F1 – O fator clima

sexta-feira, 18 de novembro de 2016 às 12:37
Senna aplica um olé em Damon Hill - Interlagos 1993

Senna aplica um olé em Damon Hill – Interlagos 1993

Colaboração: Carlos Alberto Goldani

Tanto quanto o piloto, a chuva foi protagonista na segunda e última vitória de Ayrton Senna em Interlagos, no GP do Brasil de 1993. As Williams de Alain Prost e Damon Hill dominaram os treinos, a pole do francês foi quase dois segundos mais rápida que o tempo do brasileiro. Durante a prova, na volta 24, Senna foi penalizado com um “Stop and Go” de dez segundos por manobra arriscada em uma ultrapassagem sobre Erik Comas e caiu para a quarta colocação. O domínio das Williams Renault mudou radicalmente quando começou a chover na volta 27, duas voltas depois Christian Fittipaldi rodou com sua Minardi em plena reta, Prost que vinha em seguida e ainda não havia trocado para pneus de chuva, também perdeu o controle e acabou fora da pista. Damon Hill herdou a primeira colocação e, mesmo com um carro melhor, foi alcançado e ultrapassado por Senna na subida do Laranjinha. Foi uma jornada épica de Ayrton Senna, e comprova a assertiva que, em condições adversas, o talento do piloto compensa as vantagens técnicas dos concorrentes.

Poucos entenderam as razões de Michael Schumacher ao trocar a Benneton pela Ferrari no final de 1995. Em 1996 o então bicampeão da Fórmula 1 não pontuou em três das seis primeiras corridas, Damon Hill e Jacques Villeneuve dominavam a temporada com os Williams Renault, os melhores carros nas pistas, os F310 da Ferrari – jocosamente chamados de “banheirão” – em condições normais não eram páreo para os FW18 da equipe britânica. O GP da Espanha em Barcelona, sétima corrida da temporada, foi realizado com a pista em péssimas condições. O clima chuvoso nivelou os carros e o talento do alemão fez a diferença. Depois de uma largada complicada, beneficiado por diversas saídas de pista de vários pilotos, Schumacher assumiu a ponta na décima terceira volta e abriu 45 segundos em relação ao Benetton de Jean Alesi, que terminou em segundo. Foi a primeira de uma longa série de vitórias de Schumacher pela equipe do Cavalinho Rampante.

A chuva também foi responsável por um dos GPs mais caóticos da história, em 1975 na pista de Silverstone, prova que ficou marcada pela última vitória de Emerson Fittipaldi na F1. O resultado só foi homologado duas horas depois do encerramento e registrou em uma dobradinha brasileira, Fittipaldi em primeiro e José Carlos Pace em segundo lugar. Toda a confusão ocorreu pela inconstância do clima, houve uma pancada d’água de curta duração na volta 19, como na época a troca de pneus demorava mais de dois minutos, Emerson decidiu ficar na pista abrindo uma grande vantagem. Na volta 55 a chuva voltou mais intensa, o piso ficou impraticável e as áreas de escape foram transformadas em estacionamento compulsório dos carros que não paravam na pista. Emerson estava nos boxes trocando pneus quando a prova foi encerrada, ele não recebeu a bandeirada final. Depois de muita discussão e informações desencontradas, a colocação da volta 56 foi considerada como resultado final. O registro oficial confirma o caos estabelecido, Emerson com 56 voltas em 1 hora, 22 minutos e 5 segundos, os quatro seguintes, José Carlos Pace, Jody Scheckter, James Hunt, Troy Donahue tem a palavra “acidente” no lugar do tempo de prova e o sexto colocado, Vittorio Brambilla, uma volta a mais. Quando a corrida foi interrompida, Emerson estava nos boxes e só havia cinco carros circulando pela pista.

