É preciso mais do que um Alonso

quarta-feira, 25 de maio de 2011 às 15:49

lar-espanha11-615

Largada do GP da Espanha de 2011


Conteúdo patrocinado por: selopatrocinio

Esse Grande Prêmio da Espanha gerou as mais opostas opiniões. Para alguns, eu entre eles, foi uma boa corrida, com ultrapassagens e intensas disputas roda a roda. Para outros, e são muitos, não foi nada disso, já que a vitória foi mais uma vez do Sebastian Vettel e seu Red Bull voador. Para estes, o campeonato já está decidido.

Insisto que ainda é muito cedo para isso. E a evolução da McLaren está aí para não me deixar mentir.

Há também aqueles para quem só o que interessa é vitória de brasileiro. Aí, sou obrigado a concordar que, sob este aspecto, a cena não é muito promissora.

Mas acho que isso não tira a graça do GP da Espanha, não tira mesmo.

O circuito de Barcelona me parece marcado pela sua fama de pior GP do ano. De fato, nos treinos livres, os carros mal entravam na pista. Claro, já sabiam de cor e salteado tudo que precisavam fazer, porque Barcelona é a pista preferida para todos os testes; por um lado pelo clima sempre mais ameno da Catalunha, por outro, porque a reta longa seguida por curvas quase sempre velozes privilegia a eficiência aerodinâmica – o aspecto mais importante para engenheiros e pilotos. Neste ano, porém, a pista espanhola tinha uma outra função; mostrar se o KERS, as asas móveis e os pneus de curta duração melhoram ou não o espetáculo. 

Pois não se pode negar que, dessa vez, o GP da Espanha foi muito melhor. A começar pela primeira sessão de treinos livres. Mal se abriram os boxes, foi um verdadeiro enxame na pista. À frente de todos, os dois McLaren, que precisavam avaliar as 10 a 12 inovações levadas para a Catalunha. Quase um carro novo, um modelo B. O desafio seria fazer todas estas mudanças funcionarem entre si, e a qualidade da engenharia da equipe inglesa fez tudo funcionar a contento. Mesmo levando em contra o novo pneu duro que a Pirelli levou, tentando aumentar sua durabilidade.

O novo pneu, que conservou o método de construção de seu antecessor mas recebeu nova composição química, não foi lá muito bem recebido. No fim do primeiro dia, Lewis Hamilton descascou o novo PZero sem dó nem piedade: “É um desastre. É dois segundos mais lento que o macio e dura quase a mesma coisa. Como se não bastasse, faz as rodas traseiras saírem desesperadamente”. Cala-te, boca. No domingo, foi com esses “desastres” que o boquirroto piloto da McLaren fez a melhor volta da corrida…

Imagina se fossem bons. Além de fazer a volta mais rápida, Hamilton cruzou a linha de chegada a menos de 0s7 do Vettel. Nunca ele tinha andado tão perto da liderança neste ano. Seu companheiro Jenson Button foi o terceiro, mesmo tendo transformado seu discreto quinto lugar no grid em um desastroso 11º no fim da primeira volta. Nas 63 que se seguiram, Button, sem alterar seu estilo suave, deu um show de ultrapassagens, várias delas sem nem recorrer ao artifício da asa móvel.

Eu, na verdade, achei que Hamilton ganharia a corrida, principalmente quando, a 12 voltas do fim, a Red Bull alertou Vettel de que não poderia usar mais o KERS. Ora, os nove quilômetros a mais de velocidade final que tinham os McLarens sobre os Red Bulls deveriam ser suficientes. Não eram. Sabem por quê? Porque a sétima marcha do Hamilton era curta demais para aproveitar a vantagem da asa móvel. O motor atingia o limitador de rotações no meio da reta e a velocidade parava de crescer. O sonho acabou quando faltavam seis voltas e a Red Bull permitiu que Vettel voltasse a usar o KERS. O problema era de refrigeração, e algumas voltas de inatividade bastaram para que os 80 cavalos voltassem a ficar disponíveis.

Concordo que a corrida merecia um final mais disputado, uma batalha digna do que estão guiando Hamilton e Vettel. Claro que ia ser difícil para a McLaren. A vantagem dos Red Bull na longuíssima curva Três e na velocíssima curva Campsa era esmagadora. Para dar uma idéia, todos carros fazem a Campsa em quinta marcha de pé no fundo, menos os Red Bull. Para eles, é em sexta, também de pé no fundo. Foi aí que a ultrapassagem do Hamilton sobre o Vettel virou sonho? Ou será que foi quando o motor batia nos 18 mil giros no meio da reta e o limitador entrava em ação? Só Deus sabe.

