Sem surpresas: Vettel é tetra. Por Lito Cavalcanti

quarta-feira, 30 de outubro de 2013 às 11:20

Christian Horner, Adrian Newey e Sebastian Vettel

Conteúdo patrocinado por: selopatrocinio

 

Título justo para um piloto (quase) perfeito

Pronto, acabou. Foi um fim como todos sabiam que seria desde o começo. Mesmo enfrentando uma fase inicial mais difícil, a Red Bull se recuperou e esmagou a concorrência. Com 115 pontos de vantagem sobre seu mais próximo perseguidor, Sebastian Vettel tem apenas a história como adversário nesta reta final.

Hoje, o alemãozinho já é tetracampeão, aos 26 anos o mais jovem deles. Se vencer a corrida deste domingo, em Abu Dahbi, igualará o recorde de sete vitórias consecutivas estabelecido por Nino Farina e Michael Schumacher. Ora, é bem provável que vença não só este próximo Grande Prêmio como também os dos Estados Unidos e do Brasil, elevando a marca para nove triunfos consecutivos.

Não há ninguém à altura de Sebastian Vettel na Fórmula 1 atual. Ou melhor, à altura do quinteto Sebastian Vettel/Adrian Newey/Christian Horner/Helmut Marko/Dietrich Mateschitz na Fórmula 1 atual. Juntos, eles são imbatíveis, cada um em sua função. Mas não se pode esquecer que as vitórias da Red Bull só começaram em 2009, com a chegada de Vettel à equipe, onde Marko e Newey já estavam desde 2005.

Vettel, Newwey e Horner, todos sabem, são, respectivamente, piloto, engenheiro e administrador. Marko alguns conhecem, um ex-piloto de F1 austríaco que chegou a ser cotado para trocar a BRM pela Ferrari antes de ter um olho perfurado por uma pedra lançada pela Lotus de Emerson Fittipaldi. Foi na nona volta do GP da França de 1972, no difícil circuito de Clermont-Ferrand, quando ele ocupava o quinto lugar. Era sua nona participação na F1, e ele havia conquistado sua melhor posição de largada, a sexta.

Contemporâneo de Jochen Rindt, o único campeão póstumo da F1, ele havia priorizado o curso de direito antes de retornar às pistas. Forçado a abandoná-las, passou a selecionar os jovens austríacos mais promissores e viabilizar suas carreiras. Com Gerhard Berger e Karl Wendlinger, se notabilizou como caçador de talentos.

Sua equipe, a RSM Marko, viria a brilhar na F3 e na F3.000. Uma de suas primeiras estrelas foi Juan Pablo Montoya, que sofreu em suas mãos por causa da pouca forma física. Em 1999, iniciou a associação com Mateschitz, gerando o Red Bull Junior Team.

O primeiro piloto escolhido foi Enrique Bernoldi. Ele contava com a admiração de Marko, que em 2001 aconselhou Mateschitz a promovê-lo para a equipe Sauber, da qual era acionário. Peter Sauber não abriu mão de um jovem finlandês oriundo da F Renault, um certo Kimi Raikkonen, e o rompimento foi inevitável. Mateschitz decidiu vender as ações e formar sua própria. Comprou a Jaguar em 2004, mas Bernoldi, que havia ingressado na F1 com a malfadada equipe Arrows, havia deixado a categoria em 2002 sem marcar nenhum ponto.

Até então, o ramo de bebidas energéticas era pouco conhecido – mas a criatividade de Mateschitz mudaria este quadro. Sem recorrer aos anúncios pagos na mídia, a Red Bull se notabilizou investindo em esportes radicais, com forte apelo para o público jovem. Foi neste cenário que o garimpeiro Marko descobriu um kartista de 16 anos chamado Sebastian Vettel.

Nem sempre o ex-piloto austríaco acertou. É longa a lista de pilotos cooptados e depois deixados à beira do caminho pelo Red Bull Junior Team. Mesmo assim, Marko não parece temer apostas de risco, sua ligação com Mateschitz tem se mostrado, até agora, inabalável.

Essa confiança deriva também da influência que ele exerce junto a Vettel. Segundo Newey, há enorme diferença entre o garoto que ingressou na Red Bull em 2009 e o tetracampeão em que se transformou Sebastian Vettel ao longo destes cinco anos, muito pelo aconselhamento e a convivência com o ex-piloto. A dificuldade de ultrapassar é um dos aperfeiçoamentos citados pelo mago da engenharia. Antes um ponto fraco, é hoje uma força.