Nuvens negras não foram suficientes para obscurecer a estrela de Ayrton Senna no início de sua carreira na F1. Sua primeira vitória, que poderia ter sido com um Toleman no GP de Mônaco em 1984, aconteceu com um Lotus no circuito do Estoril no ano seguinte. A conquista da pole para a largada da prova foi realizada com pista seca, a equipe Lotus utilizava um carro especial só para a classificação, construído no limite do regulamento, procedimento permitido na época. Chovia no dia da prova, Senna, abriu 30 segundos de vantagem sobre os outros carros nas primeiras 20 voltas. Quando recebeu a bandeirada final estava mais de um minuto na frente do segundo colocado, a Ferrari de Michele Alboreto, e uma ou mais voltas na frente de todos os demais. O desempenho do brasileiro na corrida de Portugal alterou o comportamento das tradicionais casas de jogos de Londres, sempre que a previsão para a disputa de um GP era chuva, apostas em Senna não eram aceitas.

A temporada de 1993 foi complicada para a McLaren, o motor Ford, que substituiu o Honda, não tinha desempenho suficiente para acompanhar os Renault da Williams. Nestas condições só um fator externo poderia equilibrar a disputa, e foi o que aconteceu no GP da Europa, a única corrida da história da F1 disputada no circuito de Donington Park. Ayrton Senna conseguiu a quarta colocação no grid e a largada foi autorizada com chuva. O que se viu a seguir é classificado pelos especialistas em automobilismo como “A melhor primeira volta da história da F1”, Senna contornou a primeira curva em quinto lugar e, sucessivamente, ultrapassou o Benetton de Michael Schumacher, o Sauber de Karl Wendlinger e os Williams de Alain Prost e Damon Hill, assumindo a liderança antes de completar a primeira volta. No final da corrida, Senna cruzou a linha de chegada 1 min e 20 seg à frente de Damon Hill, todos os outros ficaram uma ou mais voltas atrás.

O recorde de GP mais curto da F1 pertence ao Grande Prêmio da Austrália, encerramento da temporada de 1991 no circuito de rua de Adelaide. O título de campeão da temporada estava definido desde o “acidente” de Senna com Prost na prova anterior no Japão. O piloto francês fez pesadas críticas à equipe Ferrari e não foi autorizado a competir. Circuito de rua significa drenagem limitada e quase ausência de áreas de escape, a chuva torrencial acumulou água na pista e fez diversos carros rodarem em plena reta nas primeiras voltas. Na prova, cuja largada nunca devia ter sido autorizada, a falta de visibilidade provocou um acidente entre Schumacher e Jean Alesi na volta 5, tirando os dois da corrida. Em seguida o Benetton de Nélson Piquet aquaplanou e girou 360 graus, o piloto com extrema perícia controlou o carro e conseguiu voltar para a pista sem perder seu quarto lugar. A prova foi interrompida na volta 16, depois de Nigel Mansell, Gerhard Berger e Nelson Piquet, respectivamente segundo, terceiro e quarta colocados, perderem o controle de seus carros no piso alagado. A bandeira vermelha foi acionada e, posteriormente, a prova encerrada com a classificação retroagindo a volta 14 (de um total previsto de 81), a vitória ficou com Ayrton Senna, um dos poucos que conseguiram permanecer no circuito. Nigel Mansell não participou da cerimônia de premiação, estava sendo atendido em um hospital devido ao seu acidente na prova.

Jenson Button protagonizou em Montreal, no GP do Canadá de 2011, uma proeza difícil de ser igualada. A largada foi com realizada com os carros em movimento (Safety Car) e logo que a corrida foi liberada, Button colidiu com o companheiro da equipe McLaren, Lewis Hamilton, provocando nova entrada do carro de segurança. Logo depois, devido à chuva intensa, a prova foi suspensa. Após quase duas horas de espera, a corrida recomeçou e Button enroscou-se com Fernando Alonzo, o espanhol ficou fora e o britânico caiu para o último lugar. Com uma recuperação fantástica, Button escalou posições, encostou nos líderes e ultrapassou o terceiro colocado Michael Schumacher e o segundo Mark Webber faltando poucas voltas para o final. Na última volta o líder Sebastian Vettel cometeu um erro e Button assumiu a ponta. Uma vitória impressionante em um GP inesquecível.

O GP da Malásia está no calendário a quase duas décadas e o circuito de Sepang já hospedou sua cota de “Wet Races”. Em 2009 as condições do clima retardaram a largada para as 17:00hs (horário local), um risco assumido pela direção de prova que excluía qualquer tipo de contratempo, caso contrário a prova não teria condições de ser concluída por falta de luz natural. Infelizmente aconteceu, caiu um temporal sobre o circuito e o diretor acionou a bandeira vermelha (interrupção) na volta 33. A chuva não cedeu, a corrida não foi reiniciada e Jason Button foi proclamado vencedor. A mudança do horário de início prejudicou as grades de programação das emissoras de TV e causou múltiplos transtornos para os organizadores.

