20 minutos com Robert Kubica

quinta-feira, 18 de novembro de 2010 às 14:09

Robert Kubica

Ele não tem nenhum desejo de ser o centro das atenções ou ter a vida de celebridade da F1 moderna … Robert Kubica só quer vencer. A F1 Racing conversa com um piloto tranqüilo e determinado que está na melhor forma de sua vida.

Vinte minutos. Não é uma quantidade enorme de tempo no grande esquema das coisas, mas é uma eternidade em um esporte onde a glória ou o fracasso dependem de décimos de segundo. Também acontece de ser a quantidade de tempo que a F1 Racing poderá sentar-se com Robert Kubica nos confins do paddock chinês. Como Kubica fica conversando com um jornalista polonês particularmente persistente, ele está de bom humor – e não é surpreendente: duas horas atrás, ele colocou seu carro em oitavo no grid para a corrida de domingo em Xangai, que iria terminar em quinto. Nem mesmo nuvens de cinzas vulcânicas e o caos da aviação européia poderiam tirar o sorriso do rosto satisfeito.

Como o jornalista polonês recebe um sinal da Renault que ele tem uma última pergunta, pensamentos intrigantes se voltam para Kubica. Ele é geralmente afável e divertido, mantendo sua implacável agressividade na pista, o que levou à sua descrição como um “um piloto de verdade” por muitos na F1.

E Robert Kubica deve ser a única pessoa do esporte que não tem inimigos. O infame “Piranha Club” está mergulhado em hostilidades latentes para onde você olhar; desde a animosidade histórica entre a Ferrari e a McLaren até a antipatia mútua entre Lewis e Fernando. Mas isso é um subproduto inevitável da necessidade de ser o número um em um esporte ultra-competitivo. No entanto, temos aqui um humilde polonês, admirado igualmente por Bernie, equipes e pilotos, que quer ser o melhor, mas com a humildade de não vangloriar-se para ninguém que coloque um microfone na sua boca.

“Chipper” é a palavra principal que você usaria para descrever hoje Robert Kubica. “Relaxado”, “atento” e “bem-humorado” também seria adequado. É fácil entender o porquê.

“Se alguém tivesse me dito antes do início da temporada que eu teria 30 pontos após as três primeiras corridas, eu não teria acreditado”, diz Robert, sem saber que terá 40 pontos em quatro corridas a esta hora amanhã – algo ainda mais impressionante, dado que ele não conseguiu marcar nenhum ponto na abertura da temporada, no Bahrain.

Então, a quem cabe este início fantástico de temporada?

“Cabe a todos – A Fórmula 1 é um esporte de equipe e muito do que conseguimos foi devido a pitstops fantásticos que fizemos, por exemplo”, diz ele, exibindo um carinho pela equipe que na F1 moderna se tornou um lugar comum. Com Kubica, no entanto, esse carinho parece completamente crível. “É claro que o piloto tem algum mérito, assim como para trazer o carro para casa”, acrescenta ele, “então eu acho que tive boas corridas até agora. Tudo tem que ser a 100 por cento.”


Saindo para a classificação

Ele não é o tipo de se gabar, mas fale com qualquer pessoa da Renault e eles vão te dizer como o trabalho de Kubica é incrivelmente ético e como ele está entre os últimos a deixar o circuito em um fim de semana de corrida, tendo passado por todos os dados possíveis de telemetria para arrancar o melhor do R30 da Renault. O próprio Kubica, no entanto, despreza essa história de ser o piloto que mais trabalha na F1, dá de ombros e diz: “nada demais, isso é algo que todos devem fazer.”

“A maioria das pessoas sempre pensa que um piloto apenas guia o carro”, ele explica. “Eu apenas tento obter tanta informação quanto eu puder, e as coisas podem melhorar muito analisando todos os dados com os engenheiros. Claro que há um limite para o quão mais rápido você pode fazer um carro andar, mas nós todos estamos muito motivados. Talvez se eu tivesse o melhor carro, eu deixaria a pista uma hora após a corrida, mas se há muito para melhorar, então todos temos que trabalhar duro. Todo mundo tem que dar o máximo.”

A mensagem é muito clara, mas é apresentada com honestidade e personalidade suficiente para deixá-lo numa posição inequívoca que este é um piloto com o qual os mecânicos trabalharão com muito prazer até tarde da noite.

A personalidade de Kubica é tão discreta, que ele mesmo se recusa a reconhecer que ele é o piloto número 1 da Renault [“Bem, eu realmente não acho que eu seja o número um – obviamente eu tenho mais experiência do que Vitaly, e talvez no início da temporada a equipe tenha levado meus comentários mais em consideração, mas isso é normal”], mas ele é o único que não acha que ele é o numero 1. É a primeira vez na carreira de Kubica que ele é o líder da equipe, papel que desempenha muito bem.

