Você está chateado? Imagina a McLaren…

quarta-feira, 29 de junho de 2011 às 18:26

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Martin Whitmarsh, chefe de equipe da McLaren

 

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De má vontade não podem me acusar. Nem de falta de empenho. Tentei de todas as formas algum motivo, por menor que fosse, para falar bem do Grande Prêmio da Europa. Portanto, agora posso dizer com toda certeza: não há nada, nenhuma atenuante. A corrida de Valência foi horrível, horrorosa, um purgante. Certamente, com tantas corridas boas, até ótimas, que já aconteceram neste 2011, uma hora ou outra o encanto seria quebrado, mas não precisava exagerar. Valência pode ser a pista mais linda da F1, mas é também, e inegavelmente, a pior, onde se desenrolam as mais monótonas corridas da categoria.

Sabedora disso, bem que a FIA tentou ajudar. Mexeu nas regras, proibiu a mudança do programa de gerenciamento dos motores a partir das provas de classificação, tudo para refrear o domínio desenfreado do Vettel. Mais uma vez, quebrou a cara, pagou mico. Justiça se faça: não só ela; o mundo inteiro estava junto na certeza de que, assim, o Hamilton podia dar um pau no alemãozinho. Largando na pole, queríamos ver se Vettel tinha como voltar a vencer. Quanta ilusão.

Mas uma coisa temos de elogiar: o talento histriônico do Christian Horner. Não conhecem? É o chefe da equipe Red Bull, aquele cara que, a cada vitória do Vettel, vira para a esquerda e abraça o Adrian Newey com toda a euforia de que ingleses são capazes – ou seja, um discreto sorriso. Pois bem, quando saiu a notícia de que a FIA proibiria o uso dos gases do escapamento para gerar maior pressão aerodinâmica, ele protestou – aqui, de novo, com todo o ênfase que ingleses não têm. Reclamou, baixinho, de que as regras estavam sendo mudadas durante o campeonato. Chegou a falar duas vezes no assunto.

Conhecendo os modos dos súditos da rainha, todos acreditaram que tamanha revolta só se poderia creditar à enorme, incalculável perda que seus carros sofreriam. A pré-estréia da queda do império redbullino seria em Valência. Estão perdidos, antecipava o paddock em uníssono. Sem o programa desenvolvido para o qualifying, nem Vettel nem o menos votado Webber resistiriam à fúria de Hamilton; talvez nem mesmo à controladíssima agressão de Button. Para os espanhóis, Alonso faria uma paella dos Red Bulls e os devoraria com a fome de quem não vê o mundo do alto do pódio há tanto tempo. Teve até brasileiro dizendo que dessa vez dava Massa…

No primeiro treino livre, na sexta-feira de manhã, os mais precipitados comemoraram o 16º lugar de Vettel – outros começaram a se incomodar com o melhor tempo de Webber, exatamente o que mais depende de um bom carro para ser o mais rápido. Os mais atentos deram crédito à informação de que o alemãozinho teria usado o carro na configuração de Silverstone. Na segunda sessão, a prudência foi abafada pelo foguetório que comemorou os dois décimos que Alonso colocou sobre Hamilton e os três que o distanciaram de Vettel.

Mas na manhã do sábado, um enxame de pulgas se postou atrás das orelhas que tanto festejaram no dia anterior. Foi quando Vettel fechou o terceiro treino livre – aquele em que os pilotos afiam seus carros para o qualify – por mais de quatro décimos. Adivinha quem era o segundo. Ele mesmo, o festejado Alonso. Só faltou o locutor dizer ao microfone: e o Oscar de melhor ator vai para Christian Horner…Modestamente, ele agradeceria, do alto do púlpito, a estatueta de ouro ao pai e a mãe, mas principalmente a Sebastian Vettel e Adrian Newey, sem esquecer de Mark Webber, que serve para mostrar ao mundo que na Red Bull não há apenas o gênio de Newey, que faz esses carros maravilhosos, nem apenas o gênio de Vettel, que os coloca na pole position. Tem também o mais do que mediano Webber para mostrar ao mundo que eles vivem em um mundo à parte.

Como, aliás, o australiano faria logo em seguida. Encerrada a premiação do Oscar, o quarteto da Red Bull desceu ao mundo para ocupar toda a primeira fila do grid. Vettel em primeiro, 405 milésimos mais rápido que o terráqueo mais próximo: Lewis Hamilton, o terceiro. Webber em segundo, 217 milésimos à frente do The Best of The Rest, Mr. Lewis Hamilton. Se fosse brasileiro, Horner a esta altura diria aos microfones que respeita muito o adversário, que treino é treino e jogo é jogo, mas algum repórter indiscreto o ouviria dizer um “É nóis na fita, não tem pra ninguém” no ouvido do Newey, que mal controlando a emoção, beijaria o escudo da equipe enquanto enxugava as lágrimas.

