geral, nos seis GPs realizados a disputa pela vitória deixou de existir antes da metade da prova. O Circuito das Américas é equipado para hospedar excelentes corridas, porém nunca produziu bons espetáculos na MotoGP para os presentes nas arquibancadas e telespectadores.

O roteiro do GP dos EUA é previsível. Os 24 pilotos se apresentam na pista na sexta-feira, assistem Márquez a conquistar a pole no sábado e vencer por uma grande margem no domingo. O GP de 2018 cumpriu o script à risca. A certeza de vitória do espanhol era tão grande que as raras casas de Londres que aceitaram apostas no número 93 da Honda praticamente devolveram o valor. Talvez o espetáculo mais impressionante desta etapa do mundial tenha ocorrido no sábado, durante as tomadas de tempo. Após ter conseguido a pole provisória, Marques caiu ao tentar melhorar o seu tempo. Ao perder o equilíbrio em uma curva de baixa velocidade, a moto chegou a girar 180 graus com o piloto apoiando o joelho na pista e tentando readquirir o controle até as forças da física clássica prevalecerem. Márquez pegou uma carona até o box, montou na segunda moto e voltou para a pista, para confirmar que ninguém era mais veloz que ele na pista. Houve ainda um pequeno percalço, ao tentar evitar uma esperteza de Andrea Iannone, que queria repetir a estratégia utilizada na FP2 e ficar na sua esteira para melhorar seu tempo, Márquez acabou prejudicando uma volta rápida de Vinales, foi penalizado com três posições no grid. O efeito da punição foi zero, depois da largada e antes de dois terços da primeira volta serem completados ele já liderava.

Embora a temporada esteja apenas no início, só três das dezenove etapas foram realizadas, a disputa do mundial apresenta um tipo de “déjà vu” de 2017, com Márquez e Dovizioso batalhando pela liderança do mundial. A MotoGP entra agora na temporada europeia, onde nada é parecido com a pista de Austin, o piso é diferente, as pistas são mais estreitas, menores. Todos os equipamentos devem ser reconfigurados. A etapa dos EUA de certa forma apresentou um resultado que confirma o acerto da Dorna em busca da competitividade, três fabricantes diferentes nas primeiras posições, Honda, Yamaha e Suzuki.

A prova foi boa para Maverick Vinales que, embora ainda não consiga acompanhar a Honda, está readquirindo a confiança em sua Yamaha. Andrea Iannone voltou ao pódio e conseguiu um grande resultado para a Suzuki. Queda de Cal Crutchlow não chega a ser uma novidade e a liderança do britânico no mundial durou apenas duas semanas. Valentino Rossi tinha a esperança de estar entre os três primeiros, quase conseguiu (foi o quarto). Finalmente as duas Yamaha de fábrica conseguiram uma classificação melhor que o modelo 2016 de Johann Zarco.

Andrea Dovizioso estava vivendo um fim de semana catastrófico, obtendo apenas a oitava posição no grid de largada. Para a prova, o vice de 2017 optou pela carenagem aerodinâmica, que o ajudou a reduzir o wheelie, foi beneficiado pela queda de Crutchlow e utilizou a potência da GP18 para ultrapassar Johann Zarco a três voltas do final. Terminar em quinto a 13 segundos do vencedor não foi um resultado brilhante, mas suficiente para liderar o mundial.

O décimo lugar de Espargaró com uma Aprilia RS-GP colocou cinco fabricantes entre os top ten, um sinal consistente que a fábrica está no bom caminho. A equipe ficou em Austin para uma seção de testes na segunda-feira.

Tito Rabat com a Ducati da equipe Avintia terminou em oitavo, à frente de Miller, Espargaró e de um entristecido Jorge Lorenzo. O espanhol reclamou muito do pneu traseiro e ainda acredita que possa ter bons resultados na equipe, mas o tempo está correndo. Existe a certeza que, para renovar com a fábrica, vai ter de aceitar uma redução sensível de salários e já existem boatos que estaria em negociações com a Suzuki.

Um dos protagonistas da prova foi Dani Pedrosa, uma semana depois de uma cirurgia para corrigir o pulso fraturado. Uma lesão deste tipo normalmente exige cinco a seis semanas para a recuperação. Entupido de analgésicos o pequeno espanhol foi para o sacrifício, em uma pista que demanda muita força física. Nas condições em que foi obtida, a sétima colocação foi um resultado excelente.

Na Moto2 um piloto também se candidatou a herói do dia. Joan Mir atrapalhou-se na primeira curva e viu seu quinto lugar no grid transformar-se em vigésimo no fim da primeira volta. Dezoito voltas mais tarde, coroando uma condução impecável, recebeu a bandeira quadriculada em quarto lugar, um enorme feito para um piloto novato na categoria.

Carlos Alberto Goldani
Porto Alegre – RS

Quer ver todos os textos de colaboradores? Clique AQUI

Os artigos publicados de colaboradores não traduzem a opinião do Autoracing. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate sobre automobilismo e abrir um espaço para os fãs de esportes a motor compartilharem seus textos com milhares de outros fãs.

AS - www.autoracing.com.br

Tags
, , ,

ATENÇÃO: Comentários com textos ininteligíveis ou que faltem com respeito ao usuário não serão aprovados pelo moderador.