RBR na cabeça. Não tem para ninguém

quarta-feira, 31 de agosto de 2011 às 15:11

Red Bull domina Spa 2011

Red Bull faz dobradinha em Spa Francorchamps 2011

 

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Não tem mais para ninguém. Era grande a expectativa de reação das outras equipes após as férias de agosto. Pensava-se que, em Spa-Francorchamps, a coisa seria diferente, a Red Bull sofreria para acompanhar o ritmo que se esperava avassalador das McLaren e talvez da Ferrari. Afinal, já havia três corridas que Sebastian Vettel não vencia. Em vez dele, Fernando Alonso, Lewis Hamilton e Jenson Button chegaram ao lugar mais alto do pódio. Sinal claro, inegável, de que, enfim, os bólidos desenhados por Adrian Newey escorregavam ladeira abaixo. No sentido contrário, McLaren e Ferrari evoluíam a olhos vistos.

Doce ilusão. Foi como se a Fórmula 1 voltasse ao princípio do ano. Pole position para Vettel, terceiro lugar no grid para Mark Webber. Vitória para Vettel, segundo lugar para Webber, segunda dobradinha do ano para a Red Bull. Ao fim da corrida, na qual teve de assumir riscos e acabou sendo beneficiado pelas circunstâncias, Adrian Newey enxugou os olhos marejados e, com certeza, repetiu para si mesmo: não tem mais para ninguém.

Mas até aquele momento, Newey passou por intensa preocupação. O problema foi a cambagem excessiva nas rodas dianteiras que seus carros precisaram para ganhar aderência na entrada das curvas: 4,8 graus segundo Newey, 4,36 segundo a medição da FIA. Seja qual for, estava bem acima do limite de quatro graus aconselhado pela Pirelli. Isso, somado à baixa pressão dos pneus (abaixo das recomendadas 22 a 20 libras nas rodas dianteiras e 20 e 18 nas traseiras) destinada a ampliar um pouco mais a área de contato dos pneus com o piso, causou o superaquecimento do ombro interno e, em consequência, a ameaça de descolamento da banda de rodagem da parede lateral. As bolhas eram visíveis a olho nu após a classificação.

Como o mesmo ocorria com a McLaren de Hamilton, Newey e Martin Whitmarsh pleitearam à direção da prova a troca dos pneus dianteiros e a permissão para reduzir a cambagem. Em vão. Os comissários técnicos alegaram, com razão, que o problema havia sido gerado pela regulagem, fugia à condição de problema estrutural pelo qual essa mudança pode ser autorizada. Daí o dilema: expor-se ao risco de explosão de um pneu a mais de 300 quilômetros por hora ou trocá-los, mudar a cambagem e largar dos boxes.

Optou-se pelo risco. Por isso, Webber, que caiu para oitavo na largada, trocou seus pneus já na terceira volta – e na oitava, com pneus duros, fez sobre Fernando Alonso, na entrada da famosíssima curva Eau Rouge, a melhor ultrapassagem da corrida e, talvez do ano. Vettel ficou na pista até o fim da sexta volta, quando já era o líder, e mesmo beneficiado pela entrada do Safety Car causada pelo acidente de Hamilton, venceu com maestria. Para isso, fez uma ultrapassagem brilhante, por fora sobre Rosberg na velocíssima curva Blanchimont e sobre Alonso na Les Combes. Um campeão digno do título, secundado pelo melhor segundo piloto da atualidade, guiando o melhor F1 deste ano.  

Não tem mesmo para mais ninguém. Vettel já pode assegurar seu segundo título consecutivo daqui a dois Grandes Prêmios, na distante Cingapura. Mas poderia ser diferente se não fosse por mais um fim de semana de presepadas de Lewis Hamilton, que tinha carro para perturbar a vida dos Red Bull, que tem habilidade para tanto, mas demonstra, prova sim e prova também, que lhe anda faltando, e muito, controle mental e emocional.

No sábado, mesmo depois de uma condenável batida lateral com a Williams de Pastor Maldonado, ele mostrou toda sua enorme habilidade arrancando com unhas e dentes o segundo lugar no grid, mesmo com um carro remendado com fita adesiva. No domingo, estragou uma bela exibição, que poderia até levá-lo ao segundo lugar, ao bater na Sauber de Kamui Kobayashi e se estatelar no guard rail. Mesmo com os pneus dianteiros danificados pela cambagem exagerada, ele atingiu a liderança na oitava volta se mantendo na pista em condições visivelmente arriscadas. Só fez sua troca no fim da 11ª volta, depois até das duas Ferrari, que sabidamente gastam menos pneus que as duas rivais.

