Chega de estupidez

segunda-feira, 17 de outubro de 2011 às 3:54

Dan Wheldon

Automobilismo é um esporte de risco, sempre foi e continuará sendo. Você não consegue eliminar todos os riscos ao dirigir carros – por mais seguros que sejam – a mais de 200 km/h.

O risco inclusive faz parte do esporte, torna-o mais emocionante, levanta a adrenalina. Desde que o automobilismo começou, coragem sempre foi um requisito fundamental para os pilotos. Até os anos 70 muitos pilotos perdiam a vida todos os anos nas principais categorias do mundo.

Mas a humanidade evolui e todas aquelas mortes nas pistas começaram a incomodar mais do que emocionar. As pessoas ainda gostam de ver acidentes, mas não querem mortes. Você não vai num autódromo para ver um semelhante morrer. As pessoas não ligam a TV para assistir uma carnificina real.

As pessoas gostam de ver uma pancada num guard-rail, gostam de poder comentar com os amigos que viram um ‘porrão daqueles’ na pista. Mas gostam de completar dizendo que ‘milagrosamente’ o cara saiu ileso daquela porrada. “Você viu como esses carros são seguros?”, gosta de dizer um amigo ao outro. “O cara bateu a quase 300 por hora e saiu ileso!!”

Então, o automobilismo tem alguns deveres que precisa cumprir. Tem que ser perigoso, mas não pode ser fatal. Tem que ter muita velocidade e ao mesmo tempo minimizar os riscos de morte. Os carros precisam andar perto uns dos outros, mas precisa ter área de escape caso se toquem. Tem que ser carros difíceis de guiar no limite para cumprir o requisito técnico que todos esperam.

Algumas categorias se destacam mais que outras, justamente por preencherem os requisitos acima com mais competência. A MotoGP é teoricamente a categoria top do esporte a motor mais perigosa do mundo. Motos a 340 km/h não tem como ser seguro, entretanto faz muito tempo que não morre ninguém por lá. Por que? Porque eles tomaram algumas medidas através dos anos para minimizar os riscos sem perder a emoção. As motos são cada vez mais rápidas, mas mesmo assim continuam sem mortes.

Qual o segredo? É lógico que o segredo é minimizar os riscos. Não basta apenas melhorar a segurança do equipamento, é preciso pensar também no ambiente no qual as corridas são realizadas, os autódromos. Por que você acha que a MotoGP não corre em Interlagos? Dinheiro? Acerto comercial? Política? Nada disso. Eles só não vêm para Interlagos por causa de segurança. Os padrões de segurança da MotoGP são os mais altos de todas as categorias do esporte a motor.

Interlagos serve para a Formula 1, mas obviamente não serve para o MotoGP. Nem poderia. As ondulações da pista e a proximidade de alguns muros, especialmente – mas não somente – o da ex-curva do Café, são demais para a categoria, que ao minimizar os riscos, não pode colocar seus pilotos a tal nível de perigo.

Mas a Indy coloca. Na Indy eles ainda fazem a mesma barbaridade de 40 anos atrás, que é colocar monopostos a 340 km/h numa arena oval sem área de escape e cercada por muros e grades. É simplesmente uma estupidez. Tudo bem que os carros não explodam mais como bombas de napalm ao atingir o muro. Tudo bem que o cockpit é dez vezes mais forte que o dos carros da década de 60 ou 70. A velocidade diminuiu pouco, antes andava-se a 370 e hoje anda-se a 340, mas e daí? O muro continua lá, agora com o pomposo nome de soft-wall, que nada mais é que um estilingue para jogar o carro de volta à pista todo desgovernado e às vezes em pedaços , onde os outros pilotos vem a 340 km/h.

E a cerca logo acima do muro? Enquanto ela protege o público, é uma destroçadora de carros tipo formula. Um monoposto é um carro cheio de pontas, um carro bicudo, extremamente leve e totalmente propenso a decolar quando um pneu encosta no outro numa disputa. E a evolução do downforce dos carros fez com que eles andem cada vez mais perto um do outro. Como evitar que 20 ou mais carros andem colados sem se tocar a 340 km/h por tantas e tantas voltas? Cadê a minimização de risco?

Não dá para comparar com a Nascar, onde os carros são mais lentos, mais pesados, tem capota, tem pára-lama, tem apoio lateral de pescoço, tem gaiola e por tudo isso são dez vezes mais seguros.

A Formula Indy, uma categoria espetacular, mas que devido a seu gerenciamento bizarro está cada vez mais decadente – precisa rever tudo. Chega de estupidez, comecem minimizando os riscos.

Minha sugestão? Desistam dos ovais e da maioria dos circuitos de rua, inclusive São Paulo, que é absurdamente perigoso. Usem Interlagos ou, melhor ainda, usem o circuito de Curitiba. Quanto aos ovais, deixem só Indianapolis pela tradição e pelo fator comercial tão importante para a categoria.

Que Dan Wheldon descanse em paz.

Adauto Silva

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AS – www.autoracing.com.br

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