F1 – EXCLUSIVO Dude: Temos tempo e gente capaz. Vamos ver…

segunda-feira, 9 de agosto de 2021 às 2:06

Mercedes

Por: Adauto Silva – Como prometido pelo meu contato na equipe Mercedes de Fórmula 1, que chamo de “Dude” e está fazendo mais de 15 anos que nos conhecemos, consegui bater um papinho rápido com ele de férias de 10 dias com sua família em alguma linda cidadezinha litorânea no sul da Europa…

Metade da conversa foi na semana passada e metade foi ontem, domingo.

Eu: Quanto tempo, meu amigo Dude!
Dude: Você sempre diz isso, mas nos falamos com mais regularidade do que falo com a grande maioria dos meus amigos!
Eu: É que quero dizer esses papinhos que posso publicar para a nossa irmandade aqui no site!
Dude: Nem assim concordo! Você mesmo diz que publica e agora até fala nos vídeos o que falamos rapidamente!
Eu: Kkkkkkkkk… é diferente !! O pessoal gosta mesmo é dessas conversas publicadas do jeito que você sabe!
Dude: Então vamos lá, Adawtow”
Eu: Que reviravolta nessas duas últimas corridas, heim !!
Dude: Sim, foi, mas também demos sorte. Os acidentes os impediram de marcar muitos pontos…
Eu: Mas vocês melhoraram também!
Dude: Claro que sim, mas estaríamos atrás ainda na pontuação, caso não fossem as circunstâncias que nos ajudaram.
Eu: Onde vocês melhoraram?
Dude: Ahh Adawtow, foram muito detalhes, muitos!
Eu: Os principais?
Dude: Podemos dizer que foi um tripé em entender melhor os pneus novos, que nos fez melhorar muito o acerto de suspensão. O pacote aero que mudamos para a Hungria depois que vimos as dificuldades dele em Mônaco e Baku e mapeamento diferente da UP que melhorou em Silverstone, mas que realmente funcionou mesmo na Hungria!
Eu: Acharam mais potência?
Dude: Não, zero. Já estávamos com toda a potência disponível desde Portugal.
Eu: O Marko disse que vocês desbloquearam mais potência agora!
Dude: O pirata tem uma boca muito grande e não entende nada tecnicamente. Ele está lá para fazer showzinho para a mídia e para a família Verstappen. Nós “desbloqueamos” mais potência alterando a refrigeração de alguns componentes da UP e outros detalhes lá atrás quando conversamos sobre isso. Você até publicou!
Eu: Publiquei e falei isso em dois ou três vídeos!
Dude: Então…
Eu: Mas em Silverstone pareceu que a UP melhorou muito !!
Dude: E melhorou mesmo, mas foi onde e como a potência foi entregue, não um aumento dela!
Eu: Não foi o mesmo mapeamento para Silverstone e Hungria, certo?
Dude: Claro que não! Não teria cabimento! O pessoal de Brixworth (fábrica de motores de F1 da Mercedes) já estava trabalhando em novos mapeamentos desde antes de Paul Ricard, quando sabíamos que a Honda desbloquearia mais potência na atualização deles. Então, agora temos novos mapeamentos diferentes dos originais programados para cada pista desde Silverstone.
Eu: Mas é um mapeamento que não altera a potência, só muda a foram de entrega-la…
Dude: Exatamente isso! Não tem como aumentarmos a potência bruta de algum dos componentes nessa UP porque já estávamos usando tudo deles desde Portimão.
Eu: Explica algum detalhe do que vocês fizeram, por favor!
Dude: Nossa potência, como sempre, é bastante linear, mas vimos que o nosso maior problema era nas saídas de curva. O Honda estava estilingando na nossa frente nas baixas e médias rotações. O que o pessoal de Brixworth conseguiu fazer foi alterar tanto a entrega do motor de combustão interna até o limite de 100 kg/hora quanto o despejo da potência elétrica nessas rotações.
Eu: Traduzindo, a potência vem mais rápido logo que o piloto começa a acelerar.
Dude: Isso mesmo. Fica igual a aquele gráfico que te mandei.
Eu: É, eu expliquei isso no último Podcast. Mas isso não piora a dirigibilidade do carro nas largadas e saída de curva?
Dude: Bem observado, meu caro amigo! Mas é para isso que temos dois excelentes pilotos, um deles o melhor que existe!
Eu: Kkkkkkkkkkkk… eles que se virem !!