Vai mal esse nosso herói. Reage a ferro e fogo a toda e qualquer circunstância que lhe desagrada. A ultrapassagem sobre o Maldonado foi, no mínimo, desrespeitosa. Sim, precisava se livrar do 13º lugar que ocupava no Q2 para se manter na luta por uma posição entre os 10 primeiros do grid, mas isso não justifica a brutalidade com que se jogou para dentro da curva, deixando ao venezuelano a decisão de bater ou deixá-lo passar. No susto, Maldonado evitou o choque; metros mais tarde, resolveu não deixar passar em brancas nuvens aquela que era a segunda demonstração de menosprezo de Hamilton por ele.

Ainda estava nítido o atropelamento de Hamilton sobre ele em Mônaco, quando vinha a caminho de um honroso sexto lugar – logo após ter batido em Felipe Massa tentando passar onde mal há espaço para um único carro. Inconformado, Maldonado pôs-se ao lado da McLaren e jogou seu Williams para a esquerda. Para surpresa geral, Hamilton também jogou seu carro para bater em Maldonado, mas isso foi ignorado pelos comissários: em atitude repleta de discriminação, puniram o venezuelano com a perda de cinco posições no grid e deixaram Hamilton sair dessa com apenas uma advertência.

Mais uma vez, seu patrão se travestiu de protetor e achou tudo muito bom, tudo muito bem. Martin Whitmarsh tem a capacidade de enxergar o mundo como melhor lhe parece. Seu mundo é cor de rosa, tudo funciona às mil maravilhas e seus pilotos, coitadinhos, nunca fazem nada de errado. Por essas e outras, Hamilton sai distribuindo trombadas em quem ousar atrapalhar suas voltinhas e deixa claro que é uma nau sem rumo e sem freios. Que falta lhe faz a presença do pai Anthony ao seu lado.

Ainda bem que a McLaren tem um gentleman como Jenson Button para não deixar a imagem da equipe ser arrastada para o ingrato terreno da antipatia coletiva. E que Jenson Button esse que surgiu nas últimas corridas. Um cavalheiro, sim; um piloto de extrema suavidade no trato com o volante e os pedais, sim; mas também, e acima de tudo, um home determinado a vencer. E também determinado a fazê-lo sem que a velocidade e a garra maculem o respeito e a elegância com que trava suas disputas. É capaz de ultrapassar até por fora adversários como Vettel e Alonso, mas é incapaz de cortar-lhes a trajetória, forçá-los a sair da pista para evitar um choque.

Até mesmo quando se viu relegado ao 13º lugar no grid por um erro de avaliação que seus engenheiros não corrigiriam, Button se manteve igual ao que sempre foi: o desagrado se estampava em suas feições, mas ele se mantinha calmo, equilibrado. Largou no meio do pelotão, levou uma batida por trás na saída da primeira curva, perdeu a asa dianteira na reta e mesmo assim aceitou o pedido dos engenheiros para ficar na pista até a quinta volta. Entrou nos boxes, se livrou dos pneus duros e iniciou uma corrida consagradora rumo a um terceiro lugar glorioso. Nem só de velocidade se faz um piloto.

Mas o Grande Prêmio da Bélgica teve mais do que Vettel, Webber, Hamilton e Button. Teve também o 20º aniversário da estréia de Michael Schumacher na Fórmula 1. Mesma pista, mas com um roteiro bem diferente. Em 1991, ele alinhou em sétimo, mas a embreagem que ele já avisara a Eddie Jordan que estava prestes a quebrar quebrou. Isso porque Jordan achou caro trocá-la; mais caro foi ver Schumacher sentado em um carro da Benetton na corrida seguinte.

Dessa vez, a pista belga permitiu a Schumacher uma corrida digna de seu cartel de heptacampeão. Primeiro colocado no treino inicial da sexta-feira, quando foi um dos dois pilotos a marcarem tempo antes que a chuva caísse, ele terminou o sábado no guard rail quando ainda abria sua primeira volta no treino de classificação. Não que tivesse perdido a chance de lutar pela pole, como mostrava seu desempenho anterior: 11º no segundo treino livre, 10º no terceiro. Mas foi duro ver a Mercedes perder a roda traseira esquerda e sair descontrolada rumo ao guard rail.

