F1 – 1974: Faces de um grande prêmio
sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020 às 13:07Colaboração: Antonio Carlos Mello Cesar
24 de Janeiro 1974… À tarde ensolarada faz o asfalto brilhar, contrapondo-se ao verde da vegetação margeando o belo e seletivo traçado de Interlagos (antigo). Dia que precede abertura oficial do GP Brasil, mas sem o alarido da torcida, dos motores, resta uma vastidão de arquibancadas vazias e a imensidão multiplicada de áreas desertas.
Equipes harmonizam derradeiros arranjos subsequentes à montagem dos carros, não há muita resenha para jornalistas carentes de informações, quando alguém descobre Fernanda, uma brasileira, namorada do James Hunt. Moça bonita, cordial, relata como travou conhecimento com o afamado mulherengo: Estávamos no aeroporto de Roma aguardando voo para Paris e desde, então, procuro, na medida do possível, acompanha-lo nas corridas. Salientou, inclusive, o lado humano de James, diverso ao mundo esnobe, frio, ganancioso da F1.
Lorde Hesketh aos vinte e três anos, um digno aristocrata inglês, excêntrico, elegante, apesar de obeso, deixa-se assediar pela imprensa. Discorre sobre a estreia do novo carro em Mônaco, admite ser um piloto abaixo do medíocre, fato que o motivou a montar sua própria equipe e reafirma plena confiança no talento de James Hunt.
Sexta-Feira, 25 de Janeiro 1974… São Paulo comemora 420 anos com seis milhões de habitantes, atualmente a população dobrou. Nesse tempo, Ari Toledo e a peça: Tamanduá come formiga, elefante leva fama, causava boas gargalhadas. Sargentelli, suas mulatas, o show “Ziriguidum”, faz enorme sucesso, as rádios tocam direto Elton John, “Don`t let the sun go down on me”.
Aberta sessão de treinos, Emerson Fittipaldi perfeito, a McLaren rende melhor que o esperado, crava 2.32.97; Carlos Reutemann, Brabham, 2.34.09, segundo colocado, um décimo a frente da Ferrari de Lauda. José Carlos Pace, Surtees, enfrenta diversos problemas, treina com apenas sete cilindros funcionando, o carro superaquece, junta queimada, perde uma hora e meia nos boxes, termina o dia decepcionado.
Curva do Laranja, o nome originou-se da alcunha pejorativa dada aos pilotos, nas categorias turismo, que freavam para contorna-la. Reformas no final dos anos oitenta alteraram angulação, elevação, distância, antes disso, uma curva tomada as cegas, sem visão do seu final, onde os bravos não se permitiam o menor alivio, pé cravado e vamos embora.
Jody Scheckter, Tyrrell, dava mostras do talento arrojado que o levaria ao titulo mundial em 1979. Entra de lado no Laranja e segue controlando o carro até a saída da curva repete a manobra varias vezes, um verdadeiro espetáculo.
Sábado, 26 de Janeiro… Reutemann melhora sua volta, 2.33.21; Niki Lauda mantém a terceira posição com 2.33.77, ninguém supera o tempo auferido por Emerson na sexta-feira (valiam os tempos de sexta para o grid), fim de conversa, o brasileiro é pole.
Pace irritadíssimo com o décimo segundo lugar, 2.35.63, desabafa com jornalistas, o carro é péssimo, pula demais, escorrega sem parar, atravessa. Andei acima do limite e nada adianta, até o cabo do acelerador quebrou, estou pensando em rescindir meu contrato com a Surtees, ano passado, aqui mesmo, foi a trepidação, de tão forte, entortou peças da suspensão.
O Hilton Hotel, bairro da Consolação, próximo ao Centro, albergava grande parte do estafe da F1, região heterogenia, cercada por diversos inferninhos anunciando em colorido neon: garotas, drinks, strip tease. Casas mais luxuosas, destinadas ao mesmo fim, ganhavam status de boate, como Scarabocchio, Cave e La Licorne frequentada por pilotos, jornalistas, turma das equipes.
Domingo, 27 de Janeiro… Garotas de programa, várias, circulam pelos boxes, devidamente credenciadas, fazendo-se passar por namorada de periodistas, correspondentes estrangeiros, de gente ligada ao evento, o que reafirma um velho ditado: Meninas boas vão para o céu, meninas más vão a qualquer lugar.
O Príncipe Von Meternich apresenta ao porteiro uma carteira oficial legitimando o cargo de Presidente da FIA (Federação Internacional de Automobilismo). A segurança barra seu acesso, exige uma credencial fornecida pelos organizadores, Meternich, poliglota, em correto castelhano, define a situação, “caso eu não entre, não haverá corrida”.
Noite anterior, torcedores, em grande número nas dependências do autódromo, sem o menor pudor, fazem a pista de lixeira. Parte da curva um, reta dos boxes amanhece coberta com detritos, são latas vazias, garrafas, papel, embalagens plásticas, restos de comida.
Prestes a começar o treino de aquecimento, caminhões pipa solicitados para lavar aquela sujeira, ainda não havia chegado. Fittipaldi, Hulme, Reutemann juntam-se a Mario Patti, diretor da prova, pessoal da Goodyear procede à limpeza da pista, tem início uma sucessão de atrasos.
Cinquenta minutos além do previsto, acontece à largada, o sol está soberano, porém, lá pelos lados da represa, nuvens estranhas, um tanto quanto carregadas, principiam uma formação ameaçadora.
Na corrida, a partir da quarta volta, Peterson lidera Fittipaldi o persegue, ambos vão se isolando cada vez mais do restante. Décima sexta passagem, final do retão, 320 km/h, Arturo Merzario retardatário ocupa a linha interna para dar passagem aos líderes, a Lotus faz a tomada para curva, corretamente, na faixa externa, Emerson se coloca entre os dois, retarda freada, emerge da Três meio carro a frente de Peterson, solidifica a liderança na Ferradura.
Algumas voltas depois, o sueco é obrigado a trocar um pneu furado, Fittipaldi administra de forma segura a grande vantagem sobre os demais até a volta trinta, quando chove forte e o diretor de prova encerra a corrida. Emerson Fittipaldi vence pela segunda vez consecutiva o GP Brasil. Clay Regazzoni em segundo com Ferrari, Jack Icks, Lotus, completa o pódio.
Destaque para José Carlos Pace, disposto a superar os limites de seu carro, com apenas três voltas, havia superado quatro adversários. Em pouco tempo avança para a sexta posição, encosta no Brabham de Reutemann, ultrapassa o argentino na décima segunda volta. Giro dezenove, com a parada de Peterson, ganha o quarto lugar e numa tocada forte começa diminuir a distancia para Ickx, o terceiro.
Prova interrompida, Pace lamenta afinal sua boa reputação no molhado, lhe permitiam a esperança de vencer Icks e subir no pódio. Que grande talento tinha esse brasileiro!
Espantosa baderna definiu o evento, a começar pela distribuição de credenciais, culminando, ao término da prova, com uma descontrolada invasão, recheada de confusão, brigas, pessoas roubando adesivos das equipes, peça de carros, sem que a segurança conseguisse impedir. O grande prêmio brasileiro passou a correr sério risco de ser banido do calendário da F1.
Antonio Carlos Mello Cesar
São Paulo – SP
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