2009, uma temporada insólita para a F1

terça-feira, 11 de janeiro de 2011 às 2:37

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2009, uma temporada insólita para a F1

A temporada da F1 de 2009 foi uma das mais interessantes dos últimos tempos. Aconteceu de tudo, a começar por uma equipe estreante vencer tanto o campeonato de construtores quanto o de pilotos, passando pelo caso do crashgate – onde uma pessoa foi oficialmente banida do esporte -, a ressurreição de Rubens Barrichello, o acidente de Felipe Massa, o fim da era Mosley, a demissão sumária de um piloto considerado como um dos melhores, Kimi Raikkonen e finalmente terminando com duas equipes de fábrica saindo da categoria com o rabo entre as pernas.

Tecnicamente foi uma temporada decidida na primeira metade do campeonato. Algumas equipes fizeram uma leitura, digamos, mais “adequada” das entrelinhas do regulamento e saíram com uma tremenda vantagem, principalmente a BrawnGP que, além do difusor duplo, fez um chassi muito bom e colocou um motor ótimo para empurrar tudo isso. Com dois pilotos técnicos e experientes, Rubens Barrichello e Jenson Button, seria realmente muito difícil que perdessem o campeonato, tão difícil que eu escrevi uma coluna intitulada “Jenson Button campeão” em junho, quando ainda faltavam dez corridas para o final do campeonato.

Button não é o campeão dos sonhos de muita gente, que o considera apenas mediano, mas que ganhou porque teve um carro muito melhor que os outros. Eu discordo disso, considero Button um ótimo piloto que soube tirar tudo do carro na primeira metade da temporada, mais que Rubens e mais que a dupla da Red Bull, Mark Webber e Sebastian Vettel, que também tiveram um carro excelente nas mãos durante o ano inteiro. Vettel é o novo darling da midia e de boa parte da torcida. Ele é realmente muito bom, bem acima da média, mas se fosse o fenômeno que muitos acham deveria ter dificultado mais o título de Button. Equipamento para isso ele teve!

O caso do crashgate, que já foi mais do que explorado pela midia o ano inteiro, deixou sequelas. Flavio Briatore, uma figura folclórica – para não dizer bizarra – foi o primeiro personagem a ser banido da Formula 1 que eu tenho notícia. Ninguém sentirá sua falta. Nelsinho Piquet ficou bastante queimado e perdeu toda e qualquer chance de conseguir um lugar para o ano que vem em equipes tradicionais. Talvez com muita ajuda de Bernie Ecclestone, ele consiga um lugar numa equipe estreante, o que eu duvido muito, ainda mais agora com a saída de mais uma montadora.

Quem saiu menos chamuscado do caso foi a própria Renault, que evidentemente não sabia das trapaças em andamento na sua equipe de F1, mas quando soube demitiu todo mundo e resolveu continuar pelo menos mais um ano, para tentar minimizar os efeitos maléficos de imagem que a adminstração Briatore deixou.

2009 foi o ano da ressurreição de Rubens Barrichello. Começou o ano desempregado e o acabou em terceiro lugar no campeonato e com um contrato de primeiro piloto na melhor equipe de garagistas da F1 para 2010, a Williams. Ironia das ironias, Rubens teve nesse ano sua melhor chance para se sagrar campeão da Formula 1, mas na época que o campeonato foi decidido, ou seja, em sua primeira metade, foi superado por Button.

Foi uma temporada dura para Felipe Massa, que nunca teve equipamento para brigar por vitórias e ainda sofreu um acidente absolutamente incomum em julho na Hungria que o tirou do esporte pelo resto do ano. Para completar seu calvário, a Ferrari contratou nada mais nada menos que Fernando Alonso para ser seu companheiro de equipe em 2010. Felipe não terá moleza ano que vem e terá que continuar evoluindo para não ser ofuscado pelo espanhol, que chega para apagar a frustração de Maranello com Kimi Raikkonen. Sim, Raikkonen não foi nem sombra do que a Ferrari esperava dele, apesar do título que caiu em seu colo em 2007. O finlandês não se integrou à equipe, não passava a impressão que dava tudo de si e em nenhum momento se mostrou ser um homem de equipe, que é algo que a Ferrari preza demais. Stefano Domenicali exigiu sua demissão e a contratação de Alonso.