Será que é mesmo? Ainda restam dúvidas. Suas mais notórias ultrapassagens deste ano foram sobre Nico Rosberg no GP do Bahrain, Mark Webber na Malásia e Lewis Hamilton em Spa, todas circunstanciais. Na primeira, apesar da voracidade com que a Mercedes devora os pneus traseiros, ele esperou até a quarta volta, quando o ritmo de Rosberg já havia caído, para concretizá-la.

Na segunda, se aproveitou de Webber ter abaixado a guarda após ouvir a instrução “Multi 21”, que no código da equipe significa “mantenham suas posições”. Na terceira, passando Hamilton na ladeira que se segue à Eau Rouge, só possível por causa das marchas mais curtas que Newey aprecia. Nenhuma delas em disputa roda a roda, como era comum em outros tempos.

Pode-se argumentar que, na Índia, ele caiu para o 17º lugar após a troca dos pneus macios depois de apenas duas voltas – e que a Red Bull sempre usa marchas curtas para ganhar aceleração em detrimento da velocidade máxima. Não foi o caso. Aconselhada pela Pirelli a tratar os pneus macios como se fazia antigamente com os de classificação, a Red Bull descarregou as asas para perder menos velocidade nas retas e alongou as marchas superiores. Com isso, sua velocidade máxima passou de 311 na sexta-feira para 316 e quebradinhos no sábado e no domingo.

Mas o que realmente incomodou foi ouvir engenheiros de outras equipes, como o de Sérgio Perez, orientarem seus pilotos a não oferecer resistência a Vettel, facilitando ao extremo sua ascensão no posicionamento da prova. O tal engenheiro alegava que a disputa do mexicano era com outros adversários –portanto, ele devia ceder o segundo lugar para o alemãozinho de mão beijada. Como, aliás, já havia sido feito por vários outros sob a mesma argumentação.

Sem esta valiosíssima e igualmente inapropriada facilitação, a vitória de Vettel teria dado fim a toda e qualquer dúvida. Mas se permanece, ela se limita a este aspecto. Ele é, de resto, um trabalhador incansável, capaz de passar, como passou, horas infinitas no simulador para extrair o melhor do sistema de geração de pressão aerodinâmica pelo extrator criado por Newey, que exige mudanças profundas na pilotagem – mudanças essas a que Webber nunca se adaptou.

Vettel tem também um ilimitado sendo de lealdade e companheirismo que contamina toda a equipe. Já da sua capacidade de ultrapassar sem o auxílio dos adversários, ainda não se tem a medida certa. Sem isso, não se pode adereçá-lo com avaliações que sugerem uma perfeição que ainda não exibiu. Uma boa chance disso foi perdida neste domingo.

Por isso, e desde então, deve-se pleitear o urgente banimento dos rádios. Sem eles, os pilotos não serão mais alertados do que está em jogo e, assim, terão de voltar a oferecer resistência férrea a qualquer adversário. É uma indispensável contraposição a esta objetividade exagerada que nos impede de desfrutar da melhor parte deste lindo espetáculo que a F1 pode ser – mas não vem sendo.

De resto, quase já não tenho dúvidas de que Vettel é hoje o melhor piloto da F1. Quase, repito e enfatizo. Nas provas de classificação, não há quem se compare a ele, mas a excelência de Fernando Alonso e Kimi Raikkonen nas corridas impede qualquer certeza – apesar da insuficiência destes dois nos qualifies. Ambos admitem que, largando mais à frente, o ano teria sido bem diferente. Concordam todos – mas lembram que algumas vezes eles sequer rivalizaram com seus companheiros de equipe.

No caso de Alonso na Índia, foi animador vê-lo fazer a segunda melhor volta no Q2, com um tempo que o colocaria em terceiro no grid final. Mas a Ferrari, talvez desconfiada da sua capacidade de repetir o feito, optou no Q3 pelos pneus médios, mais duros e menos aderentes, o que o relegou ao desastroso oitavo lugar no pelotão de largada.

