MotoGP – GP da França prenuncia um Déjà Vu de 2014

segunda-feira, 21 de maio de 2018 às 20:55

Marquez vence GP da França de 2018

Colaboração: Carlos Alberto Goldani

Existe um fator que prejudica todas as competições, a previsibilidade. Este ano o Mundial de MotoGP está correndo o risco de repetir as temporadas de 2007 (Casey Stoner), 2012 (Jorge Lorenzo) e 2014 (Marc Márquez), onde a grande superioridade de um piloto minou o interesse do público pela disputa do título.

O recente GP da França terminou com mais uma vitória inconteste de Marc Márquez, a terceira consecutiva em 5 etapas. Na abertura da temporada no Catar, uma pista tradicionalmente madrasta para os protótipos da Honda, a disputa entre o espanhol e Andréa Dovizioso foi literalmente até os últimos metros, com uma espetacular vitória do italiano. Em Rio Hondo valeu a sabedoria popular que todos têm um dia ruim, o campeão do mundo estava fora da casinha. Afrontou o regulamento na largada, foi extremamente agressivo na pista e recebeu três penalizações, possivelmente um recorde, a última um acréscimo de tempo calculado na medida exata para que não marcasse nenhum ponto. Depois desta prova Márquez foi alvo de pesadas críticas, algumas pertinentes, outras muito exageradas. Valentino Rossi, por exemplo, disse que Márquez estava acabando com o esporte e que temia pela própria vida ao compartilhar a pista com ele. Andrea Iannone, pasmem, um campeão de trapalhadas que se auto intitula de The Maniac, sentenciou que ele era um perigo para os outros pilotos.

Nas três provas seguintes o vencedor pôde ser apontado antes de cumprir a metade do percurso. Nesta última, na França, Danilo Petrucci, seu perseguidor mais próximo, confessou que sofreu um tipo de tortura psicológica, Márquez permitia uma aproximação e, quando ele acariciava a possibilidade de vitória, a Honda abria a distância entre eles. Houve até um “Momento Márquez”, uma quase queda aconteceu na curva três, onde o espanhol já havia caído durante os treinos, o piloto perdeu a frente e corrigiu a inclinação excessiva do equipamento apoiando o cotovelo na pista.

Explicações simplistas como o estágio atual da RC213V ser muito superior ao dos competidores não resistem a uma análise mais detalhada. A Honda participa do mundial com seis equipamentos, todos tem o mesmo motor e três, as duas motos da equipe oficial e a LCR de Cal Crutchlow, estão equipadas com o mesmo nível de desenvolvimento. Até a quinta etapa Márquez acumulou 95 pontos no mundial, todos os outros cinco pilotos (Crutchlow, Pedrosa, Morbidelli, Nakagami e Luthi) juntos somam 101, ou seja, fica explícita a contribuição do talento do piloto.

Em Le Mans Márquez foi o único no grid de largada a utilizar um composto hard no pneu traseiro. A característica deste composto é demorar algumas voltas para atingir a temperatura ideal, o que justifica os riscos maiores que os normais assumidos por Dovizioso e Zarco no início da prova, uma tentativa de abrir o máximo possível para tentar administrar no final. Ambos pecaram pelo excesso e caíram nas voltas iniciais.

O GP da França não se restringiu a mais uma vitória do campeão do mundo. A sua dilatada liderança na pontuação do mundial é distorcida por diversas ocorrências inesperadas acumuladas por seus concorrentes, como o triplo acidente em Jerez e as quedas de Dovizioso e Zarco. Atrás do líder a disputa na classificação geral é acirrada, apenas 13 pontos separam Vinales em segundo de Dovizioso em nono, com Zarco, Rossi, Petrucci, Jack Miller, Andrea Iannone e Cal Crutchlow entre eles.

