MotoGP – Motegi 2016

terça-feira, 18 de outubro de 2016 às 20:55
Marc Marquez, Jorge Lorenzo e Valentino Rossi

Marc Marquez, Jorge Lorenzo e Valentino Rossi

Colaboração: Carlos Alberto Goldani

A situação dos três postulantes ao título do MotoGP de 2016 na largada para a prova do Japão era previsível, Valentino Rossi teria de vencer a prova e esperar que a competitividade de seu companheiro de equipe e das Ducati e Suzuki colocasse pelo menos três motos entre ele e Marc Márquez. Jorge Lorenzo antevia uma situação mais complicada, vencer e rezar por algum tipo de milagre, talvez uma desistência do líder do campeonato. Márquez era o menos pressionado, bastava controlar os concorrentes, manter a escrita de pontuar em todas as provas e limitar os possíveis danos, procrastinando a decisão para Philip Island. O título em Motegi era improvável, uma vitória na casa da Honda, entretanto, poderia ser considerada.

O piloto da Honda não só venceu a prova como alcançou uma pontuação que lhe garantiu o título de 2016 antecipado. Vencer a prova foi mérito exclusivamente seu, o título faltando três provas para o encerramento da temporada foi consequência de uma série de outros fatores.

Márquez largou excepcionalmente bem, mas o crônico problema de retomada de velocidade da RC213V permitiu que Lorenzo o ultrapassasse na segunda curva. O campeão de 2015 manteve a liderança nas primeiras voltas, enquanto Márquez e Rossi travaram uma verdadeira batalha pela segunda colocação. O espanhol da Honda assumiu a liderança na terceira volta e deixou Rossi em uma situação complicada. O único resultado que interessava ao italiano era a vitória e ficar atrás do seu companheiro de equipe não era aceitável, então o multicampeão foi obrigado a aceitar riscos maiores, conseguiu ultrapassar Lorenzo na sexta volta e, no processo de aproximação com o líder, perdeu o controle da M1 e caiu.

Rossi não tem justificativa para sua queda. Ele estava buscando alcançar Márquez gradativamente, consciente que seriam necessárias algumas voltas para permitir uma tentativa de ultrapassagem. O acidente aconteceu sem aviso prévio, ele aproximou-se da curva com o mesmo trajeto e a mesma pressão no acelerador das voltas anteriores, a frente simplesmente fugiu. A única explicação possível é o comportamento do pneu dianteiro, ele havia encontrado um ajuste adequado com o componente intermediário, que tem como característica uma faixa muito estreita de tolerância a erros. A esperança de seguir na disputa pelo campeonato acabou na brita, em meio a uma nuvem de poeira. Rossi ainda conseguiu conduzir sua moto até os boxes, mas desistiu alegando que, não havendo possibilidade de vitória, não havia sentido em voltar à pista.

Lorenzo conseguiu manter a segunda colocação até a décima nona volta, quando perdeu a frente e caiu. O campeão de 2015 também debitou seu infortúnio para a Michelin, alegando vibração no pneu dianteiro. A Yamaha não está conseguindo equacionar a combinação da M1, o estilo de condução de seus pilotos e o comportamento dos pneus Michelin. A equipe obteve a última vitória no início de junho, com Rossi em Barcelona. Nas primeiras sete provas da temporada a Yamaha venceu cinco, nas oito seguintes obteve cinco pódios, nenhuma vitória. A queda de dois pilotos da equipe em uma mesma prova é extremamente rara.

A informação na justa medida é útil, em excesso atrapalha. Quando o box da Honda sinalizou “ROSSI OUT”, para Márquez significava um concorrente a menos, a conveniência de abrir uma maior vantagem em pontos sobre Lorenzo, entretanto, persistia. A placa indicando “LORENZO OUT” exibida a poucas voltas do final teve um significado diferente, a possibilidade de confirmar o campeonato era real e o piloto sentiu. O que os comentaristas da TV presumiram que era uma administração do resultado, Márquez explicou na entrevista após a prova: “Honestamente, quando soube que Lorenzo estava fora, fiquei eufórico e perdi o foco. Errei a troca de marchas quatro ou cinco vezes nas últimas voltas, não conseguia mais mentalizar o circuito”. Sua confusão foi traduzida nos tempos por volta, muitos décimos mais lento. Sua diferença para a Ducati de Dovizioso, entretanto, era grande o suficiente para permitir-lhe o luxo da descontração.

Motegi é a única pista do mundial de MotoGP onde os discos de freios expandidos são obrigatórios, seu traçado exige o uso intenso dos freios e essa particularidade serviu para mostrar didaticamente diferenças no estilo de pilotagem. Também ajuda a entender porque com uma moto que não tem a maior velocidade em retas (Desmosedici), nem é a mais equilibrada (M1), Márquez consegue superar todos os outros pilotos. Rossi e Lorenzo utilizam o recurso de realizar o contorno das curvas em velocidade, com uma trajetória ampla. Márquez freia absurdamente tarde, sua roda traseira descola vários centímetros do piso e retoma o contato muito próximo do apex antes de mudar rapidamente a direção da moto, um estilo que Cal Crutchlow uma vez definiu como uma “queda controlada”, e que rende preciosos milissegundos.

Conta a lenda que um pracinha brasileiro servindo nas forças de paz no Haiti recebeu uma carta da namorada rompendo a relação, sob a alegação que era difícil manter-se fiel com a distância que os separava, e solicitou a devolução de sua fotografia. Magoado, ele pediu emprestadas fotos das namoradas e irmãs de seus colegas, colocou todas em um envelope e mandou para a “ex” com um recado. “Desculpa, não consegui associar seu nome com a foto, por favor pegue a sua e devolva as outras. Ah, espero que seja muito feliz”. Moral da história: É necessário manter a classe até quando se perde. Não é o que acontece com a Yamaha. A equipe não soube administrar o ego de suas estrelas, minimizou a perda do então campeão do mundo para a Ducati, fez uma oferta hostil para contratar um piloto da Suzuki e debitou na conta da Honda o banimento das winglets para a próxima temporada, além de seu dirigente buscar muita visibilidade nos meios de comunicações a ponto sugerir a sua participação em uma das conferências dos pilotos com a imprensa, evento obrigatório que antecede os GPs. A Honda lidera o mundial dos construtores (316 a 288 pontos), de equipes (429 a 378 pontos) e Cal Crutchlow com uma RC213V é o melhor classificado entre os independentes.

O título antecipado de 2016 para o piloto da Repsol Honda foi conseguido, em grande parte, pelas falhas dos pilotos Movistar Yamaha. Valentino Rossi caiu em Austin, Assen e no Japão, também foi penalizado com uma falha de motor em Mugello. Lorenzo administrou um campeonato complicado, sua falta de sintonia com a equipe desde o final da temporada passada justifica seu já lendário mau humor e o ambiente carregado nos boxes. Ele não se acertou com o pneu dianteiro na maioria das corridas, ponto fundamental para o seu estilo de condução preciso e milimétrico.

Márquez já tem um lugar de honra no livro de recordes da MotoGP. É o mais jovem piloto a vencer três títulos mundiais (em quatro disputados) e já é o sexto maior vencedor de todos os tempos. Perde para Agostini, Rossi, Nieto, Hailwood e Lorenzo. Detalhe, ele participou de apenas 146 provas, contra 246 de Lorenzo e 344 de Rossi. Marc Márquez tem apenas 23 anos.

Carlos Alberto Goldani
Porto Alegre – RS

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