Lá do outro lado, Martin Whitmarsh procurava um buraco para se esconder. Ele, que tanto apostou na mudança das regras e via o tiro sair pela culatra. Não havia sido ele, o manda chuva da McLaren, quem protestara contra o uso dos tais gases de descarga nos difusores; mas deu a maior força quando a Williams reclamou. Só que a Williams ganharia de qualquer jeito se o tal uso dos gases fosse banido. Isso porque a Cosworth nunca desenvolveu o sistema que a F1 denominou Difusores a Sopro Quente, nem mesmo o a Sopro Frio. Os carros de Barrichello e de Maldonado simplesmente não tinham sopro nenhum nos difusores – também porque todas tentativas feitas pela Williams derreteram o assoalho ou o difusor do FW33. Mesmo assim, a proibição diminuiria sua desvantagem para as cinco grandes.

Aqui, um parêntese: se você não sabe como funcionam estes sistemas, o Autoracing sai em seu socorro: clique neste link e depois agradeça a Deus por existir um site que lhe explica em detalhes o que e como funciona a F1 hodierna. Fecha parêntesis (não está errado não, o plural é com i) e voltemos a nosso arrazoado.

De todas, quem tinha o sistema mais desenvolvido, pelo que se viu no qualify de Valência, era a McLaren; a Mercedes e a Renault também se deram mal. Elas apoiaram todo o carro deste ano neste recurso, e sofreram no qualify: Rosberg, em sétimo, ficou a quase seis décimos do sexto, o McLaren de Button; Schumacher em oitavo…Heidfeld largaria em um nono lugar inimaginável, ele nem tentou marcar tempo no Q3 para economizar os pneus macios que lhe restavam, todos já usados; o companheiro Petrov em 11º, de volta ao desempenho apenas sofrível do ano passado.

E a Red Bull? Ela, de quem se esperava uma perda de aderência desastrosa, era a menos prejudicada. Perguntado sobre a mexida nas regras assim que chegou a Valência, Vettel se espantou ao ouvir que a McLaren ganhara oito décimos com os Difusores a Sopro Quente. “Nós não chegamos nem perto disso, só ganhamos três”, respondeu o alemãozinho. Quem estava lá viu nele uma sinceridade ingênua. Depois do qualify, Horner completou a informação ao dizer que seus carros usam o Sopro Frio. “Com o Quente, os carros se derreteriam”.

Mas quem se derreteu não foram Vettel e Webber, e sim a oposição. Hamilton teve de se apoiar em mais um erro dos mecânicos da Ferrari durante uma troca de pneus de Massa (uma porca teve a rosca espanada porque o mecânico acionou a pistola antes dela estar encaixada) para chegar em quarto. Saiu de Valência chutando lata. E não estava sozinho. Também o comedido Button declarava para qualquer microfone que lhe fosse estendido que a coisa em Silverstone promete ser ainda mais feia, mesmo com todas as inovações aerodinâmicas programadas para a corrida de casa da mais inglesa das equipes.

Uma solução para Whitmarsh seria uma doença difícil de diagnosticar e de curar, que dure o bastante para justificar sua ausência de Silverstone. Button parece estar certo. As últimas esperanças caem por terra uma a uma. Nem mais no KERS da Red Bull dá para confiar. Desde o Canadá que Vettel e Webber não tiveram mais este problema, antes tão corriqueiro. OK, o KERS deles é limitado, só fornece 54 HP, enquanto os das outras equipes (inclusive a McLaren), batem nos 80 que a FIA permite.

Mas se sem ele os dois Red Bull já andavam na frente em pistas que não lhes são favoráveis, imagina com o KERS saudável nas curvas velocíssimas de Silverstone. O do Button, por sinal, não funcionou por mais da metade do GP da Europa. E se o Ron Dennis der as caras, como fez no Canadá? Ainda mais essa para tirar o já rarefeito sossego do Whitmarsh.

Como se não bastasse, a Ferrari melhorou e o Alonso está no auge, chegou na frente até de um Red Bull. E não se limitou a passar nos boxes, deixou o Webber para trás com uma superfreada na pista. Andou tanto que os engenheiros da Red Bull disseram para o Webber economizar o câmbio, mudar as marchas baixas mais cedo. Pouca gente acreditou naquilo. Deve ter sido mais uma encenação do Christian Horner; além de autor, agora ele está dando também uma de roteirista e arranja desculpa para não pegar mal o pau que o australiano levou…

Ainda bem que a Pirelli está pensando em levar os pneus médios e duros lá para Silverstone. In God we Trust. Eu sei que a frase é americana, está nas notas de dólares e lá na Inglaterra se vive em libras, com uma ou outra concessão aos euros. Mas neste momento de incertezas, vale até ajuda ianque. Quem sabe a Sétima Cavalaria? De outro jeito, ninguém evita o desastre. “Hey, doctor, me ajuda, if you please. Basta inocular uma bactéria difícil de diagnosticar, duradoura, que me deixe longe de Silverstone e do Ron Dennis…Dos Red Bul nem precisa falar, já estamos longe mesmo.”

Lito Cavalcanti

AS – www.autoracing.com.br

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