Dude: Sim, essa é a parte deles. Lembra que “o homem” foi para o simulador na manhã de sábado de Silverstone?
Eu: Foi por isso ?????
Dude: Claro que sim! E viu como, quando e onde teria que atacar o Max para ter alguma chance! Tinha que ser na primeira volta, porque mesmo com esse mapeamento, os Touros eram mais rápidos de curva, então na hora que aquecesse os pneus ele não alcançaria mais o Max.
Eu: Mas o Max no domingo já tinha percebido isso, pois na corrida curta de classificação, o Hamilton atacou na primeira volta !!
Dude: Mas quem te disse que algum piloto do grid consegue ser rápido com pneus frios como o homem?
Eu: O Max é rápido !!
Dude: Não tanto como o homem, ainda mais com pneus frios e / ou pista molhada.
Eu: Essa com pneus frios eu não tinha me tocado…
Dude: Mas não nos enganemos, Max é muito rápido, a diferença entre eles é minúscula. O que o homem tem muito mais é mais experiência e leitura de campeonato.
Eu: Isso será bastante para ganhar o título?
Dude: Isso deve fazer alguma diferença como já fez e você já viu tanto em Silverstone na briga roda a roda entre eles, quanto na Hungria contra o Alonso, mas acho que o título será decidido mais pelo carro corrida a corrida, mais ou menos como foi entre nós (o Dude trabalhava na McLaren naquela época) e a Ferrari em 2007 e 2008, apesar que os Vermelhos tinham uma pequena vantagem naqueles dois anos.
Eu: E hoje?
Dude: Eles mantém uma pequena vantagem, em algumas pistas talvez uma grande vantagem, mas isso não é definitivo, já que estamos revisando os pacotes que estavam programados.
Eu: Vou chutar duas pistas nas quais eu acho que os Touros hoje teriam grande vantagem…
Dude: Manda…
Eu: México e São Paulo
Dude: Grande memória, Adawtow!
Eu: Não esqueço aquele gráfico de altitude que você me mostrou há uns dois anos atrás (aqui). Continua igual?
Dude: Na verdade piorou, nós perdemos mais downforce com as regras desse ano do que eles (Red Bull) e o carro ficou muito diferente do que era…
Eu: Isso explica o aparente aumento de diferença entre o homem e o Bottas?
Dude: Aparente não! Aumentou mesmo.
Eu: Os Touros sofrem desse mesmo problema entre o Max e o Checo…
Dude: O problema deles é maior, volta lançada nunca foi necessariamente uma grande qualidade do Checo. A qualidade dele é a consistência, o entendimento dos pneus, mas nem isso ele está conseguindo fazer muito com os pneus desse ano. Reparou?
Eu: Reparei, mas não imaginava que os pneus novos fossem o problema.
Dude: O que você pensou que fosse?
Eu: O carro da Red Bull ser mais difícil de guiar no limite…
Dude: Ah, isso já virou lenda, Adawtow. Todos os carros têm comportamento muito parecido até, vamos dizer, meio-segundo do tempo ideal. Depois disso, todos eles têm características diferentes para se extrair o máximo. Um carro quase impossível de guiar no limite simplesmente não é um bom carro. Se me falassem isso da Haas ou Williams seria até possível acreditar, mas num carro excelente como o dos Touros, isso é lenda que a equipe gosta de enfatizar para alimentar o ego de alguns, se você me entende…
Eu: Então essa história é papo furado?
Dude: A maior parte dela sim. Um piloto realmente rápido já estaria andando ali muito perto do Max, assim como o finn faz aqui com o homem. Na frente provavelmente não, porque o Max é realmente ultrarrápido, mas perto com certeza…
Eu: Isso explicaria o caso do Ricciardo também?
Dude: Ali a diferença é menor, mas de fato o Dany boy está apanhando mais do que devia do carro. Provavelmente é um carro com aquelas caraterísticas que estávamos falando muito diferentes das da Renault, que ele guiou nos anos passados.
Eu: Ele ainda pega a mão esse ano?
Dude: Não sei, acho que sim, mas ele tem que se apressar…
Eu: Você sempre me falou que o Norris só precisava de um tempinho para mostrar o quão bom ele é…
Dude: É, mas você só começou a levar fé nele, sei lá, no meio do ano passado…