Mas, por estar na equipe que era de Fernando Alonso, as comparações já começaram. Será que ele sente a pressão para emular o homem que ganhou dois títulos mundiais com a Renault em 2005 e 2006? Robert faz uma pausa. “Eu não sei … Eu não penso assim. Quero dizer, eu não sou Fernando, já que não ganhei o campeonato do mundo duas vezes. Eu estou apenas tentando fazer o meu trabalho. Você tem que perguntar à equipe se eles querem um segundo Fernando ou alguém. Eu acho que Fernando fez um trabalho muito bom aqui no passado, mas eu sou um piloto e uma pessoa completamente diferente, e é isso.”

Robert afirma que ele não pediu o conselho de seu bom amigo Fernando antes de entrar na Renault: “Nós realmente não falamos sobre isso. Para ser honesto, nós não falamos sobre Fórmula 1.”

Mas é claro que colocar sua marca na equipe é importante. E é óbvio que ele vai conseguir isso. “Todos os pilotos querem ter um carro vencedor em suas mãos, mas para obtê-lo você tem que trabalhar”, afirma com naturalidade. “Eu acho que se você trabalhar duro com a equipe para melhorar o carro e, finalmente entrar na posição de poder para vencer as corridas, isto me daria mais satisfação do que já entrar numa equipe com um carro vencedor. Às vezes, terminar em quarto dá mais satisfação do que vencer.”


Robert Kubica e seu engenheiro

Sete minutos depois, é engraçado que o nome de Fernando Alonso tenha surgido. Parece que a sombra dele, sem querer, está sobre a carreira de Kubica no presente, com Robert não só tomando o lugar de Fernando na Renault, mas, se você acredita nos boatos da F1, fortemente ligando-o à Ferrari na próxima temporada. Kubica sai fora do assunto Ferrari com o famoso: “Estou muito feliz na Renault”. Mas ele é inteligente o bastante para saber que estar ligado à equipe de maior sucesso na Fórmula 1 não é a pior coisa que poderia lhe acontecer.

“Bem, é melhor ter especulações sobre equipes querendo você do que equipes não querendo você,” ele ri. “Então, este tipo de boato é mais positivo do que negativo, mas temos que ser realistas. São apenas rumores, e foram no ano passado também. É normal na F1, mas não há nada por trás deles.”

Mas, deve ser extremamente lisonjeiro ter seu nome sussurrado na mesma frase com a maior equipe da história da F1, mesmo para alguém aparentemente tão desprovido de ego, em comparação com muitos dos seus pares. “Para ser honesto, eu realmente não presto muita atenção nisso. Eu não penso sobre isso – há muito a fazer, e quando começa a temporada você está apenas tentando se concentrar na direção certa e nada mais existe. E quando estou em casa procuro relaxar e não pensar sobre Fórmula 1.”

Uma coisa é ser disciplinado e motivado quando você está em uma nova equipe e as coisas estão indo bem, mas é outra quando você está lutando na parte de trás do grid – e após o heroísmo de disputar o título em 2008, esta foi a situação pouco provável em que Kubica se viu no ano passado com a BMW. Como um piloto consegue permanecer motivado para lutar por posições na pista com os mesmos carros que o deixavam passar automaticamente na temporada anterior?

“É engraçado, de alguma forma a sua motivação pode ser maior”, diz Robert, “porque você realmente quer melhorar o carro muito mais. Mesmo no ano passado com um carro não muito competitivo, ainda fizemos um bom trabalho e melhoramos bastante no final da temporada. É a prova que você nunca deve desistir. Eu sempre acho que o primeiro dia que eu parar de tentar assim, eu devo sair da Fórmula 1.”

Com tanto comprometimento assim, ele pode ver-se dirigindo em seus 40 anos como Michael Schumacher? “Eu acho que não. As coisas podem mudar – quer dizer, eu já tenho uma abordagem um pouco diferente da do ano passado -, mas o dia que eu parar de apreciar vou parar. No final, a F1 é legal, mas dá bastante trabalho.”

É um fato freqüentemente citado pelos pilotos da F1 moderna que guiar o carro é realmente a menor parte do trabalho. Kubica cresceu na Polônia e se mudou para a Itália no início da adolescência para perseguir seus sonhos de competir. É interessante saber se o trabalho de ser um piloto de F1, com sua esteira incessante de entrevistas, aparições de patrocínio e coletivas de imprensa, é o que Robert imaginava quando era mais jovem.

