Como a saga do assoalho flexível pode afetar a F1 a partir de Spa-Francorchamps?

terça-feira, 19 de julho de 2022 às 16:00

Distância do solo antes de 2022 e em 2022

Inúmeras corridas e até temporadas inteiras na Fórmula 1 podem ser decididas por margens tão pequenas que são imperceptíveis para a maioria dos espectadores, exceto para especialistas técnicos muito experientes.

Milésimos de segundo na classificação, centímetros de tinta branca definindo os limites da pista e a degradação dos pneus aos milímetros podem fazer ou quebrar as carreiras de alguns dos pilotos mais talentosos do mundo, enquanto são essencialmente impossíveis para quem assiste em casa ou na pista para realmente discernir no momento.

Todo esporte de elite é definido por pequenas melhorias durante longos períodos de tempo, mas o nível de tecnologia na F1 significa que essas melhorias estão muitas vezes escondidas dos olhos do espectador e frequentemente objeto de intensa politicagem pública.

Agora, outra tecnologia tipicamente imperceptível e bastante rudimentar pode ser adicionada à lista de coisas imperceptíveis que fazem toda a diferença na F1: uma prancha de madeira (ou outro material com a mesma densidade especificada) no assoalho dos carros.

Como funcionam os assoalhos na F1?

A F1 passou por sua maior mudança de regulamento técnico em uma geração este ano, com o esporte retornando à aerodinâmica de efeito solo pela primeira vez desde a década de 1980. Todas as 10 equipes tiverem que redesenhar seus carros do zero, encerrando o domínio de oito anos da Mercedes como a equipe mais rápida do grid e permitindo que outras equipes, incluindo Ferrari, Alfa Romeo e Haas, subissem no pelotão.

O nome “efeito solo” foi cunhado porque a teoria aerodinâmica do projeto é usar o assoalho do carro para gerar downforce, que essencialmente suga o carro para o asfalto e permite que ele ande mais rápido pelo circuito. Todas as equipes criaram conceitos de assoalhos intrincados projetados para guiar o ar sob o carro da maneira mais eficiente.

As mudanças foram feitas para permitir que os carros se seguissem mais de perto, por sua vez, significando que os pilotos poderiam lutar entre si com mais frequência e o espetáculo geral das corridas melhorado. Até agora, apesar do grid ainda estar tão espalhado que apenas algumas equipes são capazes de disputar a vitória, o novo regulamento está surtindo o efeito desejado.

Max Verstappen e Charles Leclerc se envolveram em disputas táticas pela liderança em várias corridas, trocando de posição com maior frequência do que nas últimas temporadas da F1, enquanto a corrida mais recente na Áustria viu cinco carros diferentes lutando pelo nono lugar ao longo de uma volta inteira, disputas que teriam sido virtualmente impossíveis na iteração anterior de um carro de F1.

O que diz o regulamento?

Regulamento Técnico F1 2022
3.15.8 – Flexibilidade do Assoalho Central

A) A carroceria dentro do RV-PLANK (prancha de madeira) pode defletir não mais que 2mm nos dois furos da prancha em XF=1080 e não mais que 2mm no furo mais atrás, quando o carro, sem piloto, estiver apoiado nessas posições. O carro será apoiado em calços de 70mm de diâmetro, centrados nos furos, e apenas em contato com a parte inferior do conjunto de pranchas. O deslocamento será medido nos apoios, em relação ao plano de referência no centro de cada furo.

B) A carroceria no plano de referência não pode defletir mais de 0,2 mm quando o carro, sem piloto, estiver apoiado nos dois orifícios da prancha em XF=1080 e no furo mais traseiro da prancha. O carro será apoiado em coxins de 40mm de diâmetro, centrados nos furos, e somente em contato com a carroceria no plano de referência. Para os dois furos em XF=1080 o deslocamento será medido nos suportes, em relação aos pontos de referência da célula de sobrevivência detalhados no Artigo 3.2.6. Para o orifício mais traseiro, o deslocamento será medido no suporte, em relação à unidade de potência nos pinos de montagem da transmissão mais altos detalhados no Artigo 5.4.8.

Sobre o que é o assoalho flexível?

O retorno ao efeito solo também teve um impacto negativo. Os carros de algumas equipes estavam quicando violentamente em alta velocidade em longas retas, com o ar embaixo do carro sendo empurrado para frente e para trás com muita intensidade para o carro lidar.

Isso leva a vibrações intensas sendo enviadas para a espinha do piloto, e significa que suas cabeças podem ser vistas ricocheteando descontroladamente no cockpit. Uma infinidade de pilotos relatou graves dores nas costas causadas pelo problema, conhecido em inglês como “porpoiising”, e alguns médicos expressaram preocupações sobre possíveis danos neurológicos a longo prazo.

Todos os carros de F1 são obrigados a ter uma longa e fina prancha de madeira ao longo de seus assoalhos, o que ajuda a absorver choques. A prancha tem titânio em cada extremidade, que é o que produz as faíscas sob os carros enquanto eles raspam na pista.

