F1 – Um menino, seu herói e seus sonhos

sábado, 1 de junho de 2019 às 13:06

GP de Monaco 2019

Colaboração: Davidson Alba

Automobilismo é um esporte de sonho(s). Envolvidas com ele estão a existência de sonhos “impossíveis” de alguns, e a realização deles, para outros. Dentro desse contexto, cresci no interior do Rio Grande do Sul, em uma cidade onde não havia autódromo nem kartódromo e, mesmo que houvesse, tal esporte não seria uma opção factível. Isso não me impediu de, assim como inúmeros da minha geração, acordar cedo – de madrugada, muitas vezes – para torcer e vibrar com o maior piloto de F1 de todos os tempos, Ayrton Senna, meu herói incontestável da infância (tá, até hoje, sim) e símbolo da busca incansável rumo à perfeição e à maestria, através de dedicação e foco.

O palco-mor das apresentações espetaculares do nosso herói foi, muito provavelmente, o circuito das ruas de Monte Carlo, no GP de Mônaco. Dito isso, parece natural que, uma vez que houvesse uma oportunidade favorável, devesse vê-lo lá. Quis o destino que ele se despedisse tão precocemente daqui, mas não sem antes marcar para sempre a memória daquele menino que tinha perdido seu grande herói, do qual se lembrava claramente desde o primeiro título (eu tinha dois anos), e também do vilão francês e seu comparsa dirigente no ano seguinte. Para muitos, era o Super Man, para outros, o Batman, mas o meu era real e usava capacete amarelo. Infelizmente, não tinha superpoderes para vencer o fatal acidente na Tamburello.

Foi-se o herói, mas a paixão pelo esporte seguiu firme. Tive a felicidade de ver o fair play e o talento vencerem a maracutaia de 1996 a 1999 e depois em 2005 e 2006. A vida continuou seu rumo, mas o gosto pelo esporte a motor apenas crescia. Veio o casamento, e a esposa se vendo “obrigada” a fazer a parceria em frente à televisão para assistir NASCAR, IMSA, Fórmula E, WEC, IndyCar e tudo mais que tivesse quatro rodas sobre o asfalto em alta velocidade. Ao desejo dela de conhecer a Côte d’Azur, uni meu antigo – mas muito vivo – sonho de ir ao GP onde o Chefe era Rei.

Sobre a pista…

Iniciou ali uma maratona online, para obter informações que nos servissem à concretização do “projeto” de ir a Monte Carlo. Não tinha nenhum amigo, nem um conhecido mais próximo, que tivesse estado lá em um race weekend e pudesse me ajudar. Em meio aos fóruns, blogs e afins, apelei ao Adauto Silva, que prontamente me respondeu com tudo que podia me ser útil, do que ele sabia a respeito. Tínhamos tido uma experiência extremamente negativa na Fórmula E em Punta del Este, onde tive que assistir à corrida sozinho – não quis fazê-la passar pelo que passaria (passei), debaixo de sol forte e com uma péssima visão da pista, sem lugar nenhum para sentar. Claramente não havia arquibancadas suficientes para os ingressos vendidos, e não se conseguiria acomodar todas as pessoas na infra-estrutura alternativa existente. Isso sem falar que não era ofertada oficialmente nenhuma entrada “premium”, que proporcionasse uma experiência mais confortável, digamos assim.

Após uma análise minuciosa de todos os detalhes, relacionados desde a acomodação, à visão do(s) eventos de pista, até mesmo à disponibilidade de bebidas e alimentação, escolhi o Beau Rivage como local onde ficaríamos. Teríamos a visão da Ste. Devote, da subida toda em direção à Massenet, da reta antes da Tabacaria e dos esses da piscina, além de dois telões que nos mostrariam tudo que não víssemos a olho nu. Além disso, comida e bebida estariam inclusas, o que evitaria custos adicionais imprevistos e o risco de perder uma boa vista, quando saíssemos em busca do que comer e beber. Pelas informações e imagens do site oficial da F1, supus que as alternativas talvez não tivessem uma visão ao mesmo tempo panorâmica, mas próxima da ação de pista. Tais informações vieram ao encontro dos relatos de outras pessoas que estavam vendo a corrida conosco no prédio, que já tinham ficado em camarotes e terraços outros que, apesar do “glamour”, não proporcionavam tanto aquelas sensações de ouvir o barulho dos carros passando perto, ou os cheiros de gasolina e borracha queimada, tão agradáveis para quem ama automobilismo!