“Quando eu era pequeno, eu não pensava sobre F1”, ele ri. “Eu nunca acreditei que eu iria entrar na F1, portanto isso nunca foi meu objetivo. Estava fora de alcance. Talvez seja porque eu sou sempre muito negativo e pessimista a respeito de tudo, tenho o tipo de abordagem que eu acho que é melhor não criar expectativas, e se algo bom acontece é uma surpresa agradável. Se você tem grandes expectativas e isso não acontece, você tem apenas decepção. Mas a Fórmula 1 me ensinou muito. Não se trata apenas de guiar o mais rápido que você puder – trata-se de trabalhar com uma equipe. Quando eu penso na F3, lá só tínhamos quatro caras na equipe e que tudo era muito pequeno e familiar, aqui tudo é grande.”

Mas, com essa falta de testes, não é frustrante que a melhor parte do trabalho é aquela que você não consegue fazer muita coisa? “Sim, mas ainda é o que nós somos pagos para fazer”, Robert dispara imediatamente. “Algumas pessoas pensam que dirigir um carro de F1 não é tão difícil, mas se isso fosse verdade não existiria uma equipe pagando Fernando Alonso o tanto que ele é pago. Se fosse fácil nós todos teríamos que fazê-lo gratuitamente. Talvez seja a menor parte do trabalho atualmente, mas ainda é a melhor parte.”


Polonês anda muito em pista molhada

Com poucos minutos de conversa você percebe que Robert Kubica não tem medo de falar as coisas, não é aquele discurso pronto da maioria dos esportistas hoje em dia. Então, aproveito para perguntar quais são suas opiniões sobre as novas regras de 2010, como iniciar a corrida com um carro pesado devido à proibição de reabastecimento?

“Parece que estamos andando em câmera lenta”, diz ele. “Se eu lhe der algo que pesa 30 kg para você carregar em suas costas, você pode andar muito lentamente. É um sentimento similar para nós.” Mas é emocionante? “É diferente. Precisa de um pouco mais de habilidade e raciocínio, do que apenas guiar com o pé no fundo o tempo todo.” E sobre as novas equipes? É mais difícil durante uma corrida com tantos retardatários? “É um pouco mais complicado durante a classificação para saber quem está na frente. Então você tem que tomar cuidado, mas acho que novas equipes estão fazendo um trabalho muito bom quando estamos dando volta neles. Não é fácil para eles.”

Na realidade, só há um assunto em que Kubica é um pouco relutante em ser sincero: quem é o melhor piloto no grid. Pergunte isso aos pilotos atuais e todos eles vão responder com firmeza que honestamente acham que eles são os melhores, pois acreditam que é a única maneira de poderem continuar sendo pilotos de F1. Se eles realmente acreditam nisso é uma outra questão, mas a resposta Kubica está tão longe disso quanto você possa imaginar.

“Não, não, eu nunca vou dizer isso, que eu sou o melhor”, diz ele rindo, quebrando o contato visual. “Há um grupo de pilotos muito fortes, e todos eles podem ganhar. Se você olhar para os números, você diria que Michael Schumacher é melhor, mas na Fórmula 1 atual as lacunas são muito pequenas. Ao olhar para 2006, as lacunas eram enormes entre as equipes. Lembro-me quando a BMW era claramente a terceira equipe, nós tínhamos meio segundo de diferença para a frente e o mesmo para trás, então não importava muito o que você fizesse, pois ficávamos sempre em quinto ou sexto. Atualmente ele teria muita dificuldade em conseguir o que conseguiu naquele tempo.”

E com isso, Robert Kubica agita as mãos e vai para seu próximo compromisso – voltar a estudar mais dados na busca desesperada por um décimo aqui, um décimo ali. É raro encontrar alguém na sua posição com esta honestidade e humildade, mas Robert vai para seu local de trabalho em busca de resultados sempre melhores sem precisar ficar fazendo auto propaganda.

Kubica tem a velocidade de Kimi sem a preguiça. A aplicação de Alonso sem as “questões do companheiro de equipe”. E confiança o suficiente para não ficar gritando “Eu sou o melhor”. Não há desejo de ser controverso, assim como também não há farpas cuidadosamente pré-programadas com o objetivo de atingir alguém, nem resquícios sobre falar de seu talento inquestionável.

Só há uma silenciosa determinação em provar que ele pode. Parece estranho na F1, mas poderá fazê-lo campeão mundial um dia.

Revista F1 Racing

AS – www.autoracing.com.br

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