Certamente, os estrategistas de Maranello têm consciência dos perigos de largar no meio do pelotão, mas os desprezaram. Envolvido no rala-rala de Kimi Raikkonen e Mark Webber na curva Um, Alonso perdeu parte da asa dianteira esquerda. Poucos metros depois, na curva Quatro, bateu em Jenson Button ao ser surpreendido pela ótima ultrapassagem que lhe foi infligida por Daniel Ricciardo – que o venceu em um duelo iniciado na 39ª das 60 voltas.

Raikkonen vinha bem ate sofrer a tentativa de ultrapassagem do companheiro de equipe, e a forma como respondeu às ordens de sair da frente causou mal estar à Lotus. Sexto no grid, ele viu Romain Grosjean, que largara em 17º, tentar tomar seu terceiro lugar com uma passada por fora e decidiu endurecer. Seu carro saiu de traseira e forçou o francês a sair da pista para evitar uma batida de consequências imprevisíveis.

A troca de palavrões via rádio entre o finlandês e o engenheiro Alan Permane deve ter causado profundo desconforto junto aos diretores da Ferrari. Terão eles imaginado o que ocorrerá caso no próximo ano caso seja necessário pedir a Raikkonen para dar passagem a Alonso – ou vice-versa?

Alheio a tudo isso, Felipe Massa fez o que se esperava e não se obteve do espanhol. Com os pneus macios, obteve o quinto lugar no grid, resultado que dificilmente seu companheiro melhoraria, largou bem, fez uma ultrapassagem fantástica sobre os Mercedes de Rosberg e Hamilton no fim da reta oposta e levou sua Ferrari a um quarto lugar que vem em boa hora.

Sim, com a merecida ascensão de Nico Hulkenberg e a chegada de Pastor Maldonado com suas dezenas de milhões de dólares ao balcão de negócios da Lotus, Massa perdeu terreno. Ele costuma dizer que um resultado não vai afetar sua imagem – mas largar quatro vezes em cinco corridas à frente de Alonso não lhe faz nenhum mal. E terminar no quarto lugar uma corrida em que mostrou velocidade, ousadia e maturidade, extraindo tudo que o carro da Ferrari tem para dar, é uma confirmação oportuna e bem vinda de qualidade.

Seu destino para o próximo ano ainda não tem confirmação oficial. O colega Américo Teixeira, que merece crédito, cravou que é a Williams – o que me faz tremer. Por mais que as regras de 2014 transformem em futurologia qualquer avaliação da hierarquia dos próximos anos, as finanças e a engenharia de cada equipe continuam sendo parâmetros da maior importância.

Red Bull, Ferrari e McLaren são as apostas mais certas – e a Williams, carente nos dois quesitos supracitados, é das mais duvidosas. Ela vem de vexames alarmantes nas duas últimas corridas, quando Pastor Maldonado foi obrigado a parar sem uma roda – ou com uma delas quase caindo.

Erro humano ou de projeto? Seja qual for, existe no mundo uma verdade cruel porém inegável: os melhores profissionais custam mais caro. As duas rodas perdidas fizeram a Williams ser multada, em cada ocasião, em 60 mil euros, que somados beiram 180 mil reais que podiam e deviam ser gastos de formas bem mais úteis.

Melhor seria ver o Felipe na Lotus – desde que o aguardado reforço financeiro se materialize. Ou na Force India, que já trabalha no projeto de 2014 desde julho e mostrou, no GP de casa, que ainda é capaz de marcar pontos. Ou na Sauber, que também vem obtendo bons resultados. Na Williams? Melhor não.

Nesta terça-feira, porém, surgiu uma notícia que pode nos fazer sonhar: Ross Brawn vai sair da Mercedes, afirmam o experiente jornalista Andrew Benson e o ex-dono de equipe Eddie Jordan, integrantes do excelente quadro que a BBC montou para cobrir a F1 com detalhamento e seriedade.

Brawn é o grande rival de Adrian Newey no panteão dos engenheiros da F1. Mas lhe falta uma façanha já realizada pelo colega: levar uma equipe pequena – ou apequenada como a Williams – ao topo. Nada mais consagrador para um inglês, considerada a dimensão histórica da escuderia fundada por dois mitos do automobilismo, Sir Frank Williams e Patrick Head.

Será que Ross Brawn sonha com isso? Nós pelo menos podemos sonhar esse sonho.

Lito Cavalcanti

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