Aliás, só Deus para ajudar a Ferrari. A coisa foi tão ruim que, dois dias depois, o diretor técnico Aldo Costa foi mandado plantar batatas, tamanho o pepino que é essa tal 150º – um desfecho inevitável para um fim de semana hortifrutigranjeiro, em que ficou absolutamente claro que o Ferrari F150º é um abacaxi. Só um item se salvou na Ferrari neste fim de semana: Fernando Alonso. O espanhol esteve em seus melhores dias. A volta de classificação no Q3 deveria ser assinada e exposta no Museu do Louvre, uma obra de arte. A seu lado, a largada e as primeiras 19 voltas. As outras 47, deixa para lá. Não dava mesmo para fazer muita coisa. Mas só isso já valeu a extensão de seu contrato até 2016, o prazo que ele estabeleceu para encerrar sua carreira.

Mas vai ser necessário melhorar muito para que Alonso conquiste um título de campeão vestido de vermelho. E uma questão que exige correção urgente é a estratégia de pneus. Já era sabido que, com os novos duros, a Ferrari sofreria mais do que as outras. Principalmente depois da FIA abolir a tal nova asa traseira levada para Barcelona. Ela foi vista pelos concorrentes como um descaramento. No topo da asa, repousavam duas cantoneiras (Gurney Flaps no jargão das corridas) que ultrapassavam nada menos de 30 milímetros o limite de altura. Isso, três enormes centímetros. A ousadia custou caro. Depois de trabalhar nas duas sessões da sexta-feira com essas asas, Alonso falou em um ganho de 0s10 a 0s15 por volta, vantagem que o teria colocado à frente de Hamilton na classificação. Mas, na manhã do sábado, veio a ordem de tirá-las. A única solução foi usar as mesmas da Turquia. E correr atrás do prejuízo na terceira sessão de treinos livres, a última antes da classificação. Que só dura uma horinha.

Mesmo assim, Alonso fez o que fez e conquistou a quarta posição no grid. Não foi pouco. Naquela volta, ele chegou a superar um McLaren – e finalmente se livrou do quinto lugar em que começou todas as corridas anteriores deste ano. E completou a obra prima com uma largada magistral. E não foi nem no pulo que ele conseguiu a primazia. Aproveitando a distância do grid até a curva Um, maior do que em outras pistas, Alonso pegou o vácuo do Mark Webber, que havia largado na pole, se espremeu todo para passar por uma brecha que se estreitava a cada metro e tomou a ponta de forma surpreendente. Eu até esperava que alguém fizesse isso, devido à inferioridade do KERS dos Red Bull, mas meu candidato era o Hamilton, que largava em terceiro, no lado limpo da pista, e não o Alonso, que alinhou no lado empoeirado, onde não se consegue tanta tração.

Tudo isso tornou ainda pior a comparação entre ele e Felipe Massa. Hora nenhuma na Espanha – e em poucas nas outras pistas visitadas neste ano – Massa e seu engenheiro Rob Smedley conseguiram tirar do carro tudo que ele pode dar – mesmo que este tudo seja bem pouco. O único momento em que ele ficou perto do Alonso foi no treino livre do sábado: apenas 0s052. Mas o Q3 foi dramático. Trecho por trecho, a maior diferença entre eles foi no segundo, que vai da freada da curva Três até a freada da 10 e inclui as importantíssimas curvas Três e Nove, 30s864 para Alonso e 31s248 para Massa, uma diferença de quase 0s4. Daí para a frente, estava claro que não havia esperança. Nem mesmo uma boa largada do brasileiro, como às vezes acontece, mudaria o quadro. Saindo em oitavo, tchau e benção.

E foi o que aconteceu. Na primeira fase, Felipe largou e ficou em oitavo; depois de encerrada a primeira série de pit stops, ficou em nono; após a segunda rodada, chegou a sexto; na terceira fase, quando colocou os fatídicos pneus duros, voltou a oitavo, onde ficou até o câmbio quebrar. Para ilustrar a dificuldade, uma rodada com os pneus duros, talvez causada pelas dificuldades com o câmbio, talvez pela completa inadaptação do carro aos pneus duros. Foi muito pouco. Sua maior, e única esperança, é uma mudança do quadro em Mônaco, aonde a Pirelli levará os pneus macios e os ainda inéditos supermacios. As ruas de Monte Carlo mostrarão até que ponto o problema é a dureza dos pneus.

Mas também será preciso superar as ininteligíveis escolhas táticas da Ferrari. Foi por elas que Alonso, mesmo chegando em quinto, tomou volta dos líderes. Ora, vejamos: estava claro, desde a sexta-feira, que a Ferrari sofreria bem mais que as outras com os pneus duros. Então, a lógica seria reduzir ao máximo o número de voltas nesses pneus, certo? Para os estrategistas da Ferrari, não. O certo, segundo eles, foi chamar o Alonso e o Massa na mesma volta dos Red Bull e do McLaren do Hamilton. Assim, Alonso parou na nona e na 19ª voltas, menos do que suportavam seus pneus macios, e daí para a frente teve de se virar com os pneus duros, que impunham uma perda de até três segundos por volta em relação a Vettel e Hamilton. Não seria melhor ter usado os macios por mais algumas voltas? Provavelmente seriam apenas mais quatro ou cinco, mas seria a tática da Ferrari, não a cópia da da Red Bull.