Eu: Mas foi quando ele começou a mostrar realmente o que tinha !!
Dude: Isso é verdade, você não tem as ferramentas para ver o que nós vemos de todos os pilotos.
Eu: Vamos falar um pouco dos outros pilotos?
Dude: Prefiro não, Adawtow, não me leve a mal!
Eu: Claro Dude, entendo perfeitamente! Me diz uma coisa, como é o relacionamento entre o homem e o Max?
Dude: Que relacionamento?
Eu: Tipo “amigos”…
Dude: Eles nunca tiveram um relacionamento que não fosse estritamente profissional. Por que justo você está me perguntando isso?
Eu: Porque o pirata disse outro dia que eles “não são mais amigos”
Dude: Ahhhhh Adawtow, que piada! Eles nunca foram amigos. Muito difícil qualquer piloto ser amigo de outro, porque na verdade eles são adversários antes de tudo!
Eu: Mas tem exceções, né…
Dude: Carlos e Lando? Acho que é a única exceção, no momento…
Eu: Voltando ao carro, o Toto disse que vocês encontraram mais aderência.
Dude: É verdade, ainda estamos encontrando. É um trabalho de formiga. Você começa mexendo na asa dianteira, aletas, angulação e com isso vai mexendo em detalhes do resto do carro buscando mais downforce que não gere a mesma quantidade de arrasto. Mas mesmo assim sempre gera algum arrasto que acaba prejudicando nas retas, daí a ideia de revisar os mapeamentos. É muito fácil encher o carro de downforce, ficar ótimo em curvas, mas totalmente sem reta, por isso é sempre uma tarefa difícil, minuciosa, uma vez que esse equilíbrio é muito sensível.
Eu: Quem faz esse trabalho, Dude?
Dude: Começa pela montanha de dados que recolhemos num final de semana de GP, não só nosso, como do adversário. Então os engenheiros de pista fazem uma primeira análise junto com os pilotos para verem se o que os dados dizem estão ou não de acordo com as sensações que os nossos pilotos sentem na pista. Uma vez que chegamos num denominador comum, vários outros setores são envolvidos para saber quais soluções somos capazes de encontrar para tentar melhorar os pontos mais fracos e intensificar os mais fortes.
Eu: Sempre dá certo?
Dude: Não, nem sempre. Muitas vezes melhorar um ponto fraco significa sacrificar um pouco algum ponto forte. Então, depois de muita discussão e debates, são feitas inúmeras simulações das sugestões apresentadas. Às vezes nenhuma dá certo, então começa tudo de novo.
Eu: E isso parece ser um processo demorado…
Dude: Depende do conceito de tempo que você tem. Há pessoas mais ansiosas que outras, mas no geral esse é o método que consideramos o melhor. Como isso tudo é feito para tentar ganhar décimos de segundo, imagine a precisão com que todas as áreas envolvidas precisam trabalhar.
Eu: Acontece de por exemplo, depois de tudo isso feito, o simulador dos pilotos mostrar outro resultado?
Dude: Claro que sim! Primeiro colocamos para o sistema simular, depois o piloto de simulador e só depois vai um piloto titular, no nosso caso quase sempre o finn e raramente o homem.
Eu: Caramba, Dude…
Dude: É assim com todos na Fórmula 1, pelo menos nos que entram para ganhar. Ninguém achou que seria fácil quando se meteu nesse negócio. Há outros empregos ótimos em que as coisas são muito mais “suaves” do que na F1, por isso para ficar aqui precisa paixão, espírito muito forte de competição, sacrifício e etc.
Eu: Última pergunta
Dude: Manda
Eu: Spa-Francorchamps…
Dude: Belíssima pista!
(Risos gerais)
Eu: Sério, vai…
Dude: Eles são favoritos.
Eu: Ah !!
Dude: É verdade, eles estão à frente ainda, pouco mas estão. Então, se eles trabalharem tão bem quanto nós, eles se manterão à frente.
Eu: Mas eles trabalham tão bem quanto vocês?
Dude: Nos últimos 7 anos não. Esse ano até agora sim, mas ainda faltam pelo menos 11 corridas. Temos tempo e gente capaz. Vamos ver…
Eu: Super obrigado e abração!
Dude: Sempre um prazer falar com você e com seus leitores brasileiros tão gentis!

Adauto Silva
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