A era Mosley chegou ao fim. No meio da temporada as equipes se uniram e finalmente conseguiram a certeza que Mosley sairia no fim do atual mandato. Max Rufus Mosley, londrino nascido em 1940, presidiu a FIA de 1993 até 2009. Formado como Barrister (uma das categorias de advogados existentes na Inglaterra) começou no automobilismo como fundador e co-proprietário da March Engineering, uma empresa de constução de carros de corrida que manteve uma equipe na F1 nas décadas de 70 e 80. Alex Dias Ribeiro foi um de seus pilotos em 1977 e chegou a escrever um livro (Mais que um vencedor – Editora Betania, 183 páginas) onde malhou Mosley de todas as maneiras. A era Mosley ficou marcada por disputas com as equipes, invenções técnicas um tanto bizarras e escândalos seguidos. A Formula 1 andou em gangorra nesses anos todos, mas pelo menos Mosley conseguiu mantê-la sempre em clara evidência. O grande trunfo de Mosley e da própria F1 a partir do final do século passado foi a internet, que bem explorada fez com que a F1 se tornasse um esporte multimilionário e popularíssimo, só perdendo para o futebol em termos globais.

O sucessor de Mosley é Jean Todt, conhecido de todos os entusiastas da F1 pelos seus anos de absoluto sucesso como chefe da Ferrari, quando venceu incontáveis campeonatos de construtores e cinco dos sete títulos de Michael Schumacher. Além de sua fama de “vencer a qualquer custo” Todt terá ainda que enfrentar uma mudança muito significativa em andamento na categoria; a debandada das montadoras. Depois da saída da Honda, BMW e agora Toyota, só restam duas gigantes na F1; Mercedes e Renault, sendo que a segunda vai depender do resultado de 2010 para continuar ou não. Isso é bom ou ruim?

Primeiro vamos falar o porque das montadoras estarem saindo da categoria. É por causa de dinheiro? A crise tem alguma coisa a ver com isso? A resposta das duas perguntas é não, quase nada. O dinheiro absoluto que uma montadora investe na F1 é muito pouco considerando seu faturamento. Esse dinheiro retorna muitas vezes mais em forma de exposição da marca. A F1 é vista por bilhões de consumidores no mundo todo, e pega principalmente as classes A, AB e B, que é exatamente o público alvo da categoria. Não existe um lugar melhor ou pior para uma montadora de automóveis expor sua marca. Como assim melhor ou pior? Lógico, o problema é “como” expor sua marca. A Formula 1 é essencialmente competição e exatamente pela mosntruosa exposição da marca, qualquer montadora que se proponha a participar desta competição, está colocando sua reputação em risco. Como você pode continuar dizendo que seu produto que está nas ruas é melhor que o do seu concorrente se você apanha dele na F1 anos seguidos? Simplesmente uma coisa não combina com a outra, a não ser que você esteja vencendo e então a mensagem que você está passando é a melhor possível, ou seja, “na categoria mais importante do automobilismo mundial eu venço todos os concorrentes”.

Por que Honda, BMW e Toyota saíram? Porque estavam passando a mensagem errada (para eles) de perdedores. Nenhuma delas estava sequer perto de vencer um campeonato há muitos anos. Por que a Mercedes fica? Porque está vencendo e por isso é a única das grandes montadoras que está passando a mensagem certa. Este ano eles não venceram com a McLaren, mas venceram com a BrawnGP e muita gente credita isso ao motor Mercedes. Lógico que não foi o motor que venceu sozinho, mas não importa, o simples fato da equipe vencedora usar o motor Mercedes já é o suficiente para passar a mensagem certa.

Se em 2010 a Renault não vencer o campeonato ou pelo menos mostrar muita força, eu aposto com quem quiser que ela sai no final do ano. E então teremos só a Mercedes disputando com a Ferrari.

Eu considero isso muito bom, ou seja, o fato da Formula 1 estar caminhando para ser uma categoria de garagistas novamente. São eles que tem corridas de automóvel como principal negócio, não as montadoras. Os garagistas precisam da F1 porque vivem dela tanto nos melhores como nos piores momentos. O melhor papel que uma montadora pode e deve exercer é fornecer motores; fabricar motores é o negócio delas, custa menos dinheiro e em alguns casos pode até dar lucro, é muito menos arriscado e a exposição de marca continua sendo monstruosa.

Até a próxima!
Adauto Silva
adauto@autoracing.com.br

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