Historicamente existem diversos circuitos cujas características privilegiam o projeto das Honda: Barcelona, Sachsenring, Brno, Aragon, Phillip Island e Valência, que justificam o temor dos concorrentes do espanhol. Marc lidera o campeonato por 36 pontos, vantagem inferior à que obteve no início da temporada de 2014 quando venceu as cinco primeiras provas e livrou 42 pontos. As perspectivas dos aspirantes ao título não são animadoras como resumiu Valentino Rossi: “Marc já tem uma boa vantagem, mas o que preocupa a todos é a sua velocidade na pista. Ele tem sido sempre o mais rápido, este ano vai ser complicado evitar mais um título dele”.

Depois da prova encerrada em Le Mans algumas entrevistas dos pilotos foram muito expressivas. Com uma franqueza que foge à habitual Danilo Petrucci afirmou que a Ducati estava analisando a contratação dele ou de Jack Miller, para talvez ocupar o assento de Lorenzo, olhando para os custos. Explicou que o salário de ambos é bem menor do que o do espanhol.

Jorge Lorenzo, que tem se caracterizado como o melhor largador desta temporada, justificou a sua queda de rendimento durante as provas pelo cansaço. Sua técnica de condução e a ergometria da moto não combinam, ele não consegue utilizar as pernas para apoiar o corpo durante as frenagens, todo o esforço é transferido para os braços. Esta exigência de energia muscular cobra seu custo depois de um terço da prova.

Cal Crutchlow sofreu um acidente sério na tomada de tempo e as consequências o obrigaram a passar uma noite no hospital. Seus ferimentos foram mais graves porque ele havia sofrido um acidente na FP4 e não trocou de macacão para o Q1. A queda anterior acionou o airbag, que não tinha carga para inflar e proteger o piloto na segunda queda. A presença do britânico no grid espantou a todos e sua explicação foi extremamente simples: “É o meu trabalho”.

Embora o desempenho da Yamaha tenha sido bom, inclusive com o pódio de Valentino, Maverick Vinales era um piloto infeliz. “Não sei porque meu rendimento não foi igual ao dele, acho que trabalharam melhor no box ao lado”. Qual o recado que o espanhol queria passar e para quem não ficou claro. Não é de hoje que existem boatos sobre o seu descontentamento com seu chefe de equipe, muito conservador para o seu gosto. Vinales está afirmando para a Yamaha com todas as letras que que não está satisfeito com o curso dos acontecimentos. O último GP que ele venceu faz um ano, foi na França em 2017.

Para os mais observadores as comemorações depois da bandeirada final foram significativas. No parque fechado ficou claro que, embora ambos felizes com seus respectivos resultados, Márquez e Rossi não se bicam. Ambos foram efusivos ao confraternizar com Petrucci, mas mesmo compartilhando um espaço exíguo não se aproximaram. O sentimento de desconforto entre eles ficou evidente na solenidade do champanhe, um para cada lado. Juntos e sorridentes, só nas fotos oficiais do pódio. Talvez uma entrevista de Lívio Suppo na semana anterior tenha contribuído para acirrar os ânimos.

O antigo gestor da Honda Racing afirmou que em 2015 o próprio Rossi arquivou seu sonho de ser de fato e de direito o maior piloto de todos os tempos, ao criar uma polêmica desnecessária antes da prova de Sepang. Na corrida anterior Márquez havia evitado cinco pontos a mais para Lorenzo ao o ultrapassar nos últimos metros em Phillip Island, e foi acusado por Rossi de comandar um complô junto com o conterrâneo para evitar o que seria o seu décimo campeonato. O resultado da pantomina todos conhecem, o incidente em Sepang, a penalização para Valência e a perda do campeonato. Em contraste, Gigi Dal’Igna, embora sem um piloto de fábrica no pódio, estava exultante com a performance de Petrucci, da Pramac, com uma moto idêntica às utilizadas por Dovizioso e Lorenzo. Ele considerou uma conquista da Ducati.

Carlos Alberto Goldani
Porto Alegre – RS

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