F1 – Realidade virtual é uma realidade na Fórmula 1

quinta-feira, 18 de novembro de 2010 às 13:26
Pat Symonds

As simulações por computador são uma das tecnologias mais incríveis da Fórmula 1 moderna. Sentados em suas salas, diante de inúmeros computadores, os engenheiros da equipe Renault F1 podem calcular velocidades, pontos de frenagem, estratégias e acerto de carros ainda em desenvolvimento, até mesmo em autódromos que ainda nem estão prontos.

Uma das tecnologias mais impressionantes empregadas na Fórmula 1 encontra-se trancada entre quatro paredes. Na sede da equipe Renault F1, por exemplo, avançados computadores são capazes de antecipar o comportamento, velocidade e as forças que trabalharão sobre os carros da equipe em qualquer pista – mesmo nas que os carros jamais estiveram. Com isso, é possível antever como será o acerto para um novo traçado, o que facilita muito o trabalho dos engenheiros e pilotos durante o fim de semana de corrida. Atualmente, a escuderia Renault F1 trabalha na simulação do Grande Prêmio da China, que será realizado no dia 26 de setembro.

Veja por exemplo o que aconteceu com o novo circuito de Bahrain, a primeira pista do mundo árabe visitada pela principal categoria do mundo. Alguns meses antes de as equipes embarcarem para aquele país, o autódromo ainda era um grande canteiro de obras. A pista não passava de uma faixa desenhada na areia, serpenteando entre as fundações dos prédios que eram erguidos pelos tratores e guindastes. Ainda assim, os computadores da Renault F1 já trabalhavam com números e estatísticas relacionados ao traçado. Naquela época, até mesmo o novo modelo R24 só existia em realidade virtual. Mas a equipe já havia calculado sua velocidade em cada curva, produzindo uma precisa estimativa de tempo de volta e estabelecendo uma detalhada estratégia de corrida.

O diretor-executivo de engenharia da equipe Renault F1, Pat Symonds, explica como foi possível calcular tais detalhes se tanto o carro quanto a pista ainda não passavam de idéias e conceitos em construção: “Para nós, o desafio começou em novembro”, adianta ele. “Tinha que ser assim, pois certas peças, como as relações de câmbio, exigem um período extra de oito semanas para serem calculadas e produzidas. Assim, começar a trabalhar o quanto antes era imprescindível”.

Mas que tipo de informação se pode utilizar para calcular as reações do carro na pista? “A primeira ação é obter um mapa perfeito do autódromo”, explica o engenheiro. “A partir deste documento, o traçado de curva ideal pode ser calculado em três dimensões de forma a determinar o mais precisamente possível como o carro se moverá naquele espaço. Em relação a Bahrain, nosso trabalho foi especialmente complicado pelas várias modificações que foram feitas no desenho da pista.”

Foi somente quando a FIA (Federação Internacional de Automobilismo) publicou um mapa definitivo que os engenheiros conseguiram fazer os cálculos finais. “Então, pudemos definir o traçado do carro dentro do desenho da pista. A partir disso, começamos a levar em conta parâmetros relativos ao carro propriamente dito”, completa Symonds.

“Com as características do R24 em mãos, inserimos no computador dados que corresponderiam a um acerto básico. Isso feito, pudemos calcular o uso de vários tamanhos de asa e de diferentes relações de marcha para ver como eles afetavam o tempo de volta. Estes cálculos nos levaram a selecionar a combinação mais eficiente, que seria levada para o autódromo para a corrida”.

Aos poucos, os engenheiros passaram a examinar pequenos detalhes. Foi durante esta fase que ajustes de suspensão, distribuição de peso e características de frenagem foram colocados na equação computacional. Os resultados permitiram que se definissem as especificações dos pneus ideais para o carro em relação àquele circuito. Depois disso, a fim de estabelecer a melhor estratégia de corrida, foram analisados o consumo de combustível do motor V10, os possíveis pontos de ultrapassagem e o tamanho da pista de rolagem dos boxes. Até que a equipe partisse para Bahrain, o grupo de engenheiros responsável pelas simulações estudou milhares de cenários possíveis para a corrida.

Quando faz simulações como esta, a equipe Renault F1 utiliza toda informação disponível. Mas alguns itens imponderáveis podem complicar o trabalho. A primeira variável surge quando se tenta considerar o nível de aderência do piso – algo que só se pode estabelecer com mais precisão quando os carros estão na pista. De fato, este parâmetro varia constantemente: em 2003, ele oscilou em até 15% da sexta-feira para o domingo da corrida.

Autódromo de Xangai

“Para se ter uma idéia de como isso afeta nosso trabalho basta dizer que uma variação de 3% representa quase um segundo de diferença”, explica Pat Symonds. Outro elemento difícil de especificar são as zebras: seu formato e o fato de alguns pilotos as usarem em uma volta e na outra não, fazem com que os tempos de volta possam variar bastante, afetando muito o cálculo do acerto do carro.

Além disso tudo, há elementos específicos de cada circuito que são capazes de dar muita dor de cabeça aos engenheiros responsáveis pelas simulações. Em Bahrain, por exemplo, o fato de a pista ser localizada no deserto conduz ao problema da areia trazida pelo vento. E, se considerarmos que o vento não é um fator constante, conclui-se que os níveis de quantidade de areia também são difíceis de calcular. Elementos como a chuva (comum no Brasil), quedas bruscas de temperatura geradas por frentes frias (normais em algumas pistas européias) e alteração na direção do vento também afetam muito os resultados na pista.

Traçado de Xangai

No caso da areia do Bahrain, a saída foi fazer cálculos com diversos níveis de aderência do piso: “Em cada simulação, usamos o acerto mais eficiente para cada caso”, explica o engenheiro. “Este trabalho feito na fábrica visa eliminar a perda de tempo durante o fim de semana de corrida no caso de os níveis de aderência mudarem radicalmente – e, na pista, o que menos temos é tempo para perder. Caso as simulações sejam precisas – e elas costumam ser –, nosso trabalho é apenas de fazer o ajuste fino de seus cálculos para ganhar os décimos de segundo que fazem a diferença entre uma péssima colocação e uma pole position”.

Seis meses diante do computador …

Cronograma da simulação
para o GP de Bahrain
Data Atividade
Setembro/2003 Análise dos primeiros mapas recebidos
Dezembro/2003 Primeira simulação
Dezembro/2003 Chegada do mapa definitivo do circuito
Dezembro/2003 Início da simulação de estratégia
Janeiro/2004 Seleção da relação de marchas
Janeiro/2004 Início do trabalho no acerto do carro
Fevereiro/2004 Definição do acerto básico
2 semanas antes do GP Aplicação dos dados no carro da corrida

Telemetria

Uma volta em Bahrain

Este gráfico é uma simulação de volta feita para o novo circuito do Bahrain. Ela foi produzida antes mesmo de a pista estar pronta e mostra (de cima para baixo) a velocidade da roda, aceleração lateral (força G nas curvas), posição do pedal do freio e o nível de stress enfrentado pelos pneus. Este documento é uma ferramenta de trabalho indispensável para avaliar a eficiência das mudanças feitas no acerto.

(14/04/04)

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