O Japão pós-terremoto. Por Daniel Gimenes

quinta-feira, 17 de março de 2011 às 18:56
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Usina nuclear de Fukushima. Antes e depois do terremoto

A convite do site Autoracing, venho aqui passar a situação do dia a dia das pessoas, e principalmente dos brasileiros de uma maneira em geral nas províncias que não foram atingidas pelo terremoto diretamente, e das quais ainda estão fora de perigo de qualquer tipo de radiação nuclear. Vivo na pequena e pacata cidade de Takahama, região da grande Nagoia, trabalho em uma escola para crianças brasileiras na cidade de Toyota. No momento dos abalos de sexta-feira, estava trabalhando, a primeira providência ao sentir o tremor foi com os demais professores da escola a segurança dos alunos, orientando-os a colocar os capacetes e entrar debaixo das mesas. Cada sala dispõe de capacetes para todas as crianças para em alguma eventualidade dar maior proteção. Após este primeiro momento evacuamos o prédio, e aguardamos por vinte minutos na quadra de esportes. Até então sabíamos apenas que o terremoto tinha ocorrido na região nordeste do país, nada mais. Sentimos apenas um sismo mais leve por estarmos no centro do arquipélago. Após entrarmos em aula novamente, o segundo tremor fez com que evacuássemos o prédio uma vez mais, e passamos a perceber que poderia ser algo mais sério.

Pela televisão vimos o tsunami carregando tudo o que encontrava pela frente, e de fato, passamos neste momento a temer que o terremoto, pela força que apresentou, desencadeasse mais tremores, que passaram a ser uma rotina quase que diária até terça-feira passada, dia 15. Hoje estamos mais tranqüilos com relação aos abalos, porém as pessoas estão estocando comida e água para alguma eventualidade, e a situação da usina de Fukushima ainda nos preocupa muito. Alguns brasileiros já marcaram a passagem de volta, mas acredito que será precipitado da parte da maioria pelo menos, pois a tranqüilidade em nossa região, local de maior concentração de brasileiros é grande, apesar de tudo. Segue abaixo, portanto, o meu ponto de vista de como está sendo o dia a dia nas regiões com maior quantidade de brasileiros residentes. Espero poder acalmar algumas famílias com o relato, e de fato, ajudar a quem precise de informações deste tipo.

GP do Japão de Formula 1
Sobre o GP do Japão marcado para 9 de outubro, acredito que se nada de mais grave acontecer com a usina, não teremos maiores problemas com a realização da corrida.

O dia-a-dia do cidadão
Na verdade, a sensação que o cidadão tem no dia a dia aqui na região de Nagoia, é que mesmo estando longe, não estamos completamente seguros, por assim dizer estamos sentindo muito medo e nos precavendo para alguma eventualidade, apesar da aparente tranqüilidade que existe entre os nipônicos. Não conseguimos nem sequer desligar a televisão ou deixar de acessar sites da internet que tratam sobre o assunto e divulgam avisos de tremores quando ocorrem. Existe a possibilidade das placas das quais nossas regiões estão assentadas virem a sofrer algum abalo acima de 7 graus na escala Richter até o final da semana, por isso estamos tomando todo o cuidado e organizando o kit contra terremotos, com mochila contendo água, comida e roupas. Evitamos ligar o gás em casa, a preocupação é constante.

Alterações à normal circulação de pessoas e bens
Não estamos notando nesta região alguma alteração significativa na circulação de pessoas, tudo parece extremamente tranqüilo entre os japoneses. Eles são bem comedidos, não demonstram muito sentimento, porém ao conversarmos com alguns, estão tão preocupados como nós brasileiros, mas bem calmos.  Algumas fábricas estão paradas por precaução, principalmente a Toyota aqui em nossa região, em virtude disso diminuiu um pouco a quantidade de pessoas que pegam o mesmo trem que eu, por exemplo, todos os dias pela manhã para ir ao trabalho.

Disponibilidade de bens de consumo básicos, electricidade, água, comida

As autoridades japonesas são altamente confiáveis, porém em caso de um grande terremoto tememos estragos materiais, como casas e prédios desabando que coloque em risco nossa integridade física. Apesar do alto nível de segurança das construções japonesas, principalmente as mais novas. Em virtude dos problemas energéticos, o governo japonês está racionando energia elétrica em algumas províncias, e possivelmente seremos afetados nos próximos dias pelo racionamento. As pessoas estão estocando alimentos, e já está difícil encontrar água mineral e outros alimentos básicos mesmo em regiões que não foram afetadas materialmente pelo terremoto, como aqui na província de Aichi. Mas o abastecimento tende a se normalizar com a diminuição da tensão.

Sentimento geral da população
O sentimento geral da população é de tristeza e aceitação da realidade a que estão submetidos os japoneses, é o país deles, lidam com isso há muitos anos e sabem que mais cedo ou mais tarde terão de lidar com problemas deste tipo. Entre nós brasileiros o sentimento é de certa revolta, pois estamos desde 2008 vivendo os efeitos da crise financeira mundial, passamos pela epidemia da gripe do porco e agora o terrível terremoto. Muitos dos brasileiros já pensam em voltar para o Brasil o mais rápido possível, inclusive a mídia brasileira já relatou casos de pessoas que já retornaram ao nosso país. Mas a grande maioria dos brasileiros está empenhado a ajudar em tudo que puderem as autoridades japonesas, com doações financeiras e de alimentos.

Confiança nas garantias oficiais
As autoridades japonesas sempre foram extremamente honestas, sempre agem com justiça e orienta muito bem a população em casos de desastres, independente de serem japoneses, brasileiros, chineses ou qualquer outra nacionalidade. No tocante às questões nucleares, apesar do governo passar a impressão de minimizar o impacto das explosões que ocorreram ou possam ocorrer na usina de Fukushima, não conseguimos confiar nas palavras oficiais, e de fato, tememos que algo pior venha a acontecer. A impressão que temos é que a situação na usina está fora de controle, aí alguns resolvem ir embora rapidamente com medo de algum perigo maior.

Maior medo depois de tudo o que já aconteceu
O maior medo que temos agora é de que algum novo tremor forte aconteça, principalmente em nossa região, e claro, com a segurança de todas as pessoas nas áreas mais atingidas do país, bem como com a usina nuclear de Fukushima. Alguns brasileiros já começam a se preocupar se as firmas das quais trabalham irão manter a produção após o pior ter passado e se conseguirão manter os empregos.

Daniel Gimenes, Takahama, Japão

www.autoracing.com.br

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