Mas no domingo, o heptacampeão mostrou o quanto ainda vale: vale muito. Fez uma corrida brilhante do 24º para o quinto lugar. Não foi sua melhor colocação no ano, fez um quarto no Canadá; mas foi sua melhor corrida desde que retornou às pistas. Não cometeu o erro costumeiro de quebrar o bico do carro em disputas impossíveis, se manteve calmo e encerrou sua brilhante participação com uma ultrapassagem sobre seu algoz Nico Rosberg, o companheiro de equipe que o vem superando com regularidade. Isso em um dia em que Nico mostrou que a única coisa que lhe falta para ganhar corridas é um carro à altura.

De fato, o filho de Keke tem-se mostrado um dos pilotos mais fortes nas provas de classificação e no começo das corridas. Quando, aliás, tem feito de Felipe Massa sua principal vítima. Já não foi a primeira vez que Massa entra na primeira curva à frente de Rosberg e perde a posição após alguns metros. E aí a história se repete: como a Mercedes tem sua altíssima velocidade final como maior qualidade, por mais que lute Felipe não consegue retomar a posição perdida. E quando o principal defeito da Mercedes se manifesta, na forma de desgaste excessivo dos pneus traseiros, a Ferrari do brasileiro mostra o mesmo problema, consequência das freadas desesperadas e da patinagem das rodas traseiras motivada pelos excessos no acelerador. Aí vem Alonso, que tem a calma como uma de suas principais virtudes, e passa pelos dois – quase sempre seguido por Hamilton, que enquanto está na pista é assustadoramente veloz.

São muitas as perguntas sobre o que acontece com Massa. Para mim, é uma questão de ansiedade e circunstâncias – além do difícil convívio com o melhor piloto dos últimos tempos associada a um mau ano da Ferrari, cujo carro é uma coleção de remendos em cima de um projeto inicial inadequado. Na Bélgica, por exemplo, o brasileiro conquistou uma posição no grid melhor do que a Ferrari poderia sonhar para qualquer um de seus pilotos: a quarta. O limite dos carros de Maranello, na verdade, era a quinta colocação, mas a ausência de Button no Q3 propiciou a chance que Massa aproveitou com maestria.

Mas ele já sabia, e comentava com a imprensa, que o velho problema de difícil aquecimento dos pneus persistia. E o clima na Bélgica o fazia ainda mais presente. Largou bem, pulou para terceiro, mas quando buscou o acelerador na saída da curva Um, faltava tração. Pneus frios. Talvez tenha errado ao tentar se manter perto de Rosberg e Vettel, e para isso forçou o ritmo e, em poucas voltas, seu carro saía de traseira como um kart. Daí para a frente, foi vítima fácil para Alonso e Hamilton, voltou a ser superado por Rosberg e um pneu furado três voltas após a troca o relegou ao oitavo lugar. Mas seu lugar, em condições normais, teria sido o quinto, uma posição atrás de Alonso.

Rubens Barrichello também levou menos do que podia do GP da Bélgica. O novo difusor da Williams melhorou o consumo dos pneus traseiros e por algum tempo ele vislumbrou, com razão, a possibilidade de chegar ao Q3. Mas encontrou trânsito pesado em sua última volta no Q2 ao encontrar, na última curva, o Lotus de Heikki Kovalainnen. Pena. Na primeira sessão de treinos livres, também com pista molhada, Rubinho fez o oitavo tempo, e na corrida registrou a terceira melhor volta. Contra ele, a inesperada batida na roda traseira de Kamui Kobayashi, fruto do desespero de se incluir entre os 10 primeiros e marcar mais um ou dois pontinhos em um Mundial em que eles têm sido raros.

Reservei Bruno Senna para o fim. E nessa hora me vêem a cabeça dois ditados ingleses. O primeiro é o famoso last but not least, que quer dizer “último mas nem por isso menos importante”; o outro é o menos popular too much too soon, que significa algo como “sucesso demais em um espaço de tempo demasiadamente curto”. Não, não entendam que achei bom vê-lo bater na primeira curva – se bem que estava claro que ele teria enormes dificuldades na corrida sobre pista seca.