A prancha de madeira pode flexionar até dois milímetros enquanto o carro está sendo conduzido, e a FIA monitora isso em três pontos diferentes ao longo da prancha. Há suspeitas, porém, de que algumas equipes tenham assoalhos capazes de flexionar até seis milímetros, e estão permitindo que isso aconteça para melhorar o desempenho de seus carros.

Essa flexão extra supostamente ocorre em pontos da prancha que não estão sendo monitorados pela FIA na parte traseira e pode ajudar a explicar por que algumas equipes sofrem muito menos com o problema do que outras. A suspeita é que essas equipes estão aproveitando o fato da FIA não monitorar a flexão na parte traseira – porque não era necessário em carros sem efeito solo – para violar a regra da flexão máxima de 2 milímetros, além de estarem indo contra o espírito e a intenção do regulamento.

Como a FIA monitora apenas a parte dianteira da prancha, algumas equipes dividiram a prancha em duas e deixam a parte dividida de trás flexionar.

O que as equipes dizem?

As principais equipes na fila são as mais bem-sucedidas e ricas recentemente: Red Bull, Ferrari e Mercedes.

Enquanto a Red Bull e a Ferrari venceram todas as corridas entre elas até agora nesta temporada, e enfrentaram poucos problemas com os quiques, a Mercedes não conseguiu lutar por vitórias; os pilotos Lewis Hamilton e George Russell estavam até recentemente muito ocupados se preocupando com os quiques extremamente intensos em seu carro W13.

Toto Wolff da Mercedes vem acusando a Red Bull e a Ferrari de permitir que seus assoalhos flexionem demais. “Acho que sim”, disse Wolff quando perguntado pela Sky Sports se algumas equipes estavam burlando as regras na Áustria. “Não conseguimos entender o assoalho de certas equipes. Estamos de olho nos nossos adversários.”

Enquanto isso, o desafeto de Wolff na Red Bull, Christian Horner, foi contundente na resposta a perguntas sobre se sua equipe estava quebrando as regras. “Isso é um lixo total”, exclamou Horner. “Absolutamente sem problemas ou preocupações com o nosso assoalho.”

Tanto a Red Bull quanto a Ferrari insistem que seus assoalhos são totalmente legais, até porque um assoalho ilegal que flexione mais que o permitido é punido com a desclassificação da corrida.

O que a FIA está fazendo sobre isso?

Vários pilotos exigiram que a FIA interviesse para proteger sua saúde e segurança após o GP do Azerbaijão deste ano, onde muitos sofreram intensas dores nas costas por causa dos quiques. Hamilton foi filmado lutando para sair de seu carro no final da corrida.

Posteriormente, a FIA emitiu uma diretiva técnica antes do GP do Canadá, projetada para limitar o quanto qualquer carro podia quicar. Mas até agora se mostrou muito difícil de implementar e o corpo diretivo vem trabalhando em uma atualização desde então.

Agora, planeja introduzir uma nova diretiva antes do GP da Bélgica no final de agosto, projetada para encerrar a flexão extra. A Mercedes apoia a diretiva, mas Red Bull e Ferrari se opõem.

“Provavelmente eu desejaria que chegasse um pouco mais cedo”, disse Wolff. “Mas é o que é. Em Spa, não veremos mais essa flexão extra.”

Horner, por sua vez, disse: “A diretriz técnica está obviamente focada no quique e no propósito com os quais certos carros têm lutado. É dever do competidor certificar-se de que seu carro está seguro? Ou é dever da FIA garantir que o competidor guie o carro com segurança?”

Como isso pode afetar o resto da temporada?

Se as suspeitas da Mercedes forem verdadeiras e a Red Bull e a Ferrari de fato permitiram que a parte de trás de seus assoalhos se flexionem além dos limites estabelecidos pela FIA, a nova diretiva técnica para a corrida em Spa-Francorchamps poderá impedi-los de fazer isso e ter um impacto negativo em seu desempenho geral, uma vez que além de melhorar os quiques, um assoalho flexível na parte de trás proporciona mais downforce, menos arrasto e ajuda no gerenciamento dos pneus.

Isso aproximaria qualquer equipe que tenha permanecido dentro do limite desde o início, mas até que ponto a diferença diminuiria não pode ser determinado até que a diretiva seja implementada.

Resta, é claro, a possibilidade de que a Red Bull e a Ferrari não estejam fazendo nada do tipo, e que suas respectivas velocidades não sejam afetadas a partir da Bélgica, o que significa que ninguém mais – além delas – provavelmente será capaz de vencer uma única corrida nesta temporada.

Quer aconteçam grandes mudanças ou o status quo permaneça, a saga do assoalho flexível está se tornando a definição da temporada para todas as equipes da F1.

Vídeo explicativo

O vídeo está em inglês, portanto faça o seguinte:
1. Clique no quadrado com uma tarja vermelha na parte inferior direita do vídeo.
2. Pause o vídeo assim que ele começar
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