De dedos cruzados

segunda-feira, 28 de março de 2011 às 18:56
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Adrian Newey conversa com Sebastian Vettel

Conteúdo patrocinado pela: allianz_auto

Quem gostou das inovações da Fórmula 1 levanta a mão.

Não, Vettel, você não precisa. A gente já sabia. Você também não, Adrian Newey. Esse seu Red Bull novo já respondeu por você.

Você a gente já sabia que não ia levantar, Domenicali. A visão das Ferraris do Alonso e do Massa na pista explicam por que você não gostou. E desde o sábado, né?

Eu fico com a mão no meio do caminho, nem levanto inteiramente nem a mantenho abaixada. Isso, nem gostei nem desgostei.

Calma, vou explicar. Não, não estou em cima do muro. Gostei tecnologicamente, desgostei esportivamente.

Deu para entender? Então vamos de novo. Gostei de ver a asa móvel funcionando, gostei da perfeição das eletroválvulas que as acionam, vencendo toneladas de pressão de ar a cada vez que a lâmina de cima se levanta e sustenta a posição até o piloto tocar nos freios. É um esforço enorme, uma atuação espetacular da engenharia, mesmo sem recorrer aos estratosféricos conhecimentos da NASA. Nenhuma falha, mesmo a mais de 300 km/hora. Cassandras desiludidas…

Gostei de ver o KERS de volta, é uma prova de que nem todo mundo na F1 pensa só em dinheiro. É uma contribuição valiosíssima ao meio ambiente. É energia inteiramente limpa, vinda do movimento do carro, voltando  ao movimento do carro. Sim, porque quando se abastece eletricamente os híbridos que estão chegando às ruas, liga-se o carro na tomada. E a energia que sai delas vem ou de hidrelétricas, termoelétricas, geradores nucleares, diesel, etc. A do KERS vem das freadas. Antes era desperdiçada, não é mais. Isso é tecnologia ecológica, isso é energia limpa, isso é contribuição legítima para esse nosso sofrido mundinho.

Gostei também dos novos pneus. Mostrou que, muitas vezes, as críticas são prematuras e sem base na realidade. Ouvi e li incontáveis histórias de terror sobre as hecatombes que acometeriam pilotos e equipes por causa dos horríveis pneus que a Pirelli trouxe para a Fórmula 1. Será que ainda não aprenderam que só se deve julgar um trabalho depois de pronto? Pois teve carro que terminou a corrida com uma só parada. É, estou falando do Sauber do Sergio Perez. E terminou em 7º. E agora? Os pneus são bons e só vão melhorar. Essa é a lógica da vida, evoluir com o tempo. A menos que só se olhe em volta para ver defeito no que os outros fazem. Ah, sabe que tem torcida contra a Pirelli? Descobri isso. “Ah, não gosto da Pirelli. Sou mais a Michelin, a Goodyear”. Será que é a Torcida Jovem da Michelin? A Torcida Organizada da Goodyear? Já estou até ouvindo o coro de “Aõ, ao, ão, Michelin é campeão”. Ou “a Goodyear vai entrar, o bicho vai pegar”…

Não gostei do efeito dessas inovações. Mas vou esperar antes de condená-las ao cadafalso. Desconfio que a asa móvel não foi tão eficiente por causa do trecho escolhido para seu uso, a reta dos boxes. Não era o melhor. A curva Um de Albert Park exige tangência antecipada e afunila, tirando espaço dos carros que estão lutando. Talvez na reta entre a Dois e a Três, essa sim uma curva espaçosa, com tangência retardada. Talvez melhore em um outro Grande Prêmio. Faço votos.

Mas isso também tem um lado positivo: não há o risco anunciado pelo Adrian Newey de facilitar as ultrapassagens a ponto de vulgarizá-las. Ainda bem. Prefiro a emoção do gol no futebol que a sequência das cestas no basquete. Opa, ta bom, não vou falar de esportes com bola, não precisa se incomodar. Mas juro que não entendo esse pessoal que só gosta de uma coisa e renega as outras. Imagina comer o mesmo prato a vida inteira. Fico imaginando o indivíduo indignado diante de uma lazanha voluptuosa, bradando frases como “Não me venha com massas. Só como feijão”. Ontem vi uns posts no twitter em que fanáticos da NASCAR maldiziam, amaldiçoavam e ofendiam os apreciadores da Fórmula 1. Eu hein, que gente esquisita…

Olha, garçon, pode deixar essa lazanha aí que eu vou atacá-la assim que terminar esse feijãozinho aqui. É, gosto das duas. Ou melhor, de todas corridas. Ou melhor ainda, de todos esportes. Onde há empenho, esforço pela superação, competição dentro das regras, vou apreciar, agradecer e bater palmas. Talvez o esquisito seja eu, mas sou assim. Devo muito ao esporte, fiz dele a minha vida.

