Ame-o ou odeie-o, Barrichello merece respeito

terça-feira, 22 de agosto de 2017 às 14:05
Rubinho vence em Xangai

Rubinho vence em Xangai

Colaboração: Victor Manoel de Oliveira Nunes

A vida é feita de escolhas. Os caminhos são abertos na medida que nossa dedicação, força de vontade e brilho nos olhos são postos a prova. E quando o ofício desempenhado é a sua missão no curto período que vivencia nesse planeta, os resultados fluirão naturalmente.

Escolhas? É um dilema que todos convivem. As vezes acertamos, noutras erramos. Normal. Ninguém possui bola de cristal para imaginar o que de fato acontecerá. Mesmo cercado de precauções e planejamento bem definido; a realidade almejada não está em nosso total controle. Se assim o fosse, a vida não seria tão bela como a é. Afinal, as nuances são parte do aprendizado e amadurecimento do homem.

Rubinho. Para alguns, o apelido no diminutivo retrata a condição submissa do piloto brasileiro na Formula 1. Outros, o percebem como sentimento de estima. Escrever sobre este grande sujeito, pai, amigo, colega, ser humano, não é fácil. Ainda mais quando se refere a alguém que despertou tamanha discórdia e debates acalorados entre torcedores.

Hoje, menos. Afinal, o tempo é o senhor da razão. Mas na década passada, ao pronunciar Barrichello, ou você torcia a favor e era motivo de chacota, ou contra. Não existia meio termo. Essa divisão, em parte, surgiu da escassez de títulos do país na F1 e acentuou-se com o “hoje não, hoje sim”.

Rubinho - Donington 93

Rubinho – Donington 93

A sucessão de conquistas brasileiras na categoria máxima do esporte a motor, acostumou mal os telespectadores e fanáticos por Emerson, Nelson e Ayrton. Acordar domingo as 9h da manhã era sinônimo de troféus; resultados aquém, eram vistos com desdém. Ou alguém fala efusivamente da primeira volta mágica de Rubens em Donington 1993? De 12º para 4º na primeira volta? Ultrapassando Ferrari, McLaren, Schumacher… Não interpretem mal, por gentileza. Só constatação!

Infelizmente, a nossa cultura não admite derrotas. Está enraizada. A vitória é o único resultado aceitável. E o vice-campeonato é visto como o primeiro dos perdedores. Não se analisa o contexto; mas simplesmente o resultado. Pouco importa o que faça. Esse mesmo pensamento retrógrado que não admite erros, impede o avanço da nossa nação. A partir do instante que nos atentarmos para a necessidade de extrair os ensinamentos do desacerto; que faz parte da trajetória de todo profissional em excelência, o país tornará mais próspero.

Ser vencedor não é somente ganhar campeonatos, conquistar poles e voltas mais rápidas. Transcende a todos os números. O vencedor é o lutador; não desiste pelos seus ideais e busca alternativas de manter-se motivado naquilo que faz; independente da circunstância apresentada.

Rubinho é um sujeito ímpar, fora de série. Mesmo no auge, não deixou de ser o cara que sempre foi. Humilde no trato com os torcedores; acessível e educado junto a imprensa; grande homem de família (exemplo para aqueles que almejam um dia ou já são pai); fiel companheiro, seja no trabalho em equipe ou casamento. Impossível não gostar dele. As redes sociais ratificam a crescente admiração pelo paulista.

Rubinho - Alemanha 2000

Rubinho – Alemanha 2000

A sociedade ainda machista, não aceita o choro do homem. Essa emoção transmitida por ele, o fez gente como a gente. Não o “personagem perfeito robótico” que a mídia tentava criar. O que dizer do vídeo em homenagem ao dia dos pais no qual Rubens ficou literalmente emocionado ao ser guiado pelo filho Dudu?

