F1 – Bastidores de uma negociação

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021 às 11:43

Apresentação do Fitti-FD001

Colaboração: Antonio Carlos Mello Cesar

Bernard Charles Ecclestone, ex-piloto, proprietário da equipe Brabham, inglês astuto começava a vender direitos televisivos da F1, transação lucrativa, tanto voltada à categoria, quanto para seu bolso. De pronto concluiu que James Hunt ausente da temporada 1976 era um péssimo negócio, o playboy atrevido, condução arrojada, por vezes irresponsável, estava literalmente a pé com o fim da equipe Hesketh, vagas fecharam-se antes mesmo do campeonato anterior findar.

Ídolo na Grã-Bretanha, Hunt, rapaz de boa estampa, vida incorreta, cujas farras, amores, bebedeiras, uso de drogas, gerava mais notícia que qualquer outro piloto. Lorde Hesketh aristocrata excêntrico e Max Mosley, à época, sócio da March, formavam uma trinca da pá virada, companheiros nas noitadas.

Conhecidos por toda Europa, habitantes daquele mundo glamoroso de Grand Prix, perseguidos pelos periodistas, paparazzi, mexiam com imaginário das pessoas. Década onde se experimentava uma liberdade nunca antes alcançada e os tabus eram quebrados.

Para entender o brado de romântico heroísmo envolvendo pilotos nos anos setenta, basta ler reportagens propaladas nesse ciclo. Revista italiana sobre Gilles Villeneuve: “Um centurião valente disposto a lutar e morrer pela gloria de Roma, no caso a Ferrari”. Jornal paulista: “Ford e Ferrari, arrogantes deuses da velocidade, duelam em Le Mans à 320 km por hora”.

Lorde Hesketh e James Hunt

A equipe Brabham vivia tempos afortunados, contrato junto a Alfa Romeo lhe garantia motores, além das despesas pagas pela montadora italiana e cota publicitária opulenta proveniente da companhia de bebidas Martini & Rossi. Bernie Ecclestone iniciou plano visando uma equipe Brabham B, usaria carro do ano passado com motor Ford e James Hunt ao volante. Projeto vetado pela Alfa Romeo, nem toda lábia do baixinho foi capaz de convencer os italianos.

Na capital do poder, Brasília, frente à cúpula militar capitaneada pelo general Ernesto Geisel, mais convidados, imprensa e muita pompa, Wilson Fittipaldi apresenta o Fitti-FD001, pioneiro F1 brasileiro. Passado de abstração ufanista: “Brasil país do futuro”. “Terra das oportunidades”.

Volnei Atalla, líder do grupo Atalla, cujas usinas empregavam sete mil trabalhadores, presidente da COPERSUCAR, cooperativa dos refinadores de álcool e açúcar, após intensa negociação, cheia de idas e vindas, consolidou patrocínio a equipe nacional. O empresário, sem adequado traquejo sobre caminhos variantes que conduzem às vitórias na F1, raciocinava igual um dirigente de futebol, basta contratar os melhores jogadores e ganhamos jogos. Portanto, queria, de toda maneira, Emerson Fittipaldi como piloto.

Wilsinho ponderou: Campeões mundiais custam muito caro e meu irmão discute renovação com a McLaren, praticamente acordado, mesmo passo analisa proposta da Ferrari. Volnei direto, firme, sem pestanejar: “Cubra qualquer oferta, eu pago”.

A Philip Morris (Dona da marca Marlboro), no ano de 1847, não passava de uma pequena tabacaria na London’s Bond Street. Em 1902 passou atuar nos Estados Unidos e num momento posterior, foi comprada pelos acionistas americanos, a sede principal migrou para o Estado da Virginia. Devido tradição e história a companhia tributava ao mercado inglês atenção especial e tinha na F1 excelente vitrine de exposição.

John Hogan diretor executivo da Philip Morris no Reino Unido mantinha Teddy Mayer e sua equipe, McLaren, em alto padrão orçamentário, os carros pintados de vermelho e branco, retratavam as cores dos cigarros Marlboro. Forte boato dava conta de Jacky Ickx no lugar de Fittipaldi, contrário a ideia, Hogan considerava o piloto belga, demitido pela Lotus, em franca decadência.

Nascido na Austrália John Hogan foi estudar na Inglaterra, apaixonado por automobilismo participou de algumas corridas no circuito de Aintree. Final dos anos sessenta, envolvido com publicidade, concedeu pequeno apoio, através da Coca-Cola, para James Hunt na F3 e desde então tornaram-se amigos.

USD 250.000, valor anual oferecido pela McLaren para Emerson, a COPERSUCAR fechou acordo pagando USD 1.000.000, verdadeira fortuna na época. Assim podemos intuir que o sonho, o sacrifício de uma carreira pela patriótica ideia da equipe brasileira, veio nas barbas de um belo incentivo financeiro.

“Ele se vendeu por um saco de ouro”, justificava Teddy Mayer, em reunião com John Hogan e prosseguiu visivelmente irritado: Quem poderia imaginar Fittipaldi abdicando das vitorias, do terceiro mundial e abraçar uma estupidez como essa. Existe claustro de renovação no contrato anterior, meus advogados estão estudando, vamos aos tribunais.”

Quando ouviu o nome de James Hunt, Teddy esbravejou: “O que vamos fazer? Mantê-lo acorrentado, soltar no dia da corrida e ele sai pela pista mordendo todo mundo”. Enfático defendeu Jacky Ickx: Têm vitórias, poles, bastante experiência, a Lotus passa por dificuldades, concentraram esforços somente em Ronnie Peterson. Ickx para nós será de grande valia no acerto e desenvolvimento do carro e pode, porque não, vencer, até ser campeão.”

O cowboy da Marlboro cavalgando entre montanhas, nas áridas planícies texanas, corajoso e másculo, símbolo de bem elaborada campanha publicitária norte americana, encontrava em James Hunt sua versão europeia, viva, real, dirigindo carros a 300 km por hora, boa pinta, cercado por belas mulheres, irreverente, audaz, e melhor fumava um cigarro, atrás do outro.

Além da crença no talento do velho amigo, Hogan não iria perder oportunidade de vincular Marlboro a James Hunt. Sabendo que jamais se discute com quem paga as contas, impôs sua vontade, Teddy Mayer capitulou, James foi contratado pela McLaren recebendo USD 50.000 anuais e ganhou o Campeonato Mundial de Pilotos daquele ano, 1976.

John Hogan

“James Hunt abandonou a carreira em 1979, faleceu aos 45 anos de ataque cardíaco”.

“Emerson iniciou 1976 como um verdadeiro milionário, além do salário possuía valiosos contratos individuais de publicidade, saiu da F1 devendo USD 7.000.000”.

“Lorde Hesketh exerceu durante anos o cargo de presidente do British Racing Drivers Club, e também foi diretor independente da Air Astana, companhia aérea nacional do Cazaquistão”.

“Max Mosley atuou como consultor jurídico da FIA, sendo um dos idealizadores do pacto de Concórdia, elegeu-se em 1993 presidente da FIA. No ano de 2008 um tabloide inglês publicou vídeo onde Max, então com 68 anos, vestido a caráter, protagonizava orgia sadomasoquista com diversas prostitutas, perdeu o cargo”.

“John Hogan faleceu dia 03/01/2021 de Covid-19”.

Antonio Carlos Mello Cesar
São Paulo – SP

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