Mas vamos aos fatos. Que surra o Sebastian Vettel deu na turma. E pelo desempenho do Mark Webber, os méritos foram mais do piloto do que do carro. Como guia esse garoto. Meu companheiro atual nas transmissões do SporTv, o narrador Daniel Pereira, já o considera o melhor de todos os tempos. Daniel é um apreciador entusiástico e ainda é muito jovem. Falo a ele que igual ao Ayrton Senna ainda não vi. Ele acredita, aceita minha opinião. Mas não me atrevo a dizer a ele que o Vettel não vai chegar lá. O moleque é bom demais. A que patamar ele vai chegar, não sei. Quem sabe daqui a alguns anos o Daniel possa dizer orgulhosamente que ele, Daniel Pereira, já sabia…

Mas não estou descartando a enorme qualidade do carro. Esse novo produto do gênio Adrian Newey parece que está sobrando. Fez o que fez sem ter a ajuda dos valiosos 80 cavalos que o KERS fornece a cada vez que o botão é pressionado. Mesmo assim, depois de uma só corrida não dá para ser taxativo em nada. Os carros da RBR parecem muito superiores, mas para mim até agora só parecem. Albert Park é um circuito inteiramente diferente de todos os outros. É pista de rua, mas com características muito próprias. Tanto que é o único no mundo em que os pneus mais sacrificados são os traseiros. Em todos os outros, quem paga pelo ímpeto dos pilotos são os dianteiros.

Por tudo isso, aquilo que se viu aponta os RBR como dominantes, mas não dá para bater o martelo. Vamos esperar mais duas ou três corridas. Mas de olho neles. O Newey é tão bom que fez até o Mark Webber vencer corridas e disputar o título. É, não acho o australiano tão bom assim.

Aliás, por falar em não tão bom assim, o que vocês acharam do carro da Ferrari? E da estratégia da Ferrari? Olha, me deixou com dificuldade para dormir. E não vem dizer que o Massa é isso, o Massa é aquilo. Quem sustenta uma briga como a que ele sustentou com o Button, que tinha um carro infinitamente superior, não pode ser posto em dúvida.

Vaiá-lo é comportamento de arquibancada de futebol, daquelas torcidas que começam a vaiar seu time aos 10 minutos do primeiro tempo. Como infelizmente tem feito a do meu amadíssimo Botafogo. Depois dizem que torcem a favor. Massa guiou mais do que o carro permitia, e se o Button não o passasse pela área de escape, o Alonso também não tinha passado. Opa. É, não queria tocar nesse assunto, mas já que você insiste, também fiquei com a sensação de que rolou um joguinho de equipe, que o Massa deixou o Alonso passar. Mas deve ser alucinação de noites sem dormir…

Pior do que eu deve estar o chefe da Gestione Sportiva da Rossa, o Stefano Domenicali. O sobrenome dele é com um L só ou com dois? Não vou procurar, não faço questão de acertar. Ele também não anda acertando muito. Vocês sabem que a Ferrari – leia-se Stefano Domenical(l)i – contratou o ex-líder da Esquadrilha da Fumaça italiana, a Frecce Tricolori,  para melhorar o entrosamento e agilizar as decisões do pessoal dos boxes? O nome dele é Massimo Tammaro. Pelo que se viu, vai ter de trabalhar muito para manter o avião da Ferrari no ar.

Muita gente se queixou do Massa, reclamando dele atribuir aos pneus o desempenho abaixo da expectativa. Aliás, não só dele, do Alonso também. Gente, foi pneu sim. Vocês sabem que, quando se acerta um bom pneu, o tempo de volta pode melhorar até dois segundos? Aconteceu nesse fim de semana na primeira corrida da F3 sul-americana, lá no maravilhoso complexo (a pista nem tanto) do Velopark, uma obra que devemos agradecer também ao competentíssimo administrador e idealizador Johnny Bonilla (é assim que se escreve seu nome, Johnny? Ajuda aí, amigo). Os pneus continuam sendo Pirelli, mas as dimensões, enfim, obedecem ao padrão internacional. Mais altos, mais estreitos, com paredes mais flexíveis, eles derrubaram o recorde em dois segundos. E olha que a volta mal passa dos 50 segundos. Imagina quanto vai melhorar em uma pista longa como Interlagos.  