Empolgado com o bom desempenho dele durante o tempo em que choveu na segunda sessão da sexta-feira, quando ele passou de terceiro a segundo e a primeiro em apenas três voltas, e com o sétimo lugar no grid – que poderia ser o sexto caso ele não tivesse errado o acionamento de abertura da asa traseira – o Brasil voltou a sonhar exageradamente. Falava-se em volta das manhãs felizes de domingo, glorificava-se o nome Senna, revia-se o tio Ayrton no carro preto e dourado. Calma, corremos o risco da repetição de um temível processo de glorificação prematura – e da quase sempre inevitável frustração que já queimou o filme de muita gente boa junto a um público cuja enorme paixão é inversamente proporcional ao conhecimento do automobilismo.

Bruno Senna teve ótima participação no GP da Bélgica. Da sexta-feira até a freada da lentíssima curva La Source ainda na primeira volta, foi o protagonista do GP. Mas seu conhecimento dos pneus Pirelli era mais do que pouco: se limitava a 301 quilômetros em Jerez durante a pré-temporada (quando os pneus eram substancialmente diferentes do que são hoje) e a 109,525 quilômetros nas 25 voltas que deu no primeiro treino livre do GP da Hungria. Havia também as poucas voltas na sexta-feira e no Q3, mas em ambas oportunidades a pista estava pelo menos úmida, e assim não se aprende nada sobre durabilidade e queda de aderência.

Na largada, com 150 quilos de gasolina, carga que ainda não tinha experimentado, Bruno tentou ganhar a posição de Jaime Alguersuari por dentro na La Source. Freou além do que os pneus ainda não totalmente aquecidos suportavam, as rodas dianteiras escorregaram e bateu no Toro Rosso do espanhol, que por sua vez carambolou em cima da Ferrari de Alonso, que continuou com sua Ferrari em perfeita condição. Pode-se dizer que Bruno se precipitou, mas também se pode dizer que ele fez o que fazem pilotos de corrida: tentou ganhar posições.

Foi justamente punido com um drive through por causar o acidente e caiu para último. O lado positivo é que isso lhe permitiu fazer as 44 voltas sem a pressão que inevitavelmente sofreria caso se mantivesse na zona de pontos. Pôde assimilar com calma lições valiosas sobre como proceder com os pneus Pirelli, cuja vida curta, uma encomenda dos organizadores, é o segredo do sucesso de quem hoje corre e ganha na Fórmula 1.

Ao fim do Grande Prêmio, seu contratador, o francês Eric Bouiller se dizia satisfeitíssimo com seu trabalho. Em sua avaliação, Bruno trouxe para a equipe os sorrisos e a motivação perdida, uma alusão clara à campanha decepcionante de Nick Heidfeld e o temperamento fúnebre de Vitaly Petrov. Bruno foi apenas o 13º na corrida, à frente apenas dos carros das equipes pequenas e da Williams de Barrichello, a quem superou após Rubinho fazer uma última parada para trocar o bico danificado pela batida na traseira da Sauber de Kobayashi.

Longe de ser um mau resultado para quem fazia sua estréia na equipe e que não participava de um GP desde o final do ano passado. Mas pouco para quem largou em sétimo. Sua melhor volta foi, também, a 13ª, 1min53s585, na 39ª passagem. Não resiste a uma comparação com a de Petrov, a nona, com 1min52s432. Para efeito de ilustração, o mais rápido da corrida foi Webber, 1min49s883. Isso deixa claro que com esse carro da Renault ninguém pode sonhar com pódio, muito menos com a vitória, como se andou aventando na empolgação do sábado.

Mas Monza pode ser diferente. Com mais conhecimento dos pneus, Bruno pode voltar a arrancar elogios de Bouiller. E a chamar atenção de outros chefes de equipe. Todos concordam: sua atuação foi surpreendente, seu erro foi previsível. O saldo é altamente positivo. E o chefe Bouiller já disse em alto e bom tom que, por ele, Bruno fica até o fim do ano na Renault. E já há quem diga que o futuro de Romain Grosjean, o recente novo campeão da GP2 e principal candidato a uma vaga na Renault no ano que vem, passa por outra equipe. Assim ele ganha experiência e a F1 mantém a magia do nome Senna. Bruno Senna.

Lito Cavalcanti

AS – www.autoracing.com.br

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