Louis Chiron

sexta-feira, 1 de outubro de 2021 às 13:36

Louis Chiron vence Mônaco

Colaboração: Antonio Carlos Mello Cesar

O ano 1914… Mão Negra uma facção sérvia ultranacionalista, radical, desencadeia operação armada, na base do terrorismo, visando unir territórios sérvios. Meio ao conflito um atentado executou Francisco Ferdinando arquiduque herdeiro do trono austríaco e a esposa Sofia. Eclodiu, por consequência, a primeira guerra mundial.

Ainda púbere Louis Chiron, filho de um funcionário do Hotel Paris em Mônaco, deixou a modesta vivenda familiar, onde ajudava o avô dirigindo um caminhãozinho de entregas, para alistar-se no regimento de infantaria francês. Aventura perigosa, afinal, milhões de pessoas perderam a vida nos quatro anos seguintes.

Sua destreza conduzindo veículos militares acabou por livra-lo das sangrentas batalhas nas trincheiras, foco principal de mortes durante confrontos. O adolescente corajoso foi requisitado pelo Marechal Foch, comandante chefe das forças ocidentais, como motorista, posição ocupada até 1918, final da guerra.

Doze meses passaram após Aliados e Alemanha assinarem armistício, e o Principado de Mônaco nutrido pela elite cosmopolita retorquia seu esplendor. Naquela noite uma hospedagem palaciana construída no século XIX, convidava frequentadores habituais a mais uma festa glamorosa, dança e muito champanhe. Em tal ocasião, rapazes com boa estampa eram contratados na função de partners, caso senhoras pretendessem companhia ou dançar.

Aos vinte anos amadurecido pela guerra Louis Chiron se sobressaia entre os partners. Bem aprumado, excelente bailarino, querido das mulheres angariava notória predileção, generosas gorjetas pela dança e sabe-se lá por quais outros serviços. Tudo com aristocrática discrição.

Damas altruístas lhe financiaram as primeiras corridas, provas secundárias, categoria menor, sem tanta importância. Porém seu nome pipocava aqui, ali, vitória pós-vitória rederam aproximação com Ettore Bugatti, cuja indústria sediada na pequena Molsheim, comuna francesa do Baixo Reno, estivera sob domínio alemão durante o prélio. Restituída à França em 1919, do lugar, ainda hoje, saem os Hypercars mais caros e velozes do mundo.

Ettore sugeriu ao Louis comprar um de seus potentes automóveis para Grand-Prix, em troca forneceria suporte técnico. Admirável deferência a um jovem monegasco ainda sem justa fama, mas o rapaz não possuía um tostão furado, como pagar por um carro tão valioso e dinheiro para viagens, hospedagem, dois mecânicos, transporte, pneus, taxa de inscrição nos GPs. Sonho impossível.

Alice Hoffman “Baby” Trobeck, precedendo o marido, chegou ao Principado carregando a sorte e destino de Louis Chiron. Uma norte-americana nascida em Connecticut, morando na Suíça desde criança, esposa do milionário suíço Albert Hoffman herdeiro de um império farmacêutico, o grupo La Roche.

Sem muito embaraço Alice permitiu a sedução do piloto e requintado gigolô, com largo empenho convenceu o marido montar uma equipe de Grand-Prix. Naturalmente ela haveria de ser cronometrista acompanhando a equipe, Louis Chiron piloto, um Bugatti, mecânicos, garagem etc., projeto financiado através dos francos suíços e dólares de Albert Hoffman.

O monegasco exorbitava talento e coragem, característica necessária quando literalmente se desafiava a morte nas corridas. Bugatti apoiou, um fabricante de velas de ignição, Nerka, resolveu divulgar seu produto na independente, mas bem estruturada equipe e Louis começou vencer em 1926. Primeiro lugar no GP de Comminges, antiga Gasconha, ano seguinte, 1927, pista de Miramas, Marseille, declarado vencedor num concurso interrompido com apenas cinco voltas.

Louis Chiron 1928 Bugatti Type35

Personagens prosaicos, marido rico, moça bonita, amante calculista, trama insustentável. Albert Hoffman finalmente descobre a perfídia de todos conhecida, abandona Baby, vende o carro, desfaz a escuderia. Louis continua com Alice, agora, desprovida da fortuna.

Estação 1928 Chiron torna-se piloto oficial da Automobile Ettore Bugatti, ira dirigir o novo modelo Type 35 na cor azul representando a França. Rodas de alumínio uma inovação e tanto, 2.3 litros, 750 kg, compressor tipo Roots, motor habilitado até 6000 giros, velocidade 220 km/hora.

11 de Março… Tazio Nuvolari afamado piloto conquista na Síria o GP de Trípoli. Mesmo dia, a 2000 km de distância, Louis correndo nos Alpes da Côte d’Azur, vence no circuito de Saint-Raphael. Temporada que segue, o italiano triunfa na Alessandria e Pozzo, Chiron dispara: Vitórias em Cannes, Antibes, Roma, Marne e San Sebastian.

Mês de Setembro, autódromo de Monza, a terminante sagração, sexto GP da Europa validando pontos para o campeonato europeu. Prêmios milionários, grandes nomes inscritos, uma multidão entusiasmada, terra onde máquinas (Alfa Romeo, Maserati) e pilotos italianos são verdadeiros deuses.

10 horas 20 minutos: carros empurrados para o grid, 10h 30min largada. De início Chiron perde terreno, aos poucos ultrapassa Giulio Foresti, Nuvolari e Arcangeli, no segundo lugar persegue o Alfa Romeo de Varzi. Giro dezessete, Materassi deixa seu Talbot 1500 escapar a mais de 200 km/hora, rompe numa área gramada, derruba cerca divisória pista e público, o carro decola, vence um fosso de segurança com quatro metros de largura, investindo contra pessoas e arquibancada. Uma tragédia, 27 mortos, segunda maior catástrofe na história do automobilismo.

Polícia, bombeiros rapidamente cercam o local e a corrida continua sem interrupção. Louis Chiron na volta vinte supera Varzi e lidera até o final, impondo sentida derrota para Alfa Romeo, além de subjugar a trinca de notáveis italianos Achille Varzi, Giuseppe Campari e Tazio Nuvolari, respectivamente segundo, terceiro e quarto colocados.

A vitória no GP Mônaco 1931 lhe rendeu taça em ouro maciço, 100.000 francos e uma estátua nas ruas do Principado, conquistou três vezes o GP Espanhol, cinco vezes o GP da França, três anos consecutivos, 1931/32/33, triunfador na Checoslováquia. Venceu às 24 horas de SPA e numa solitária participação nas 500 Milhas de Indianápolis, 1929, pilotando um Delage terminou em sétimo, mesma volta do líder.

Acredita-se que suas vitórias vão além das trinta, número superior a maioria dos campeões mundiais FIA. Quanto a Alice Trobeck deixou Chiron para casar com o astro da Mercedes Rudolf Caracciola em 1937.

Antonio Carlos Mello Cesar
São Paulo – SP

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