MotoGP – Do Túnel do Tempo

segunda-feira, 6 de abril de 2020 às 19:01

Marc Marquez – Derbi 125cc

Colaboração: Carlos Alberto Goldani

Domingo, 31 de outubro de 2010, chuva intermitente, um clima hostil para provas de motovelocidade. Marc Márquez, 17 anos, na temporada do Mundial de MotoGP classe 125cc já havia conquistado 9 vitórias quando alinhou para a largada na penúltima prova do campeonato, no circuito de Estoril. Na sua frente um único piloto, Nico Terol, também candidato ao título, a diferença entre ambos eram escassos 12 pontos (havia ainda 50 em jogo). Depois da largada as posições foram mantidas por seis voltas, até a prova ser interrompida por absoluta falta de condições da pista. Quando chuva parou a drenagem escoou a água acumulada no piso, na volta de retorno para o grid de nova largada Márquez caiu e danificou a carenagem da sua Derbi #93. A equipe trabalhou em um ritmo alucinado para permitir a sua volta, conseguiram, porém não a tempo de alinhar na sua posição, ele foi obrigado a largar por último, da sexta fila, 16ª posição.

Com uma pilotagem extremamente agressiva, Márquez fechou a primeira volta depois da relargada em terceiro, atrás das duas motos da equipe Aspar Aprilia, Terol na frente, seguido de seu companheiro de equipe Bradley Smith. Márquez assumiu a 2ª posição na 3ª volta, perdeu na 6ª e recuperou na 8ª.

No início da volta 9, a última, Márquez ultrapassou Terol na curva 1 e os dois trocaram duas vezes de posição durante o percurso do circuito. Márquez venceu a corrida com uma diferença de 150 milésimos de segundo, abriu 17 pontos de vantagem para a decisão do título em Valência. Pol Spargaro, que começou a corrida a 17 pontos de Márquez e matematicamente ainda tinha condições de chegar ao título, errou na escolha de pneus e classificou-se em 10º, dando adeus às suas chances. O espanhol de Cervera conseguiu a 4ª colocação na última prova da temporada e venceu o seu primeiro mundial.

Não tem como ignorar, existe uma legião de entusiastas do motociclismo que professam um fascínio quase religioso em relação a Valentino Rossi, e existem múltiplas razões para que isto aconteça, Valentino tem uma personalidade forte, faz o tipo bom moço e é o piloto em atividade o que detém o maior número de vitórias e títulos mundiais. Valentino Rossi enfileirou cinco títulos na classe principal entre 2001 e 2005, ciclo interrompido por Nicky Hayden em 2006 e Casey Stoner em 2007. Para a temporada de 2008 a Yamaha contratou Jorge Lorenzo como segundo piloto, a notícia na época foi divulgada como uma declaração da equipe que estava preparando um sucessor para o italiano, Rossi era passado e Lorenzo era o futuro. Valentino Rossi ainda venceu os campeonatos de 2008 e 2009. Um sério acidente prejudicou sua temporada de 2010 e o piloto de Palma de Maiorca, na época com 23 anos, fez uma temporada perfeita, terminou todas as corridas, conquistou 9 vitórias, 7 pódios e acumulou mais pontos (383) que qualquer outro até então na história dos mundiais. No final do ano a Yamaha propôs a Rossi manter seu lugar na equipe, desde que aceitasse um corte substancial no salário e sem o status de piloto número um. Depois de uma década como um dos esportistas mais bem pagos do planeta ele podia não precisar do dinheiro, mas seu orgulho o impedia de aceitar o que considerava uma descortesia da equipe.

Em 2011 a Repsol Honda inscreveu um terceiro equipamento para acomodar Casey Stoner em sua estrutura, juntamente com Andrea Dovizioso e Dani Pedrosa. Sem outra alternativa, Rossi decidiu aceitar o desafio de participar de uma equipe puro sangue italiana e assinou com a Ducati. A moto tinha obtido vitórias com Stoner e Capirossi nas 4 temporadas anteriores, entretanto Rossi não se adaptou ao equipamento e passou dois anos no ostracismo. Em seu retorno para a Yamaha encontrou Jorge Lorenzo já bicampeão do mundo e com a carreira consolidada. E para a maior infelicidade de Rossi, o ano de 2013 marcou a estreia de um novato na MotoGP pela equipe Honda, Marc Márquez.

O ano de 2015 é conhecido como um dos pontos de inflexão da história da MotoGP. Até então o já bicampeão mundial Marc Márquez tinha em Valentino Rossi um dos seus ídolos. Perto do final da temporada, na prova de Phillip Island, uma das mais disputadas de toda a história, quatro pilotos brigaram pela liderança, Márquez (Honda), Iannone (Ducati), Lorenzo e Rossi (Yamaha). Os dois pilotos da equipe oficial da Yamaha, Lorenzo e Rossi, eram os únicos com reais possibilidades de alcançar o título. O final da prova foi eletrizante, Márquez ultrapassou Lorenzo a duas curvas do final, Rossi perdeu a terceira posição para Iannone na última volta. Sentindo a ameaça de Lorenzo ao seu 7º mundial da principal categoria, que o colocaria em posição de igualdade com o recordista de todos os tempos Giácomo Agostini, Rossi decidiu agir também fora das pistas e acusou Márquez de participar de uma conspiração para facilitar o título de seu compatriota. O seu comportamento resultou no chamado Incidente de Sepang (Malásia), onde Rossi teria causado a queda de Márquez. A alegação que piloto da Honda não estava na disputa pelo mundial, portanto não devia disputar a vitória na etapa é ridícula, contraria a essência da MotoGP. O título da temporada ficou com Jorge Lorenzo e, apesar de ambos defenderem a mesma fábrica, gerou um ambiente quase hostil dentro do box da equipe oficial da Yamaha. O mal-estar perdurou entre os dois colegas na temporada seguinte e, no final de 2016, Lorenzo trocou a Yamaha pela Ducati.

As carreiras de Valentino Rossi e Marc Márquez evoluem em sentido inverso. Enquanto o espanhol empilha títulos e estabelece recordes de eficiência, o último mundial do italiano foi em 2009 e sua vitória mais recente em um GP oficial em 2017. Em 2019, enquanto Márquez obteve seu sexto mundial, quarto consecutivos, Rossi comandou apenas a 3ª Yamaha classificada na colocação geral, ficando atrás do seu companheiro de equipe Maverick Vinales e de Fábio Quartararo, piloto da satélite Petronas, ambos já com contratos assinados com a equipe oficial para o biênio de 2021/2022. Marc está contratado pela Repsol Honda até o fim de 2024, Rossi, apesar da promessa de dispor de uma M1 atualizada com os todos desenvolvimentos da equipe oficial, ainda não tem contrato para 2021. Razlan Razali, líder da Petronas Sepang Racing Team, equipe satélite da Yamaha, assume que está a par do desejo de Valentino Rossi e Jorge Lorenzo competirem por sua equipe, porém a sua preferência atual é apostar em pilotos jovens. A remota hipótese de uma migração para a Suzuki foi descartada por Davide Brivio, que trabalhou com Rossi na Yamaha e hoje comanda a equipe: “A prioridade é renovar com Joan Mir e Alex Rins”. Óbvio que esta é a fotografia atual. Ninguém tem ideia do que a atual pandemia pode resultar e o carisma e a capacidade do nome de Valentino Rossi em convencer patrocinadores não pode ser negligenciada. A lógica dos contratos da MotoGP é muito susceptível a fatores financeiros.

Carlos Alberto Goldani
São Paulo – SP

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