Três paixões em uma foto…

Na sexta-feira fomos pegar os ingressos junto à organização com outro casal de brasileiros, que conhecemos no trem (quase todo mundo fica em Nice e vai a Mônaco de trem, o que leva aproximadamente meia hora) – fizemos em casa um trato de irmos apenas no domingo à F1, pois os outros dias estariam a cargo da programação turística, embora eu aconselhe o contrário, que vão ao circuito todos os dias -, então aproveitamos para conhecer o principado propriamente dito. De quebra, pelas arquibancadas serem liberadas na sexta, assistimos à F2 do Grandstand K – entre a Tabacaria e os esses da piscina, uma bela vista, com a vantagem de exibir a saída do túnel e a Nouvelle Chicane -, uma caminhada pelos boxes e uma volta a pé pela pista toda, no melhor estilo Frank Williams pré-1986! A cada trecho da pista, a lembrança de uma manobra do Chefe, das muitas corridas e vídeos “devorados” em documentários, filmes e nos streamings disponíveis na internet. Só entre o Casino e a Mirabeau alta que quem roubou a atenção foi a lembrança da ultrapassagem do Stefan Bellof sobre René Arnoux em 1984, o grande rival que Senna infelizmente não teve. No túnel, foi difícil conter a emoção de pisar no asfalto cujo Rei o conquistou de Lotus e McLaren, especialmente naquela parte tão veloz da pista!

A volta a pé foi interrompida por uma pausa relativamente longa na Rascasse, onde uma festa muito animada acontecia, próxima de outras no mesmo estilo, no clube que dá nome à curva – coisa que demorei muitos anos para descobrir.

No domingo, madrugamos para não perder nada. Chegamos antes do horário de abertura da acomodação, mas os funcionários nos receberam de forma muito gentil e acolhedora. Devidamente a postos, pudemos apreciar as batalhas da Porsche Supercup, ouvindo o ronco maravilhoso dos motores boxer, com os pilotos saltando sem cerimônia na zebra do segundo S da piscina. Após um intervalo para voltas rápidas de convidados e clientes da Ferrari, a bordo de 488s, foi a vez de curtir a Fórmula Renault e prestigiar nosso compatriota Caio Collet, que vem fazendo bonito.

Brasil !!

Depois de mais voltas rápidas e do desfile dos pilotos em homenagem ao grande Niki Lauda, finalmente o tão esperado momento. Ver e ouvir de perto o ápice do automobilismo. Desde o warm-up, chama a atenção a diferença de velocidade não só em reta, mas principalmente nas curvas, em relação às outras categorias.

Passamos praticamente toda a corrida na expectativa por uma disputa mais “quente” pela liderança, mas que se resumiu a uma tentativa do Verstappen na Nouvelle Chicane. Restou-nos admirar a vitória de Lewis Hamilton “sem pneus”, dedicada a Lauda, numa bela atitude. Aí já era hora de enfrentar o “engarrafamento” de pessoas na entrada da estação de trem, que não deve ser subestimado!

Enfim, aqui fica o relato da experiência de um menino, que pôde finalmente realizar um dos seus mais distantes sonhos. Espero que possa ser útil àqueles que pretendem ir ao GP de Mônaco, mas não sabem por onde começar, que nem eu estive ano passado, ou despertar em outros o desejo de visitar um evento tão emblemático.

Davidson Alba
Santa Maria – RS

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