A situação chegou a causar constrangimento para a Ferrari, levianamente acusada de espionar a Red Bull pelo homem forte da equipe austríaca, Helmut Marko. Isso porque em todas as vezes em que os mecânicos de Webber se preparavam para a parada de seu piloto, a Ferrari mandava Alonso entrar na frente dele. Assim foi nas voltas 10, 19 e 29. Na 39ª, a Red Bull mandou seus mecânicos se prepararem, mas, quando Alonso mergulhou na pista dos boxes, o australiano seguiu em frente impávido. Só foi parar oito voltas depois. Nessa manobra, Webber ganhou a quarta posição, que Alonso defendera até ali com unhas e dentes. Chegou até a travar com Webber uma disputa que mais parecia corrida de dragsters, os dois emparelhados na saída dos boxes. Não adiantou. A estratégia da Ferrari, que na verdade era a da Red Bull, não funcionou.

A melhor volta de Alonso foi a 22ª, a terceira com seu melhor jogo de pneus macios, 1min28s737. Depois da última parada, a tal em que levou bola nas costas da Red Bull e teve de antecipar os uso dos pneus duros, só conseguiu fazer três abaixo de 1min30s – a melhor delas em  1min29s817. 

Isso tudo sem se contar a duração de cada parada, quesito em que Red Bull, McLaren e Mercedes batem amplamente a Ferrari. A mais rápida deste fim de semana, incluindo-se o percurso da entrada à saída da pista dos boxes, foi da Mercedes, que liberou Nico Rosberg em 19s534. A melhor da Ferrari foi do Alonso, 20s278. Há quem aponte o dedo para as porcas usadas pela Casa de Maranello. Faz sentido. As rodas são feitas de magnésio; os eixos, de aço ou titânio; as porcas, de titânio ou alumínio. A diferença de dilatação destes materiais pode dificultar a substituição das rodas. Mas investir nisso apenas para ganhar alguns décimos por parada? Pode parecer pouco, mas é imperioso evitar a qualquer preço a terrível ameaça de retornar à pista atrás de carros mais lentos.

Rubens Barrichello foi um dos que passou por esse problema. Largando em 19º por causa de um câmbio quebrado, optou por começar a corrida com pneus duros. Chegou a 17º e na 11ª volta parou para colocar um de seus três jogos de pneus macios novos. Mas uma porca travada na roda traseira direita lhe custou nada menos de 29s936 e o jogou para o 24º e último lugar. Em uma pista em que as ultrapassagens ainda são difíceis e sem poder contar com o KERS um problema ainda sem solução nos Williams, não teve o que fazer. Preso atrás dos carros mais lentos, via seus pneus se degradarem pela perda de pressão aerodinâmica. Quando, enfim, se livrava deles, os pneus estavam gastos e se impunha uma nova troca. Quando voltava à pista, adivinha quem estava à sua frente? Ainda fez a segunda melhor volta da prova na 60ª passagem, quando já usava pneus duros. É legítimo pensar que, com os macios, teria sido mais rápido. Uma indicação de melhora para Mônaco? Difícil. Se em Barcelona a aerodinâmica impera, nas ruas de Monte Carlo quem manda é a potência. Com aquele motorzinho chocho da Cosworth, vai precisar de muita tração para ser razoavelmente competitivo.

E para não dizerem que essa coluna se prendeu apenas à análise da corrida, lá vão os detalhes do problema que pode acabar com a carreira do Adrian Sutil. Todo mundo sabe que, na comemoração da vitória de Lewis Hamilton no GP da China, o alemãozão teve um pequeno descontrole emocional e mandou uma taça de champanhe no pescoço do Eric Flux, sócio da empresa Genii, dona da Lotus-Renault, aquela onde correm o Nick Heidfeld e o Vitaly Petrov. Um amigo mais experiente nestas coisas da vida noturna já tinha me dito que isso era típico de briga por causa de mulher. Não deu outra. O Flux tinha levado algumas modelos para a tal boate, e o Sutil se encantou com uma delas. Mas não parece ter sido correspondido pela moça, cuja reação da moça ao levar apertão foi jogar champanhe no rosto do desastrado piloto.

Ao ver a cena, Flux entrou no meio. Sutil, então, repetiu o gesto da modelo, com a pequena diferença de fazer a taça acompanhar a champanhe na direção do rosto do francês. Resultado: Flux tomou nada menos de 20 pontos no pescoço e entrou com um processo na justiça, pleiteando uma indenização de 10 milhões de euros. Não satisfeito, exige que a FIA imponha ao desastrado casanova uma suspensão de três corridas. Logicamente, a Force India colocará em seu lugar o competentíssimo Nico Hulkenberg. Há quem considere esse tempo suficiente para Hulkenberg não sair mais do carro e deixar Sutil a ver navios. É, pode ser…

Lito Cavalcanti

AS – www.autoracing.com.br

Tags
, , , , , , , , ,

ATENÇÃO: Comentários com textos ininteligíveis ou que faltem com respeito ao usuário não serão aprovados pelo moderador.