Posso não ter acompanhado títulos do Brasil na F1; afinal, o último foi no ano de meu nascimento; entretanto, considero-me privilegiado. “Barrica” honrou e ainda honra nossa bandeira, Brasil afora. Momentos inesquecíveis como Hockenheim 2000; Hungaroring 2002; Silverstone 2003/2008; Suzuka 2003; Xangai 2004; Monza 2002/2004/2009; Valencia 2009 são eternos.

Alguém recorda do pódio na China em 2004? Em toda gestão do saudoso Luca Cordero di Montezemolo, eis que o italiano subiu pela única vez ao pódio e recebeu “chuva de champanhe”. Adivinha de quem? Ou na 100ª vitória brasileira na Espanha, quando foi aplaudido “em corredor” pela McLaren, Ferrari e todas as outras equipes? Definitivamente, a terceira colocação em Silverstone não sai da mente. Domingo mágico! Combinação pista e chuva? Perfeita.

f1-barrichello-f1Permanecer 19 (dezenove) temporadas consecutivas é para poucos. Recordista de GPs? Na ponta dos dedos, Rubens Barrichello do Brasil. É verdade, são números. Todavia, verifica-se que ninguém passa tanto tempo na F1 se não for diferenciado. Não à toa que é reconhecido por companheiros como um dos melhores acertadores de carros. Não é Michael e Jenson?

Recentemente, Button afirmou que Rubinho foi o seu melhor companheiro, superando o Don Fernando das Astúrias. Nas palavras do inglês, o brasileiro estava em outro nível. Por isso o alemão o quis tão próximo.

Na atual conjuntura social do país, onde a inversão de valores é considerada normal; a ética é vista com ressalva e a falta de caráter, lamentavelmente, é incentivada; cidadãos do bem como Rubens precisam e devem ser reverenciados. A intenção não é encontrar a unanimidade do 111; mas de reconhecer seus feitos.

Todos erram, mas a tentativa é de acerto. Talvez, a ausência de assessoria que o orientasse a mensurar palavras a serem ditas via imprensa no início de sua jornada, foram determinantes para a elevada responsabilidade ao qual foi incumbido. Torcedores órfãos da prematura morte do ídolo nacional… Alguém teria que dar continuidade ao legado. Somado a isso, a forte carreira nas categorias de base (Kart, Fórmula Opel, Fórmula 3 Inglesa), alçou Rubinho a esperança nacional.

Como disse anteriormente, o erro faz parte do crescimento. A experiência geralmente torna as pessoas mais sábias e articuladas. Rubens não tem do que arrepender-se das decisões tomadas, ocasionadas pelas situações delicadas que apareceram ao longo de quase 20 (vinte) anos. Pelo contrário; orgulhar-se do que construiu. Pilotar pela Ferrari por 06 (seis) temporadas; ao lado do maior campeão (em títulos) da F1; na época ouro da mítica Scuderia; demonstra a grandeza…

Inúmeras vezes, julgamos porque estamos inflamados. Para alguns torcedores, separar razão da emoção é complexo demais. É muito fácil tecer críticas sem estar próximo da causa ou não possuir o real conhecimento do que está em jogo. A F1 não é ciência exata. Contratos são feitos para serem rasgados. Cláusulas em suas minucias podem ter indicativo; mas sem a certeza de como ela é.

Isto posto, não estou aqui para dizer se foi certo ou errado. Mas reflitam a atitude de Barrichello na Áustria 2002. Há diversas vertentes: o interesse da equipe sobre o individual prevalecendo; A falta de liberdade dos pilotos decidirem na pista, o famoso “tragam as crianças para casa” garotos; ou levianamente, aduzem que ele foi comprado. Essa última visão não procede. O brasileiro não pode ser condenado a vida toda por aquele episódio. Enalteçamos sua carreira como um todo. 02 (duas) vezes vice-campeão na F1; Título de Rookie (estreante do ano na Indy 500, 2012); campeão da Stock Car 2014, quebrando (10 anos) a série de conquistas consecutivas entre as escuderias do Meinha e Mattheis.