Tá bom, seu chato. Vou voltar à Ferrari. A equipe também atribuiu o problema aos pneus. Eles não atingiram a temperatura ideal de funcionamento dos pneus. É, eu sei que você já ouviu essa conversa. Pode ser sim que seja um problema específico daquela pista, que gera baixo atrito entre a borracha e o asfalto. Torço para que seja isso.  Para que o Massa volte a obter resultados coerentes com sua combatividade. Adorei a luta dele com o Button, que precisou infringir as regras para passar.

O que não gostei nada foi da decisão da Ferrari de antecipar a parada dele para forçar o Button a pagar um drive through. O resultado é que faltou pneu para terminar a corrida e ele teve de fazer mais uma parada nos boxes. Cadê o Chris Dyer, meu Deus?  É, depois da pataquada de Abu Dhabi que deixou o Alonso a ver Petrov, mandaram o Dyer cuidar dos carros de grã-turismo (estou lançando uma campanha humanitária chamada “Salvemos o Hífen”. Adesões são bem vindas). Desprezaram a experiência do homem que dividia com o Ross Brawn as decisões estratégicas que deram tantas vitórias e títulos ao Schumacher. Pode?

E o dejá vu do Alonso atrás do Petrov, hein?. O quê? Praga de mãe. Ora, isso não existe. É Renault na frente de Ferrari mesmo. E o Petrov se mostrou muito mais forte como piloto. Momento histórico: uma bandeira russa e um piloto russo no pódio do mais capitalista dos esportes. Esporte? Ih, deixa de ser chato, todo mundo sabe que só é esporte até a página 3, mas precisa falar disso agora? Imagina. Karl Marx, o que o senhor tem a dizer disso? Com o Lenin é melhor nem falar. O Putin gosta. Dizem os mais conservadores que o novo líder foi cooptado pelo demoníaco Bernie Ecclestone, o guardião do capital. Guardião sim. Guarda quase tudo no próprio bolso. Você hoje está crítico demais. Me deixa escrever em paz.

E agora que eu vou falar da corrida sensacional e da exclusão decepcionante dos Sauber? É, a vida não é justa, mas é bonita, é bonita e é bonita. Vide Gonzaguinha, poeta inspirado. Quer injustiça maior do que ele não estar mais aqui? Pena que o Kobayashi e o Perez não conheçam o Gonzaguinha. Gonzaguita em espanhol? Não, em japonês eu não tenho idéia. Eles podem não conhecer Gonzaguita San, mas o caminho do sucesso na F1 eles conhecem. Sétimo e oitavo, tendo largado lá das calendas, é muito bom. E o Koba, que eu acho espetacular, ainda esteve envolvido com um rala rala com o Schummy  e o Alguersuari na fatídica primeira curva. Na verdade, a Um e a Dois não passam de um chicanão. Tão ali para atrapalhar a corrida. Quer coisa mais burra do que chicane? Não, pára. Não quero ouvir seus exemplos extraídos do Congresso Nacional. Eu sei e concordo ipsis literis, foi apenas força de expressão.

Mas foram corretamente desclassificados. Pequenas ou grandes, infrações devem ser punidas. Ou então o respeito às regras vai por água abaixo. Quê? Você de novo? Não, lá não tem Supremo. Não o ministríssimo Luís Fux não influencia nada na F1. Ficha Limpa Racing? Ficou maluco? Sai daqui. Vou trancar a porta. Imagina. Jader Barbalho e Paulo Maluf como pilotos. Hoje não dá para te agüentar.

Olha, gente. Tem um anjo do mal que fica me aporrinhando, lendo por sobre meu ombro. É ele que fica dando esses palpites desastrados. Desculpem. Tentei fazer o melhor nessas mal traçadas. Espero que vocês tenham gostado. Eu adorei. Vou voltar. Você de novo? Eu sei que para voltar o pessoal tem de ter gostado. Não, não quero saber sua opinião. Vade retro…

Quem quiser, mande elogios. Vou adorar. Críticas? Prefiro não. Já tem esse anjo aqui me torturando. Me forçou a procurar o nome do capo. É Domenicali, com um L só. E o que isso muda na vida???

Lito Cavalcanti

Quer comentar a coluna com o Lito? Escreva para: lito.cavalcanti@autoracing.com.br

AS – www.autoracing.com.br

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