Uma esperteza custou caro para a Ferrari no GP do Japão em 2007. Seus dois pilotos, Felipe Massa e Kimi Raikkonen, ainda tinham condições de conquistar o mundial de pilotos. Após a largada em movimento com o carro de segurança na pista, os carros da equipe italiana foram obrigados a um pit stop para trocarem de pneus, o regulamento exige componentes para chuva extrema nestas ocasiões e a equipe decidiu utilizar compostos intermediários. Ainda durante a corrida Mark Webber da Red Bull sentiu um desconforto estomacal, reduziu muito a velocidade e acabou sendo abalroado por seu colega de equipe Sebastian Vettel, eliminando ambos da competição. Depois de uma prova repleta de incidentes, o piloto mais bem-comportado na pista, Lewis Hamilton, venceu, o Renault de Heikki Kovalainen ficou com o segundo lugar e um surpreendente Kimi Raikkonen em terceiro.

Corridas de rua com chuva são sempre um problema, se for em Mônaco é ainda mais complicado. Em 1982 um único carro recebeu a bandeirada final. Começou a chover no circuito nas voltas finais da prova e, faltando 3 voltas, o líder Alain Prost perdeu o controle e bateu em um guard rail. Ricardo Patrese, que vinha a seguir, rodou na volta seguinte, na sequência Pironi sofreu pane seca e Andrea de Cesaris também parou por falta de combustível. A última volta foi aberta por Derek Daly que apresentou problemas com o câmbio e também foi obrigado a parar. Arrastando-se pela pista, com a suspensão avariada, Ricardo Patre se foi o único a receber a bandeirada final e, como não havia mais pilotos com condições na pista, Pironi e De Cesaris completaram o pódio.

A equipe Jordan conseguiu apenas quatro vitórias na Fórmula 1, três em condições adversas de clima, a mais emblemática na Bélgica no circuito de Spa-Francorchamps em 1998. A largada foi autorizada com uma chuva fina, não houve problemas no grampo (La Source), porém na descida para a Eau Rouge o spray levantado pelos carros não permitiu visualizar direito o que aconteceu, David Coulthard foi tocado por trás, atravessou-se na pista e provocou um dos maiores acidentes já ocorridos na F1, envolvendo, além do escocês, treze outros pilotos, incluindo os brasileiros Rubens Barrichello, Pedro Paulo Diniz e Ricardo Rosset. A prova foi interrompida para remoção dos carros acidentados e detritos espalhados na pista. Na relargada, Barrichello, Rosset e outros dois pilotos não estiveram no grid por falta de carro-reserva, todos foram mais cuidadosos, ainda assim um toque de Johnny Herbert tirou da prova o finlandês Hakkinen, que liderava o mundial de pilotos. Na volta 25 Schumacher aquaplanou ao sair do trilho para colocar uma volta sobre a McLaren de David Coulthard, bateu e quebrou a suspensão ficando com apenas três rodas. O incidente provocou revolta no alemão, que interpretou o ocorrido como um trabalho de equipe para prejudicar sua disputa com Hakkinen. Muito tempo depois, em 2003, o escocês reconheceu que poderia, se quisesse, ter facilitado a ultrapassagem. No final da prova os dois carros da Jordan lideravam em uma dobradinha inesperada, Ralf Schumacher ainda tentou sem sucesso ultrapassar o companheiro de equipe, porém a vitória ficou com Damon Hill.

Carlos Alberto Goldani
Porto Alegre – RS

Quer ver todos os textos de colaboradores? Clique AQUI

Os artigos publicados de colaboradores não traduzem a opinião do Autoracing. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate sobre automobilismo e abrir um espaço para os fãs de esportes a motor compartilharem seus textos com milhares de outros fãs.

AS - www.autoracing.com.br

Tags
, , , ,

ATENÇÃO: Comentários com textos ininteligíveis ou que faltem com respeito ao usuário não serão aprovados pelo moderador.