StockCar - Barrica campeão

StockCar – Barrica campeão

Coloquem-se na situação dele. Contrato na melhor escuderia da F1. Ótimo salário. Excelente estrutura e cultura familiar. Dificilmente conquistaria resultados melhores fora. Convenhamos que a Williams não faria frente; talvez em 2003. E a McLaren era David e Kimi. Sem chances. Aliás, a oportunidade de correr em Woking poderia ter sido concretizada em 2010. No GP Brasil 2009 (pole incrível! Cativante a imagem do pequenino Dudu e seu avô Rubão comemorando o P1), Martin Whitmarsh sondou Barrichello. Infelizmente, já estava fechado com Grove.

Voltando a 2002, mesmo expondo a Ferrari e mostrando ao mundo as ordens de equipe, Rubens permaneceu por mais 03 (três) temporadas. Saiu por livre e espontânea vontade. Se aguardasse mais 02 (dois) anos… Mas o “se” não faz parte da história. E o ressurgimento em 2009 com a carismática Brawn, compensou todo o período de resultados aquém do imaginado pela Honda. Sim, ela mesma.

O amor pelo esporte e o incessante anseio em querer contribuir para o desenvolvimento da F1 o levou ao cargo de presidente do Grand Prix Drivers´ Association – GPDA em 2010. Exercido até o fim de 2011. A Williams, que possui o carma de aposentar pilotos brasileiros, não honrou sua tradição e dispensou Rubens sem a menor consideração. Desrespeitando o piloto e os fãs, por não propiciar despedida digna e justa. Prefiro não imaginar o que Rubinho faria no comando do FW34.

Rubens Gonçalves Barrichello. Tal qual Stirling Moss, Gilles Villeneuve, Jacky Ickx, deixou bela história a ser contada as futuras gerações. A ausência do título não o faz menor. De todo modo, tomara que os “deuses” do automobilismo “corrijam” essa lacuna e quem sabe não presenciaremos em breve novos Barrichellos levantando taças?

Antes, gostaria de vê-lo competindo (não precisa ser a temporada integral) na Nascar; pilotando no quinto carro da Hendrick Motorsports, ao lado do mito Jimmie Johnson. Seria pedir muito? Sonhar não custa nada. Mesmo em ovais, a preocupação da Silvana tenderia a minorar. Os carros da stock car americana são mais seguros que o DW12, por exemplo.

Enfim meus amigos. É inegável a importância do Barrichello para o automobilismo nacional. Os detratores quiseram derrubá-lo. Mas perceberam? Eles foram sumindo, ficando pelo caminho. E o brasileiro, em paz consigo, valorando o que realmente faz sentido, continua aí, dando show de simpatia e condução dentro e fora das pistas.

Que alegria ouvi-lo no filme carros 3, dublando o personagem Cal Weathers. Lamentável que a continuidade nas transmissões da Formula 1 não foi possível; mesmo com audácia (a vejo de modo positivo) de querer entregar mais do que a função permitia. Vai entender… Mas vida que segue!

É isso. O filho do Seu Rubão e Dona Ideli que no comecinho da jornada, só poderia treinar de kart se apresentasse notas boas da escola, sendo amado ou odiado, é super respeitado por onde ingressa. O piloto mais popular da Stock, vide Hero Push, nos deixa importante lição: Não perca a sua essência. Seja sempre você, independente do que aconteça. Por isso estaremos com o Rubens onde o Rubens estiver. Vamo que vamo, Tamo junto!

Victor Manoel de Oliveira Nunes
Natal – RN

Quer ver todos os textos de colaboradores? Clique AQUI

Os artigos publicados de colaboradores não traduzem a opinião do Autoracing. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate sobre automobilismo e abrir um espaço para os fãs de esportes a motor compartilharem seus textos com milhares de outros fãs.

AS - www.autoracing.com.br

Tags

ATENÇÃO: Comentários com textos ininteligíveis ou que faltem com respeito ao usuário não serão aprovados pelo moderador.